O globo, n. 31145, 14/11/2018. País, p. 4

 

General do Exército vai para a Defesa

Daniel Gullino

Eduardo Bresciani

14/11/2018

 

 

Assessor de Dias Toffoli é o terceiro militar de alta patente no novo governo

Reajuste de militares e reequipamento das Forças estão entre os principais desafios

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, anunciou ontem a escolha do general do Exército Fernando Azevedo e Silva para o comando do Ministério da Defesa. Desde que foi criada, em 1999, será a segunda vez que a pasta estará sob o comando de um militar. Bem relacionado no núcleo do governo, o futuro ministro da Defesa é o terceiro general de quatro estrelas do Exército a integrar o primeiro escalão de Jair Bolsonaro.

Além de Azevedo, o presidente eleito já tem ao seu lado o general Hamilton Mourão, eleito vice-presidente, e o general Augusto Heleno, escolhido para chefiar o Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI). Há ainda a possibilidade, já sinalizada pelo próprio presidente eleito, de que o general da reserva Oswaldo Ferreira também seja nomeado para algum posto importante na Esplanada.

Aos 64 anos, Azevedo vai substituir, a partir de janeiro, o também general de quatro estrelas do Exército Joaquim Luna. Até ir para a reserva, neste ano, o general foi chefe do Estado-Maior, atuou no Congresso e também esteve à frente da Autoridade Pública Olímpica (APO), durante o governo de Dilma Rousseff (PT).

Até ontem, o futuro ministro da Defesa trabalhava no Supremo Tribunal Federal (STF) como assessor do presidente da Corte, Dias Toffoli. Ao GLOBO, afirmou ter ficado “muito honrado” com o convite, mas explicou que ainda é cedo para traçar as principais diretrizes à frente da pasta.

— Fico muito honrado com o convite. Tenho 46 anos de serviços prestados ao país. Acredito que minha bagagem, dentro e fora do Exército, será importante para desempenhara função. Agora, vou conversar como presidente e receberas orientações para cumprir anova missão.

O futuro ministro terá o desafio de superar eventuais resistências nas outras Forças — Marinha e Aeronáutica — que acompanham com atenção o predomínio do Exército no futuro governo Bolsonaro. Ontem, integrantes do próprio Exército admitiam que a escolha de Azevedo provocou algum desconforto.

Além de ser visto como um militar da “ala política” das Forças, naturalmente vista com desconfiança pela ala mais próxima do campo operacional, Azevedo vai ter de lidar com pressões constantes por recursos. Isso em um ambiente já sufocado pela crise fiscal.

Além do reajuste dos militares, já solicitado pelos comandantes ao próprio Bolsonaro, Azevedo terá de usar sua influência para obter verbas para projetos importantes de defesa, como o F-X2 (Gripen-NG), de reequipamento da frota de caças da Força Aérea. O projeto de construção de fragatas, corvetas e do submarino nuclear, da Marinha, e a manutenção e ampliação de projetos do Exército como o Sistema Integrado de Monitoramento de Fronteiras (Sisfron) são outras missões prioritárias.

Sobre a escolha de Bolsonaro, Toffoli disse que foi consultado pelo presidente eleito e declarou ser “uma excelente escolha". Por meio de nota, o presidente do STF afirmou que o general é experiente e dedicado ao serviço público.

“É com muita alegria que vejo o anúncio do nome do General Fernando Azevedo e Silva para Ministro de Estado da Defesa. Certamente sua larga experiência contribuirá para o fortalecimento da atuação das Forças Armadas, da segurança e da defesa no Brasil”.

Veio de Azevedo o conselho para que Toffoli se posicionasse publicamente após a divulgação de um vídeo em que Eduardo Bolsonaro, filho do presidente eleito, falava em fechar o STF. O episódio terminou com pedidos de desculpas feitos pelo pai e pelo filho e com uma nota em que o presidente do Supremo afirmava que “atacar o Poder Judiciário é atacar a democracia".

Outros ministros da Corte também elogiaram a indicação. Marco Aurélio Mello, no entanto, criticou a escolha de um militar para a pasta, tradicionalmente ocupada por um civil.

