O globo, n. 31159, 28/11/2018. País, p. 4

 

O limite do perdão

Carolina Brígido

28/11/2018

 

 

STF começa a julgar indulto para presos, e procuradores da Lava-Jato reagem

O Supremo Tribunal Federal ( STF ) deve definir nesta quarta-feira se o presidente da República tem total liberdade ou não para definir os parâmetros do indulto de Natal concedido a presos. No ano passado, o decreto de Michel Temer causou polêmica por ter regras mais frouxas dos que nos anos anteriores. Por liminar, o ministro Luís Roberto Barroso restringiu beneficiados e vetou o indulto para criminosos do colarinho branco, como condenados por corrupção.

Se o plenário derrubar a liminar, será uma espécie de salvo-conduto para Temer editar em dezembro um decreto igualmente permissivo, nos mesmos moldes de 2017. O temor entre investigadores é que um novo texto beneficie condenados na Lava-Jato.

Procurador da Lava-Jato, Deltan Dallagnol escreveu na internet que o fim de ano será “difícil” para a operação:

“Urgente: há uma intensa articulação junto ao Supremo para liberar nesta 4ª feira o indulto dado por Temer em 2017, que perdoava 80% da pena dos corruptos, qualquer que fosse seu tamanho. Se isso acontecer, Temer estará liberado para fazer o mesmo, ou até pior, neste ano. Esse indulto transforma o trabalho da Lava-Jato e as penas de corrupção numa piada”.

Divisão na Corte

A expectativa é de um placar apertado. Alguns ministros apostam em seis votos a cinco, para um lado ou para o outro. Ministros que defendem a derrubada da liminar de Barroso argumentam que, de acordo com a Constituição, apenas o presidente da República tem a prerrogativa de conceder indulto a presos. Portanto, não caberia ao Judiciário mudar o decreto. A outra ala do STF sustenta que, com um indulto tão abrangente, a sensação de impunidade tomaria conta do país, favorecendo a criminalidade.

Ministros ouvidos pelo GLOBO avaliam que a imagem do tribunal ficou fragilizada nesta semana, com a sanção do reajuste para os juízes. Dar o aval para indultos de Natal mais brandos poderia colocar a Corte ainda mais na berlinda. Com um tribunal dividido, a tendência é que o julgamento não termine hoje. O voto do relator será longo. E, como o cenário provável é de haver divergências, os demais votos também devem levar mais tempo do que o usual.

Se a liminar de Barroso for revogada, condenados que cumpriam as regras do indulto em dezembro do ano passado poderiam ser libertados. O texto dizia que, para qualquer crime sem grave ameaça ou violência, bastava o preso ter cumprido um quinto da pena.

Segundo dados da Defensoria Pública da União (DPU), a maioria dos atingidos seriam presos pobres. Apenas um condenado na Lava-Jato receberia o benefício: o ex-deputado Luiz Argolo, condenado por corrupção passiva e lavagem de dinheiro. Mas se Temer editar neste ano um decreto com os mesmos parâmetros, outros investigados da Lava-Jato poderiam ser beneficiados.

Outro procurador da Lava-Jato, Paulo Roberto Galvão também criticou:

— Os indultos estão cada vez ampliando mais seu escopo e sendo deturpados. Um instrumento que teria caráter humanitário até por causa das cadeias superlotadas se transformou em um motivo de preocupação para a Lava-Jato.

O julgamento começou na semana passada, com sustentações orais de advogados. Gabriel Oliveira, da DPU, argumentou que o indulto de Natal do ano passado foi mais brando em razão da superlotação das prisões brasileiras e da necessidade de se investir em uma política de desencarceramento.

Em caso de revogação da liminar de Barroso, os beneficiados com o decreto do ano passado não serão automaticamente libertados. Depende da decisão de um juiz.

Perguntas e respostas

> O que o STF vai julgar?

