O globo, n. 31154, 23/11/2018. País, p. 7

 

Futuro secretário diz querer acabar com 'favelas rurais' do MST

Jussara Soares

23/11/2018

 

 

Assessor para Assuntos Fundiários do governo eleito diz que reforma agrária começará por assentamentos improdutivos

Indicado para assumir a Secretaria Especial de Assuntos Fundiários do futuro governo, o produtor rural Luiz Antonio Nabhan Garcia, presidente da União Democrática Ruralista (UDR), diz que sua principal missão será acabar com o que considera “favelas rurais”, como chama assentamentos improdutivos do Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST). Ele critica a política de reforma agrária dos governos do PT e afirma que não haverá “nenhum tipo de diálogo” com quem invade propriedade.

Dono de terras no interior de São Paulo e de Mato Grosso, Nabhan ainda estuda se vai se licenciar da UDR. Segundo ele, sua pasta terá status de ministério e será ligada à Presidência da República e ao Ministério da Agricultura. Sob sua secretaria estará a política de reforma agrária do governo Bolsonaro —e Nabhan avisa que ela começará por assentamentos do MST que sejam improdutivos.

—Não adianta o MST dizer que é movimento social e invadir propriedade. Se quiser pleitear o direito de fazer reforma agrária, vai pleitear dentro da lei, sem anarquia. Haverá uma reforma agrária começando pela reestruturação dos assentamentos que se transformaram em favela rural. Esses nós vamos ter o desafio de transformá-los em pequenos produtores de agricultura familiar — disse o futuro secretário ao GLOBO.

Diante do pedido para explicar o que classifica como “favelização rural”, Nabhan disse que são “os assentamentos que foram feitos através de uma reforma agrária ideológica e política, sem critério técnico”.

—Pegam qualquer um como massa de manobra, jogam num pedaço de terra e abandonam. Acaba virando uma favela rural. Queremos quem produza, e não quem fique pendurado em cofre público de governo.

Ficar ou não na UDR

O enfrentamento ao que considera abusos do MST coincide com o discurso do presidente eleito, Jair Bolsonaro. Desde a campanha, ele defende que invasões dos Sem Terra sejam tipificadas como terrorismo.

Atualmente, tramita na Câmara um projeto do deputado Jerônimo Goergen (PP-RS) que modifica a Lei Antiterrorismo. O texto da lei diz que não são atos de terrorismo “manifestações políticas ou de movimentos sociais” que tenham “propósitos sociais ou reivindicatórios” para defender direitos, liberdades e garantias previstas na Constituição. A proposta do deputado exclui dessa definição “articulação demovimentos sociais, destinado a dissimulara natureza dos atos de terrorismo, como os que envolvem a ocupação de imóveis urbanos ou rurais”.

Goergen é próximo de Nabhan, e era um nome de preferência dos produtores rurais para assumir o Ministério da Agricultura. Ele e Nab han acabaram preteridos para o cargo. Bolsonaro indicou a deputada Tereza Cristina (DEM-MS), o que foi classificado por Nabhan como “uma vitória da velha política”.

— Sempre tive relação cordial com ela. Se houve indicação política ou não, é uma questão ase analisar com mais critério, não sei. Vejo nela vontade de fazer uma gestão voltada para a produção rural, não vejo nenhum constrangimento.

Ao Globo, na última quarta-feira, Tereza afirmou ter tido uma relação “de respeito” com o MST quando foi secretária estadual no Mato Grosso do Sul.

—O MST é muito dividido. Lá no meu estado, tive uma relação no início um pouco tensa, mas depois virou uma relação de respeito, de ouvi-los. O que não pode é o MST invadir terra. Isso é muito ruim.

Durante a campanha de Bolsonaro, Nabhan foi o mais próximo conselheiro do presidenciável para assuntos relacionados ao agronegócio. O presidente da UDR se posiciona a favor da manutenção do atual Código Florestal, mas critica pontos do Acordo de Paris, aprovado pela comunidade internacional em 2015 com o objetivo de reduzir emissões de carbono.

Nabhan também diz não ver conflito de interesses no fato de presidir a entidade dos grandes produtores rurais e comandar a reforma agrária no governo.

— Não tem conflito nenhum. A UDR defende o produtor rural, o assentado é um produtor rural. Terei de fazer uma análise jurídica, se continuo ou não à frente da UDR. Provavelmente não, talvez eu tenha que me licenciar. A UDR sempre foi combativa às invasões, e o governo Bolsonaro também será.