Correio braziliense, n. 20363, 20/02/2019. Mundo, p. 14

 

Militares respondem a ameaça de Trump

20/02/2019

 

 

Venezuela » Às vésperas dos embates previstos para o fim da semana em torno da entrada de ajuda humanitária, o ministro da Defesa rebate ultimato do presidente americano para que o Exército abandone Nicolás Maduro

O ministro da Defesa da Venezuela, Vladimir Padrino López, expressou ontem o “rechaço contundente” da Força Armada Nacional Bolivariana (Fanb) ao presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que na véspera reforçou a pressão aos militares do país para que abandonem o presidente Nicolás Maduro. Trump afirmou que, caso continuem leais ao governo chavista, eles “não vão ter onde se refugiar” e “perderão tudo”.

Padrino, um general, classificou o ultimato do presidente americano como “uma irresponsabilidade inédita”. Em desafio, disse que os EUA “terão de passar por cima dos nossos cadáveres” para impor o “governo fantoche” de Juan Guaidó, proclamado presidente interino pela Assembleia Nacional e reconhecido por 50 países. Acompanhado pelo alto comando militar, o ministro da Defesa avisou também que a Fanb está em alerta para evitar a anunciada entrada de ajuda humanitária no próximo sábado, organizada pela oposição.

Na segunda-feira, em Miami, durante discurso para um público composto majoritariamente por imigrantes venezuelanos e cubanos, Trump pediu que os militares chavistas aceitem a anistia oferecida por Guaidó e não reconheçam mais a autoridade de Maduro. Também os convocou a desbloquear a entrada da ajuda humanitária, na maior parte enviada pelos EUA.

“Nossa Força Armada nunca receberá ordens de potências estrangeiras e permanecerá nas fronteiras para evitar irregularidades”, frisou Padrino, antes de reiterar que os militares venezuelanos não obedecerão às ordens de Guaidó. “Só obedecemos ao presidente legítimo, Nicolás Maduro Moros”, afirmou o ministro da Defesa.

O general assegurou que os militares venezuelanos não se deixarão “chantagear”, e descreveu como “uma série de mentiras e manipulações” o que Trump e Guaidó falam sobre “essa suposta ajuda humanitária”. “A Força Armada permanecerá destacada e alerta ao longo das fronteiras, conforme ordenado por nosso comandante em chefe, para evitar qualquer violação da integridade do território”, declarou o ministro da Defesa.

Mobilização

Guaidó convocou mobilizações por todo o país, a partir de sexta-feira, para acompanhar os voluntários que vão em comboios de ônibus para as fronteiras com o objetivo de introduzir a ajuda humanitária — inicialmente, a partir da cidade de Cúcuta, na Colômbia, que recebeu nos últimos dias medicamentos e alimentos trazidos em aviões militares dos EUA.

Em meio à disputa, o presidente interino enviou mensagens pelo Twitter para cada chefe militar estacionado nos postos fronteiriços. “Em 23 de fevereiro, eles devem escolher entre servir a Maduro ou servir ao país. Permitam que a ajuda humanitária entre”, escreveu. Nessa data se completará um mês da proclamação do opositor como presidente encarregado, formalizada após a Assembleia Nacional ter declarado Maduro “usurpador”.

Na sexta-feira, Cúcuta será palco de um show com artistas internacionais, organizado pelo bilionário britânico Richard Branson, com presença dos presidentes Iván Duque (Colômbia) e Sebastián Piñera (Chile). A meta de Branson é arrecadar US$ 100 milhões para ajuda à Venezuela nos próximos 60 dias. O montante será acrescentado a mais de US$ 110 milhões levantados em semanas anteriores.

Em contrapartida, o governo de Maduro anunciou, para sexta-feira e sábado, shows na ponte Simón Bolívar, que liga Cúcuta ao povoado venezuelano de San Antonio, para denunciar “a brutal agressão” contra a Venezuela.

O presidente chavista, que também enviará carregamentos de comida para Cúcuta e oferecerá assistência médica gratuita, anunciou que hoje chegarão ao país 300 toneladas de remédios comprados da Rússia. Na semana passada, a Venezuela recebeu 933 toneladas de medicamentos vendidas por China, Rússia e Cuba.

Na frente diplomática, Guaidó reuniu-se ontem com os embaixadores de França, Reino Unido, Itália, Espanha e Alemanha, além de representantes de organizações não governamentais. Recebeu deles a garantia de uma ajuda que inclui o embarque de 70 toneladas de remédios e alimentos doados pelo governo francês.

