Correio braziliense, n. 20290 , 09/12/2018. Política, p.4

Bolsonaro admite ter sonegado à Receita

Rosana Hessel

Lucas Valença

 

 

O presidente eleito, Jair Bolsonaro, minimizou as denúncias sobre depósitos suspeitos apontados pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do policial Fabrício Queiroz, ex-assessor do senador eleito Flávio Bolsonaro (PLS-RJ), feitos na conta da futura primeira-dama, Michelle Bolsonaro. “Ninguém dá dinheiro sujo com cheque nominal”, afirmou,  após participar da formatura de oficiais da Escola Naval do Rio de Janeiro.

Durante a entrevista, ele reforçou que recebeu 10 cheques de R$ 4 mil, o que daria R$ 40 mil de empréstimos feitos por ele ao amigo e que teriam sido devolvidos em repasses para a mulher. Bolsonaro justificou que os depósitos ocorreram na conta de Michelle “por questões de mobilidade”. “Eu ando atarefado o tempo todo para ir ao banco. Pode considerar da minha conta. Lamento o constrangimento que ela está passando”, afirmou. Ele ainda contou que não declarou o empréstimo e o pagamento para a Receita Federal. “Se eu errei, arco com minha responsabilidade perante o Fisco, sem problema nenhum”, pontuou.

Ao ser questionado sobre o grande volume de saques em dinheiro vivo apontados pelo Coaf na conta do policial, Bolsonaro não fez comentários. “Conheço o senhor Queiroz desde 1984. Depois, nos reencontramos, eu como deputado federal e, ele, sargento da Polícia Militar. Somos paraquedistas. Continuou a amizade. Em muitos momentos, estivemos juntos, em festas, eventos, até porque me interessava ter um segurança policial ao meu lado. Com o tempo, ele foi trabalhar com o meu filho”, afirmou. Para ele, a movimentação atípica “não configura ilegalidade”.

 

Rendimentos

Em investigação sobre movimentações suspeitas na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), o Coaf detectou valores na conta de Queiroz, que chegam a R$ 1,2 milhão, que não eram condizentes ao seu rendimento. Segundo Bolsonaro, quem vazou as denúncias sobre o amigo foram os advogados dos parlamentares da Alerj presos para “desviar o foco” deles para os filhos do futuro presidente. “Espero que esse processo, uma vez instaurado, se explique”, afirmou.

Para especialistas, essa nova crise poderá atrapalhar o futuro governo se os fatos investigados pela Justiça confirmarem irregularidades mais profundas. “Esse é um incômodo a ser esclarecido, mas não traz risco de naufrágio do novo governo. Sem fatos adicionais, essa denúncia vai se esvaziar”, afirmou o cientista político Murillo de Aragão, presidente da Arko Advice. “Essa denúncia é um desafio, mas precisamos ver para onde vão as investigações. Não vejo que o capital político de Bolsonaro seja impactado logo nesse início de mandato”, disse o cientista política Christopher Garman, diretor-geral para as Américas do Eurasia Group, sediado em Washington. Contudo, ele lembrou que Bolsonaro foi eleito em uma plataforma de combate à corrupção. “Qualquer coisa que fere isso, preocupa. Mas, por hora, não chegou a atingir o Flávio Bolsonaro diretamente”, emendou.

 

Frase

"Eu ando atarefado o tempo todo para ir ao banco. Pode considerar da minha conta. Lamento o constrangimento que ela  (Michelle) está passando”

Jair Bolsonaro, presidente eleito