O globo, n. 31146, 15/11/2018. País, p. 6

 

Novo chanceler sela alinhamento com Trump

Claudia Antunes

Eliane Oliveira

Adriana Mendes

15/11/2018

 

 

Futuro ministro das Relações Exteriores, o embaixador Ernesto Araújo se aproximou do círculo de Bolsonaro após publicar texto com elogios ao presidente americano; diplomata quer liderar política externa ‘efetiva’

O embaixador Ernesto Araújo, chefe do Departamento de EUA e Canadá do Itamaraty, será o ministro das Relações Exteriores. Araújo é autor de elogios à doutrina do presidente Donald Trump. Oembaixador Ernesto Araújo, que dirigia o Departamento de EUA, Canadá e Assuntos Interamericanos do Itamaraty, será o chanceler brasileiro no governo de Jair Boslonaro. Sua nomeação, ontem, personifica a associação que o grupo mais próximo do presidente eleito vem buscando com o ideário do presidente americano Donald Trump, já desde a campanha eleitoral.

Aos 51 anos, ele é um dos mais novos embaixadores da carreira diplomática, tendo sido promovido ao posto há apenas seis meses, sem sequer ter chefiado uma missão no exterior. O nome de Araújo já havia sido mencionado por assessores de Bolsonaro desde antes da campanha eleitoral.

No segundo semestre de 2017, Araújo publicou em uma revista do centro de estudos do Itamaraty o ensaio “Trump e o Ocidente”, que se tornou referência no círculo bolsonarista. Um dos que elogiaram a publicação foi o filósofo Olavo de Carvalho.

Ontem, ao dar entrevista coletiva ao lado do futuro chanceler, Bolsonaro chamou Araújo de “brilhante intelectual”, e afirmou que ele tem a missão de executar uma de suas principais promessas de campanha, a de adotar uma política externa e comércio exterior “sem viés ideológico”, como o presidente eleito afirma ter ocorrido durante os quatro mandatos do PT.

— Tem 29 anos de ministério, é uma pessoa bastante experiente. Queremos incrementar a questão de comércio com o mundo todo, sem viés ideológico. Com todo respeito, algumas instituições perderam seu brilho ao longo dos últimos anos, e queremos o ministério brilhando.

No ensaio em que expôs suas ideias sobre “Trump e o Ocidente”, Araújo conclama o Brasil a, sem desprezar sua tradição de política externa autônoma, “alinharse consigo mesmo” e integrar-se ao projeto trumpista de “recuperação da alma do Ocidente”. Até porque, argumenta o embaixador, Trump não é imperialista, mas defende o respeito mútuo entre “nações soberanas e independentes”.

Contra o "Globalismo"

No texto, o futuro chanceler afirma que o presidente americano assumiu a missão de resgatar a civilização ocidental, sua fé cristã e suas tradições nacionais forjadas “pela cruz e pela espada”. Essa civilização, escreveu Araújo, está sendo corroída pelo “inimigo interno”, aqueles que esqueceram a própria identidade sob a influência do “marxismo cultural globalista”, cujo marco inicial seria a Revolução Francesa, anterior a Karl Marx.

Araújo também mantém o blog pessoal Metapolítica 17, no qual não se identifica como diplomata, mas como servidor público. O slogan do blog é “contra o globalismo”, termo que, no jargão político dos Estados Unidos, é usado de forma pejorativa por detratores das instituições multilaterais, acusadas de interferir negativamente na soberania dos países.

Para setores da direita americana, o “globalismo” tomou o lugar de inimigo que no passado foi do “internacionalismo” socialista.

“Essencialmente é um sistema anti-humano e anticristão. A fé em Cristo significa, hoje, lutar contra o globalismo, cujo objetivo último é romper a conexão entre Deus e o homem, tornado o homem escravo e Deus irrelevante. O projeto metapolítico significa, essencialmente, abrir-se para a presença de Deus na política e na história”, escreve o embaixador no blog.

"Amor e coragem"

Ontem, Ernesto Araújo fez um breve pronunciamento:

—Uma política efetiva, em função do interesse nacional, de um Brasil atuante, um Brasil feliz, um Brasil próspero. Sem preferências, temos relações excelentes com todos os parceiros, (vamos) incrementar as parcerias em benefício de todos, do povo brasileiro sobretudo.

À noite, o futuro ministro divulgou uma nota com elogios ao futuro presidente. Ele disse também que pretende manter pontos da atual política externa do governo Temer:

“Bolsonaro com amor e coragem! Este é o lema do candidato em que sempre acreditei, junto com tantos milhões de brasileiro, e este é o projeto que saiu triunfante das eleições”, afirmou o novo ministro.

“Aprofundaremos iniciativas lançadas com competência pela atual gestão. Lançaremos muitas outras, tanto na economia e no comércio quanto na cultura e tecnologia. (...) Teremos novas ideias, em diálogo construtivo e produtivo com todos os parceiros”, escreveu Araújo.