Frase

“Só obedecemos ao presidente legítimo, Nicolás Maduro Moros”

Vladimir Padrino, ministro da Defesa da Venezuela

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Fronteira fechada

20/02/2019

 

 

O governo chavista da Venezuela determinou ontem às Forças Armadas que fechem a fronteira marítima e aérea do país com as Antilhas Holandesas, arquipélago próximo à costa venezuelana do Caribe. De lá, líder opositor Juan Guaidó espera a chegada de ajuda humanitária americana estacionada em Curaçao, confirmou o comandante militar da região, almirante Vladimir Quintero.

“Afirmativo”, respondeu Quintero, sem dar mais detalhes nem acrescentar explicações, quando questionado pela agência de notícias France-Presse sobre informações, noticiadas pela imprensa, a respeito da suspensão das comunicações marítimas e aéreas com Aruba, Bonaire e Curaçao. A decisão de fechar as fronteiras foi anunciada quatro dias antes da data marcada por Guaidó, autoproclamado presidente interino da Venezuela, para a entrada de ajuda humanitária enviada do exterior, principalmente pelos Estados Unidos. A operação foi vetada pelo presidente Nicolás Maduro, que denuncia o “prelúdio deinício de uma invasão militar” americana ao país.

Cargas de medicamentos e alimentos levados em aviões militares dos EUA estão armazenadas também na cidade colombiana de Cúcuta, perto da ponte fronteiriça de Tienditas, bloqueada por militares venezuelanos com caminhões e outros obstáculos. Outro centro de distribuição será aberto no Brasil, em Roraima (leia mais abaixo).

A Força Armada Nacional Bolivariana (Fanb) se declarou “em alerta” para evitar “qualquer violação do território” com a entrada anunciada dos donativos, no sábado. A suspensão do tráfego aéreo e marítimo com Aruba, Curaçao e Bonaire foi anunciada  por Maduro em outra situação, em janeiro de 2018, com o propósito de “frear as máfias do contrabando”.

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Brasil organiza entrega de ajuda

20/02/2019

 

 

O Brasil prepara uma operação para enviar ajuda humanitária à Venezuela no próximo sábado, em coordenação com os Estados Unidos, atendendo a um pedido do opositor Juan Guaidó, reconhecido como presidente interino por cerca de 50 países, informou ontem o porta-voz da Presidência da República, Otávio Rêgo Barros. “O governo brasileiro está mobilizando uma força-tarefa interministerial para definir a logística da prestação de ajuda humanitária ao povo da Venezuela, a partir de 23 de fevereiro”, anunciou o porta-voz.

O assunto foi tratado durante reunião da cúpula dos três Poderes da República, no Palácio do Planalto. Além do presidente Jair Bolsonaro e dos presidentes do Supremo Tribunal Federal, Dias Toffoli, do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), participaram do encontro os ministros Fernando Azevedo (Defesa), Ernesto Araújo (Relações Exteriores) e Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional).

O Brasil foi um dos primeiros países a reconhecer o governo interino de Guaidó. O presidente Bolsonaro prometeu apoio político e econômico ao processo de transição, “para que a democracia e a paz social voltem à Venezuela”.

Na semana passada, a embaixadora nomeada por Guaidó para representá-lo no Brasil, María Teresa Belandria, entregou as credenciais ao chanceler — o que marca o seu reconhecimento pelo governo brasileiro — e acertou com o Itamaraty a instalação de uma central de distribuição de ajuda humanitária em Roraima ,estado fronteiriço à Venezuela.

O governo Bolsonaro lidera uma operação, batizada de Acolhida, que inclui o ordenamento de fronteira, o acolhimento e a interiorização dos imigrantes venezuelanos. Atualmente, existem 13 abrigos em Roraima, dos quais 11 em Boa Vista e dois no município de Pacaraima, segundo levantamento do Ministério da Defesa.

Cuba

Em outro desdobramento da crise, Cuba rechaçou a “infame” acusação dos EUA sobre a presença de tropas cubanas na Venezuela para apoiar o presidente socialista Nicolás Maduro, um aliado. O regime de Havana desafiou Washington a apresentarem provas.

“A acusação do presidente dos Estados Unidos (Donald Trump) de que Cuba mantém um exército privado na Venezuela é infame, e peço que apresentem provas”, declarou o chanceler Bruno Rodríguez, falando à imprensa na capital cubana. “Nosso governo rechaça essa calúnia nos termos mais fortes e categóricos.”