Valor econômico, v. 18, n. 4487, 20/04/2018. Brasil, p. A2

 

Ressalva em decreto põe em risco privatização rápida da Eletrobras

Rafael Bitencourt

Andrea Jubé 

20/04/2018

 

 

Michel Temer: estudos só começam após aprovação do projeto no Congresso

A surpreendente inclusão de uma ressalva na redação final do decreto presidencial que autoriza a contratação de estudos sobre a privatização da Eletrobras coloca em risco o desfecho do negócio no curto prazo, como quer o governo. A frase incluída após negociações com a Câmara dos Deputados dispõe que os estudos para a capitalização da empresa só terão início depois que o projeto de lei for aprovado no Congresso.

Pelo teor do decreto que será publicado na edição de hoje do "Diário Oficial da União" (DOU), a qualificação da Eletrobras no âmbito do Programa Nacional de Desestatização (PND) para início dos estudos pertinentes ocorrerá "tão logo seja aprovado pelo Congresso Nacional" o projeto de lei que trata da capitalização da empresa.

A negociação do texto final do documento arrastou-se por mais de um mês e o Valor apurou que a redação divulgada não passou pela área técnica. Para analistas de mercado, a condicionante incluída no texto equivale ao mesmo aceno político feito pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR), em dezembro, quando anunciou que a reforma da Previdência seria votada em fevereiro. Na ocasião já havia ficado claro que a reforma previdenciária havia sido jogada para as calendas.

O problema é que o projeto de lei se arrasta em uma comissão especial da Câmara, sem expectativa de que seja votado em curto prazo de tempo no colegiado, ou levado diretamente para o plenário. A publicação hoje desse decreto é o desfecho de uma dura negociação do Planalto com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que fez a exigência de que ficasse claro que a aprovação do PL no Congresso Nacional precede a capitalização.

O que se depreende, no momento, é que ficou mais distante a receita de R$ 12 bilhões esperada pelo governo com a privatização da empresa. A edição do decreto se tornou obrigatória por causa de uma lei de 2004 que proibiu a inclusão da Eletrobras no programa de desestatização.

Uma medida provisória em tramitação no Congresso revogou este dispositivo, mas é a inclusão no PND, por meio deste decreto, que autoriza o início do processo, com a contratação de escritórios de advocacia e assessores financeiros para promoverem a modelagem técnica do negócio.

A redação final surpreende os interessados na privatização da empresa, porque, inicialmente, a publicação do decreto era defendida, justamente, para agilizar o rito de contratação dos estudos.

O decreto qualifica a Eletrobras no Programa de Parcerias de Investimentos (PPI) e inclui a empresa no Programa Nacional de Desestatização (PND), como já era esperado. O texto indica que o Banco Nacional de Desenvolvimento Social e Econômico (BNDES) assumirá atribuições para a realização dos estudos da privatização e o Ministério de Minas e Energia estará encarregado de constituir e coordenar os grupos de trabalho.

O decreto foi assinado pelo presidente Michel Temer ontem à tarde, e imediatamente, o Planalto divulgou um vídeo comunicando o ato nas redes sociais do governo, ao mesmo tempo em que o ministro da Secretaria de Governo, Carlos Marun, dava entrevista sobre o assunto.

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Relator de projeto sobre estatal indica diretor para ONS

Daniel Rittner 

20/04/2018

 

 

O governo federal resolveu fazer uma mudança brusca no processo de sucessão de duas vagas que estão abertas na diretoria do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS).

O conselho de administração do ONS estava pronto para aprovar, em reunião marcada para hoje, as indicações de Sinval Gama e Marcelo Prais aos cargos detidos pelo Poder Executivo no órgão. O operador é uma entidade de direito privado, na qual as empresas do setor elétrico têm dois dos cinco assentos na cúpula. O diretor-geral também é indicado pelo governo.

A vaga que estava reservada para Prais, no entanto, será ocupada agora por um indicado do deputado federal José Carlos Aleluia (DEM-BA), relator do projeto de lei da Eletrobras, que tramita lentamente no Congresso Nacional. Aleluia acertou com o ministro de Minas e Energia, Wellington Moreira Franco, a indicação do engenheiro Jaconias Aguiar, ex-diretor da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

A interferência causou revolta nas associações do setor elétrico e dentro do próprio ONS, já que Prais é um dos técnicos mais respeitados da casa e hoje atua como assessor para assuntos regulatórios da diretoria-geral. Há uma tentativa de última hora para reverter essa troca, movimento que é considerado como muito improvável.

Sinval, atual presidente da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), já ocupou vários cargos no Sistema Eletrobras. É considerado ligado à família Sarney, mas é muito bem visto no mercado.