Transição: nove militares

Festejada nos bastidores da caserna, a indicação não foi a primeira escolha de Bolsonaro. Ontem, ele confirmou ter feito o convite inicial ao comandante da Marinha, Almirante Eduardo Bacellar, que recusou a oferta do cargo.

— Nós havíamos conversado, sim, com a Marinha, havia sido proposto a um almirante essa oportunidade, mas, por questões familiares, ele declinou. Daí nós decidimos pelo general Fernando, que será mais antigo que os demais comandantes de Forças e tem uma vida pregressa de serviços excepcionais. Esteve no Haiti, em operação de Garantia da Lei e da Ordem, como chefe de Estado Maior — disse o presidente eleito.

Também ontem, o presidente eleito anunciou mais dois generais para a equipe de transição, que, agora, tem nove egressos das Forças Armadas. Os generais da reserva Jamil Megid Junior e Floriano Peixoto Vieira Neto foram indicados. Jamil coordenou o Comitê Organizador dos Jogos Mundiais Militares de 2011, no Rio, e atuou na segurança de outros megaeventos, como a Rio+20, a Jornada Mundial da Juventude, a Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016. Vieira comandou a missão do Brasil no Haiti, entre 2009 e 2010. 

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Da caserna ao STF, um militar com vocação política

Carolina Brígido

Vinicius Sassine

Eduardo Bresciani

14/11/2018

 

 

Um general de quatro estrelas disposto a conversar com “todo mundo”. Este é o perfil traçado por pessoas próximas a Fernando Azevedo e Silva, escolhido como ministro da Defesa de Jair Bolsonaro.

No STF, quando assumiu, em setembro, a assessoria do presidente da Corte, ministro Dias Toffoli, passou a ser uma espécie de conselheiro. Ajudou na aproximação do magistrado de origem petista com a caserna em um momento político sensível: a possibilidade de que um capitão do Exército assumisse a Presidência da República. Foi bem sucedido na missão.

O futuro ministro da Defesa conhece Bolsonaro desde a década de 1970, quando passaram pela Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), em Resende, no Rio de Janeiro. Bolsonaro é da turma de 1977. Azevedo, do ano anterior. Os dois foram atletas militares.

Se conversa bem na caserna, também circula com desenvoltura no Congresso Nacional, onde desempenhou a função de assessor parlamentar. Foi lá que a boa relação com Bolsonaro se fortaleceu, quando o presidente eleito era o deputado federal que mais assumia a defesa dos interesses corporativistas dos militares, e o general era o assessor parlamentar do Exército. O cargo é relevante dentro da estrutura militar, com a responsabilidade de defender os projetos de interesse da Força perante as lideranças políticas.

A capacidade de articulação foi umas das razões que levaram o general Augusto Heleno —que só não virou vice por questões partidárias e foi o primeiro nome cogitado para a Defesa —a indicar Azevedo e Silva para Bolsonaro.

Os dois generais são bastante próximos. Quando Heleno chefiou o gabinete do Comando do Exército, Azevedo foi seu subchefe. Também tem ótima relação com o atual ministro da Defesa, general Joaquim Silva e Luna. Os dois se falam constantemente.

Toffoli foi apresentado a Azevedo pelo comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, a quem havia pedido uma indicação. Azevedo também é amigo do general da reserva Oswaldo Ferreira, que ajudou a formular um programa de governo para o presidente eleito.

Antes da função de articulador político da Força no Congresso, Azevedo acumulou experiência em lidar com políticos ao trabalhar na área de segurança do então presidente Fernando Collor. Também esteve à frente da Autoridade Pública Olímpica (APO), durante o governo de Dilma Rousseff, quando estipulou uma “matriz de responsabilidade” para o acompanhamento das obras para o evento. Ele saiu do órgão no começo de 2015. A matriz foi levada à frente até o início dos Jogos, porém o balanço final acabou não sendo apresentado. Lá, foi interlocutor do então ministro-chefe da Casa Civil, o petista Aloizio Mercadante, filho de um general do Exército.