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Para diplomata, PT é ‘Partido Terrorista’

Cláudia Antunes

Eliane

Oliveira

15/11/2018

 

 

O blog pessoal que o futuro chanceler Ernesto Araújo manteve nos últimos meses esteve bastante ativo na campanha eleitoral, em que o diplomata defendia Jair Bolsonaro e centrava ataques no PT. Em um post de 20 de outubro, uma semana antes do segundo turno, Araújo atacou o questionamento da utilização do WhatsApp pela campanha de Bolsonaro.

Segundo o futuro ministro, era mais uma manobra do PT, que “odeia a liberdade” e por isso criminaliza “tudo o que é bom, espontâneo e puro”. No seu blog, a sigla do Partido dos Trabalhadores ganhava novos significados como “Projeto Totalitário”, “Partido da Tirania” e “Partido Terrorista”.

Araújo é conhecido por ser uma pessoa afável e determinada por diplomatas e funcionários do Itamaraty. Nascido em Porto Alegre, formado em Letras, ele é casado, pai de uma filha e é genro do embaixador aposentado Luiz Felipe de Seixas Corrêa, que foi secretário-geral do Itamaraty (vice-chanceler) nos governos Collor e FH, além de ex-embaixador do Brasil na Organização Mundial do Comércio.

Ainda que nunca tenha sido chefe de missão, o futuro chanceler já serviu na Comissão Europeia, na Bélgica; na Alemanha, no Canadá e nos Estados Unidos.

Quando Jair Bolsonaro declarou que iria escolher um “jovem ministro” para comandar a política externa brasileira, foi a deixa para que, no Itamaraty, as apostas sobre quem seria o novo chanceler se voltassem para Ernesto Araújo.

O futuro chanceler tem desafios concretos pela frente. Um deles é o restabelecimento das boas relações do Brasil com o mundo árabe, estremecidas desde que Bolsonaro anunciou que mudará a embaixada brasileira em Israel de Tel Aviv para Jerusalém — cidade disputada por israelenses e palestinos.

Também orientará o presidente eleito sobre como proceder em relação à China, aos países bolivarianos (Venezuela, Cuba e Bolívia), os quais já criticou no blog. Em 27 de setembro, escreveu que “Haddad é o poste de Lula. Lula é o poste de Maduro, atual gestor do projeto bolivariano. Maduro é poste de Chávez”.

Araújo aconselhará Bolsonaro ainda sobre as negociações comerciais em curso e aos compromissos internacionais ligados ao meio ambiente, como o Acordo de Paris.

O pensamento de Araújo sobre política externa, no entanto, é tido como minoritário no Itamaraty. Embora com diferenças entre governos, o Ministério das Relações Exteriores mantém uma tradição de não alinhamento automático e de valorização das organizações multilaterais.

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General desiste da Infraestrutura; governo criará pasta da Cidadania

Vinícius Sassine

15/11/2018

 

 

O general da reserva do Exército Osvaldo Ferreira, que havia sido convidado para assumir o Ministério da Infraestrutura, desistiu de integrar o primeiro escalão do governo. A futura pasta será uma junção dos ministérios dos Transportes, dos Portos e da Aviação Civil. Uma alternativa para ele seria uma secretaria dentro do Palácio do Planalto com influência direta sobre a pasta de Infraestrutura e ade Minas e Energia, oque também não deve ocorrer.

Um dos generais mais atuantesna elaboração de propostas para a campanha deBol sonaro, e também um dos principais nomes do grupo de transição, ele deverá ficar fora do governo. Ontem, ficou praticamente acertado que Ferreira não estará à frente nem de uma pasta nem de outra.

A interlocutores, o general tem dito que não tem projeto de vida de ser ministro e que vai optar pela aposentadoria — ele já está na reserva do Exército.

Ferreira negou a ideia de comandar a Infraestrutura e não ouviu de Bolsonaro qualquer proposta de ser colocado dentro do Planalto.

Ao longo do dia, em seus últimos compromissos de sua segunda viagem a Brasília após ser eleito, Bolsonaro manifestou a autoridades com quem esteve reunido que havia ouvido um “não” de Ferreira. Agora, Bolsonaro procura outro general para o posto.

As circunstâncias sobre essa reviravolta ainda são desconhecidas. Ferreira sempre teve um perfil técnico, voltado inicialmente para assuntos de infraestrutura, área que detém conhecimento por ter estado à frente do Departamento de Engenharia do Exército.

Responsável por coordenar a transição de governo, o deputado Onyx Lorenzoni (DEM-RS), informou ontem que a administração de Jair Bolsonaro contará com um Ministério da Cidadania. Segundo o futuro ministrochefe da Casa Civil, a pasta será responsável pelas áreas de desenvolvimento social, direitos humanos e políticas de combate às drogas, e deve substituir os atuais ministérios do Desenvolvimento Social e do Direitos Humanos.

— O Ministério do Trabalho ficará junto com a “produção” ou vai para um outro ministério chamado de Cidadania, que aí tem lá o Desenvolvimento Social, os Direitos Humanos. Para a gente poder sair de 30 ministérios para 15, tu tem que fazer essa concentração — disse Onyx, à Rádio Gaúcha.