O globo, n. 31180, 19/12/2018. País, p. 4

 

Auxílio deixa de ser penduricalho

Carolina Brígido

19/12/2018

 

 

Antes indiscriminada, verba de moradia ficará restrita a 1% dos juízes

Menos de um mês depois de o ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF), banir o pagamento do auxílio-moradia para juízes de todo o país, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) aprovou ontem uma nova versão do benefício com o mesmo valor: R$ 4.377,73 por mês. A diferença é que, pela regra anterior, o dinheiro era pago indiscriminadamente a todos os magistrados.

Agora, há uma série de requisitos para que o juiz seja habilitado a receber o valor e, segundo previsão do CNJ, só 1% dos magistrados terá o benefício. Existem hoje cerca de 18 mil magistrados no Brasil. Logo, os beneficiados seriam cerca de 180.

As mudanças nas regras do benefício foram negociadas por Fux e o presidente do Supremo, ministro Dias Toffoli, com o presidente Michel Temer. Fux aceitou rever sua decisão liminar que mantinha o penduricalho em troca da sanção de Temer ao reajuste salarial dos ministros da Corte.

No mês passado, Temer avalizou o aumento de 16,38%, que elevou de R$ 33,7 mil para R$ 39,2 mil os vencimentos de Fux, Toffoli e seus colegas — e o teto de todas as carreiras do funcionalismo, por consequência.

Pelo acordo, selado numa conversa reservada no Palácio do Jaburu, Fux, em troca do reajuste, proibiu o pagamento indefinido do auxílio-moradia a partir de janeiro. Com isso, só terá direito à verba extra o magistrado que tiver sido transferido de sua comarca de origem.

Por lei, o juiz não pode mudar de comarca sem concordar com isso. Essas mudanças são comuns ao longo da carreira.

Para receber o dinheiro, o magistrado vai precisar apresentar os comprovantes de pagamento do aluguel ou hospedagem. O dinheiro não poderá ser usado para o pagamento de condomínio ou impostos, como o IPTU, por exemplo. Antes, o dinheiro poderia ser usado sem qualquer restrição nem necessidade de prestação de contas.

Votação em um minuto

Outra regra é que o juiz não tenha imóvel funcional disponível na comarca. Ele também não pode morar com alguém que já receba o benefício. E, ainda, nem ele nem o cônjuge poderá ser dono de imóvel na cidade. Também não pode ter tido propriedade até 12 meses antes da mudança de comarca.

O novo auxílio tem caráter temporário, mas não há especificação de quanto tempo um juiz pode receber. Portanto, fica aberta a possibilidade de tribunais limitarem um período, se quiserem.

A proposta foi negociada nos bastidores e aprovada ontem em apenas um minuto, em votação simbólica, sem que os conselheiros tenham apresentado votos. O presidente do CNJ, ministro Dias Toffoli, que também preside o STF, disse o número da resolução e perguntou se alguém tinha alguma objeção. Diante do silêncio, declarou a proposta aprovada.

O benefício será revogado se o magistrado recusar imóvel funcional, ou se passar a morar com outra pessoa que já receba a verba. O valor do auxílio será reajustado anualmente pelo CNJ.

Os recursos para custear o benefício devem estar previstos no orçamento de cada órgão do Judiciário responsável pelo pagamento. Ainda não há cálculo do impacto que o novo benefício provocará nos cofres públicos. Segundo a resolução, o auxílio-moradia para integrantes de cortes superiores deve ser disciplinado pelos respectivos tribunais.

No dia 26 de novembro, o ministro Luiz Fux, ao revogar o auxílio, determinou que o CNJ e o CNMP regulamentassem novamente o pagamento, com regras iguais para o MP e o Judiciário. Na decisão de novembro, Fux deixou um caminho aberto para a volta do benefício quando proibiu o pagamento do penduricalho, mas não o declarou inconstitucional.

O benefício está previsto na Lei Orgânica da Magistratura Nacional (Loman), editada em 1979 pelo então presidente Ernesto Geisel. Como essa norma não foi considerada inconstitucional, nada impedia que o auxílio voltasse a ser pago.

A Loman estabelece “ajuda de custo, para moradia, nas localidades em que não houver residência oficial à disposição do magistrado”.

A decisão de Fux estabelecia que o auxílio-moradia deixaria de ser pago aos juízes assim que o reajuste entrasse em vigor, a partir de janeiro de 2019. Como a nova regra do CNJ passará a valer também a partir de janeiro, juízes que atenderem a todos os requisitos estabelecidos pelo conselho poderão acumular o reajuste salarial sancionado e o valor extra de moradia.

Ministério Público terá as mesmas regras do benefício

> O plenário do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) aprovou ontem o auxílio-moradia para membros do Ministério Público, após o benefício ter sido suspenso pelo ministro Luiz Fux, do Supremo Tribunal Federal (STF). A decisão ocorreu horas após o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) fazer o mesmo para os magistrados.

> O formato será o mesmo dos juízes: o benefício será de R$ 4,3 mil por mês, mas, para recebê-lo, será preciso cumprir requisitos. Antes, o auxílio era pago a todos os magistrados e membros do MP.

> A decisão entra em vigor em 1º de janeiro e terá efeito até a edição de uma resolução conjunta com o CNJ, ainda sem data para ocorrer.