No Natal de 2017, o presidente Michel Temer editou indulto com regras mais frouxas que as do ano anterior. Presos que cometeram crime sem violência e já tivessem cumprido um quinto da pena total poderiam ser libertados, independentemente do tempo total da sentença à qual foram condenados. O ministro Luís Roberto Barroso deu liminar restringindo a regra. Condenados por corrupção, por exemplo, não poderiam receber o benefício. Agora, o plenário do STF vai decidir se mantém ou se derruba a liminar.

> O que acontece se a liminar do Barroso for derrubada?

Nesse caso, condenados que cumpriam os requisitos do indulto em dezembro do ano passado poderiam ser libertados. O texto dizia que o preso deveria ter cumprido um quinto da pena, sem especificar o tipo de crime cometido — ou seja, criminosos do colarinho branco poderiam receber esse benefício legal.

> A decisão influencia no indulto de Natal que será editado ainda neste ano?

O STF vai julgar apenas o decreto do ano passado. O texto do decreto do indulto de 2018 já está pronto e é mais rigoroso do que a versão anterior, com vedação à soltura de condenados por uma lista de mais de 30 crimes. Ministros do STF acreditam que, se o plenário derrubar a liminar de Barroso, Temer pode voltar a adotar regras mais brandas de indulto neste ano.

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Segunda Turma vai julgar soltura de Lula até dezembro

Carolina Brígido

Paulo Celso Pereira

28/11/2018

 

 

Fachin libera o caso, e Lewandowski vai pautar; tendência dos ministros é rejeitar o pedido feito pela defesa do ex-presidente

O ministro Ricardo Lewandowski, presidente da Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal (STF), disse ontem que deve agendar para dezembro o julgamento do pedido de liberdade apresentado pela defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. A data ainda não foi definida. O relator do processo, ministro Edson Fachin, liberou ontem o caso para a pauta. Além de Lewandowski e Fachin, também integram esse colegiado os ministros Gilmar Mendes, Cármen Lúcia e Celso de Mello.

No despacho de ontem, Fachin pediu que Lewandowski marcasse o julgamento do habeas corpus de Lula para a próxima terça-feira, 4 de dezembro. No entanto, o presidente da Segunda Turma ainda não incluiu o processo na pauta. Esses cinco ministros se reúnem toda terça-feira. Portanto, se o julgamento não ocorrer no dia 4, haverá ainda outras duas oportunidades disponíveis em dezembro: dia 11 e dia 18. A partir do dia 20, o Supremo entra em recesso.

Entre ministros do STF, a expectativa é que Lula não seja libertado nesse julgamento. Em votações penais, Cármen, Fachin e Celso de Mello costumam se alinhar no sentido de manter as prisões determinadas por juízes de primeira instância.

Sem influência

No pedido, os advogados disseram que Moro “revelou clara parcialidade e motivação política” nos processos contra o ex-presidente Lula. Um dos elementos apontados pela defesa é o fato de o juiz ter aceitado o convite do presidente eleito, Jair Bolsonaro, para ser ministro da Justiça. Eles consideram que o magistrado atuou para impedir o ex-presidente de ser candidato, o que teria beneficiado Bolsonaro.

O presidente do STF, Dias Toffoli, negou que a eleição de Jair Bolsonaro possa interferir nesse caso:

—Nem o Lula ia ser solto se o Haddad ganhasse nem vai ser preso para o resto da vida porque o Bolsonaro ganhou. O Supremo tem independência e autonomia. O mensalão aconteceu com a maioria dos ministros indicados pelo Lula. Nenhum presidente da República tem influência (no Supremo), nem anterior, nem atual — afirmou, em evento na noite de segunda-feira, promovido pelo site Poder 360.

Toffoli, confirmou que o julgamento da ação que discute a execução da pena a partir da condenação em segunda instância será entre março e abril:

— Esse é tema para a Quaresma, é tema de penitência, (pra ser julgado) entre o carnaval e a Semana Santa. Conversei com o Marco Aurélio e ele autorizou a colocar na Quaresma.