O Estado de São Paulo, n. 45767, 06/02/2019. Política, p. A4

 

Governo quer cancelar indenização a ex-militares

Felipe Frazão e Tânia Monteiro 

06/02/2019

 

 

 Recorte capturado

 

Anistia. Planalto considera ‘absurdo’ o pagamento de R$ 7,4 bilhões a ex-integrantes da Força Aérea Brasileira que alegam perseguição política no período de 1946 a 1988

O governo Jair Bolsonaro vai acionar a Advocacia-Geral da União (AGU) para evitar o pagamento de indenizações concedidas pela Comissão de Anistia a ex-militares da Força Aérea Brasileira (FAB), que somam R$ 7,4 bilhões. A cifra corresponde a valores retroativos de decisões ocorridas nos governos dos ex-presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff. A decisão de acionar a AGU foi tomada em conjunto pelo Palácio do Planalto e pelo comando da Aeronáutica.

Até o ano passado, a conta total envolvendo anistiados políticos chegava a R$ 17,4 bilhões. Desse valor, R$ 9,9 bilhões já foram pagos – R$ 3,5 bilhões para ex-militares da Aeronáutica, do Exército e da Marinha e R$ 6,4 bilhões para civis. Os contemplados alegam perseguição política entre 1946 e 1988.

Não existe na legislação prazo final para que cidadãos requeiram a reparação – o que significa que a conta nunca fecha. Atualmente, 12.669 pessoas, entre civis e militares, aguardam uma decisão. Na fila, estão Dilma e Lula. A presidente cassada pede R$ 10,7 mil por mês, mas já há parecer contrário. O valor, quando concedido, é vitalício.

A Comissão de Anistia é formada por, no mínimo, 20 pessoas indicadas pelo governo. Até Michel Temer, a prerrogativa era do Ministério da Justiça. Na gestão Bolsonaro, passou para a pasta da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, comandada por Damares Alves. A orientação dela é “fechar a torneira” das indenizações.

 

Praças. A cúpula das Forças Armadas e o núcleo dos ministros militares do governo Bolsonaro consideram “absurdo” o pagamento de indenizações aos ex-integrantes da FAB. Um brigadeiro disse ao Estado que a maioria dos pedidos de indenização é “indevida” e que muitos praças aproveitaram a política de reparação em benefício próprio.

Um ministro de origem militar afirmou que, para evitar o pagamento bilionário, o governo decidiu recorrer ao caminho “político”, além de tentar sensibilizar a opinião pública para o que ele considera uma “roubalheira” dos cofres públicos.

Em conversas reservadas, o mesmo ministro avaliou que, no começo dos trabalhos da Comissão de Anistia, as indenizações foram justas, mas logo teria começado uma série de benefícios sem fundamento histórico. Virou uma “indústria”, de acordo com ele.

Procurada, a assessoria de imprensa da FAB informou que aguarda a chegada oficial da notificação dos pedidos de indenização para definir uma “linha de ação”.

 

Pedidos. Em 2018, a Comissão de Anistia recebeu 650 novos processos, de um total de quase 77.931 apresentados desde 2002. Apenas 48 requerimentos foram deferidos no ano passado – a menor quantidade da série histórica. O auge ocorreu na “era PT”, logo após a posse de Lula, que, como ex-líder sindical, recebe aposentadoria de anistiado pelo INSS de cerca de R$ 6 mil.

De 2003 a 2010, o governo Lula concedeu 33.915 anistias. A gestão Dilma deferiu 4.264 anistias para civis e militares. Já a administração Temer liberou 442 pedidos de indenização.

Ex-ministro da Justiça do governo Lula, Tarso Genro rechaçou haver uma “farra” nas indenizações. “O valor deve ter sido destinado a milhares de pessoas atingidas pelas decisões de ‘exceção’ dos governos de fato oriundos do regime militar. Até o momento que acompanhei, estavam sendo pagas a quem de direito”, disse./  COLABOROU VERA ROSA

 

PERGUNTAS & RESPOSTAS

Comissão foi criada em 2002

1. Qual é a atribuição da Comissão de Anistia?

A Comissão de Anistia, criada em 2002, tem como objetivo reparar vítimas de perseguição política.

 

2. A quem a comissão é subordinada?

Até 2018, ao Ministério da Justiça. O presidente Jair Bolsonaro deslocou o colegiado para o Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

 

3. Quem decide sobre os pedidos de anistia?

Atualmente, a concessão da indenização e o reconhecimento como anistiado são feitos pela ministra Damares Alves. A decisão da ministra é precedida de análises e pareceres emitidos pelos conselheiros da comissão.

 

4. Quem faz o pagamento das indenizações?

Se os anistiados forem militares, a indenização entra na folha de servidores do Ministério da Defesa. Se forem civis, na do Ministério da Economia, que assumiu as funções do antigo Ministério do Planejamento.

 

5. Atualmente, qual é o total de anistiados?

Segundo lista oficial da Comissão de Anistia, são 39.329 pessoas anistiadas.