Correio braziliense, n. 20240, 20/10/2018. Política, p. 4

 

Petistas suavizam propostas 

Bernardo Bittar 

20/10/2018

 

 

O plano de governo do PT foi mudado às pressas para atrair os votos de última hora — especialmente os mais conservadores. Menções à reforma das polícias e à descriminalização de drogas foram excluídas em novo documento entregue pela campanha petista ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Também sumiu do papel a ideia de inventar um indicador para a meta de inflação. Os reajustes foram implementados pela cúpula do partido como uma tentativa de resposta aos baixos índices de Fernando Haddad (PT) nas últimas pesquisas de intenção de votos. Em levantamento divulgado na última quinta-feira, pelo Datafolha, o professor universitário tinha 41%. Jair Bolsonaro (PSL), 59%.


Uma das promessas é a autonomia do Banco Central. Outra, a retirada de um novo indicador para a meta de inflação. Visando agradar ao agronegócio, a promessa de segurança e o apoio ao setor acabaram amealhados em meio às mudanças do plano de governo. Sumiu a “regulação do grande agronegócio para mitigar os danos socioambientais” e entrou a criação de “políticas específicas para cada etapa do processo produtivo, em constante diálogo com os produtores”. Também saíram do texto as “políticas de promoção da orientação sexual e identidade de gênero”. Em seu lugar, entraram as “políticas de combate à discriminação em função da orientação sexual e identidade de gênero”.

O consultor econômico e ex-secretário de Assuntos Econômicos do Ministério do Planejamento Raul Velloso explica que o grande problema era a radicalização do plano de governo inicial. “Foi necessário suavizar justamente para corrigir os erros impostos na primeira tentativa. Foi o que o ex-presidente Lula fez em 2002, com a Carta ao Povo Brasileiro: tirou todas as maluquices do partido e venceu a eleição”, aponta o especialista. “Me surpreendeu que, depois de tantos fracassos, o PT teve estômago para colocar aqueles excessos todos no plano de governo. Essa mudança para deixar as coisas mais brandas está correta”, analisa.

Para Velloso, o programa de Haddad é uma injustiça com ele mesmo. “O candidato é um economista e não deve acreditar naquilo que está escrito. É inacreditável o que foi colocado inicialmente na economia. Para fazer algum sentido, o PT vai ter que mexer ainda mais nesse plano antes da eleição. Se não, fica sem sentido. É uma coisa pré-colombiana”, detalha. De modos diferentes, tanto o programa de governo de Bolsonaro como o de Haddad estão em franca mutação, segundo o especialista. No caso do militar, Velloso diz se tratar de “um projeto em construção. Por ser o resultado de uma candidatura de direita, disparou anunciando liberalismo econômico. Ele foi feito para conquistar pessoas nas suas carências mais agudas”, pondera.

Tática

Na previsão de Guilherme Silva Prado, professor de Ciência Política da Universidade Estadual de Goiás (UEG), as mudanças têm a pretensão de buscar os votos dos indecisos. “Essa coisa de mudar tudo às pressas, tudo muito bem divulgado, é uma tática para ganhar a atenção dos que ainda resistem ao PT. Retirar a descriminalização das drogas e aquele ponto sobre o aprisionamento apenas de quem comete crimes violentos são um aceno para os conservadores”, explica.

A ampliação do programa Dívida Zero para pequenos negócios — que antes era especificado apenas para pessoas físicas com cadastro negativo no SPC (Serviço de Proteção ao Crédito) — também constam no plano de governo alterado. O novo documento não fala mais na convocação de uma Assembleia Constituinte, proposta duramente criticada que fez com que Haddad recuasse publicamente.