Valor econômico, v.18 , n.4456, 07/03/2018. Política, p. A6

 

Barroso determina investigação de vazamento de quebra de sigilo 

Andrea Jubé

Cristiane Bonfanti

Maíra Magro 

07/03/2018

 

 

O presidente Michel Temer reagiu com surpresa e irritação à determinação de quebra de seu sigilo bancário pelo ministro do Supremo Tribunal Federal Luís Roberto Barroso. Ele confidenciou a aliados que se transformou em alvo involuntário de um embate interno em curso no Supremo entre Barroso, autor da decisão, e o ministro Gilmar Mendes, que passou a integrar seu círculo de conselheiros.

Barroso é relator do inquérito que investiga Temer por supostas irregularidades na edição sobre um decreto sobre portos. Ontem, uma semana depois da quebra do sigilo do presidente, ele determinou a investigação de um possível vazamento de informações sobre o caso. Em resposta a uma petição da defesa de Temer requerendo acesso ao despacho que determinou a quebra do sigilo, Barroso questionou o fato de os advogados mencionarem números sigilosos nessa petição. "A petição apresentada pela ilustre defesa do Excelentíssimo Senhor Presidente da República revela conhecimento até mesmo dos números de autuação que teriam recebido procedimentos de investigação absolutamente sigilosos", afirma o ministro.

"Diante de novo vazamento, determino seja incluída na investigação - cuja abertura foi por mim determinada nesse inquérito, no despacho de 27 de fevereiro -, a apuração das responsabilidades cabíveis."

Temer avaliava ontem com advogados e auxiliares próximos a conveniência de recorrer da decisão da quebra de sigilo, porque não querer passar a impressão de que teria algo a esconder. Ele recebeu no Planalto o advogado Brian Alves Prado, da equipe de Antônio Mariz de Oliveira. Outra dúvida era quanto a um possível açodamento na declaração de que divulgará à população, por meio da imprensa, os dados bancários solicitados por Barroso.

Aliados ponderavam ao presidente que a exposição dessas informações suscitaria uma devassa em sua vida privada. São quatro anos e meio de movimentações, entre 2013 e 2017.

Ontem o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse que a decisão é um "fato anômalo", que atinge o governo numa fase de notícias positivas decorrentes da ofensiva na área de segurança pública.

Padilha acrescentou que houve estranhamento no governo diante da ausência de um requerimento nesse sentido da procuradora-geral da República, Raquel Dodge.

Barroso teria acolhido um pedido do delegado Cleyber Malta, segundo o qual não seria possível avançar nas investigações sem a abertura desses dados. O inquérito investiga supostas irregularidades na edição de um decreto na área de portos, que teria favorecido a empresa Rodrimar, tendo como contrapartida o pagamento de propina. O negócio teria sido intermediado pelo ex-assessor da Presidência Rodrigo Rocha Loures, também alvo da investigação.

Na avaliação de Temer e aliados próximos, o presidente estaria sofrendo as consequências das desavenças internas entre Barroso e Gilmar. Há uma semana, ambos protagonizaram um bate-boca público: Gilmar declarou que o colega de tribunal "não sabe o que é um alvará de soltura, fala pelos cotovelos e antecipa julgamento". Barroso rebateu no mesmo tom: "Não frequento palácios, não troco mensagens amistosas com réus e não vivo para ofender as pessoas."

Antes, Barroso havia intimado, em pleno fim de semana, o então diretor-geral da Polícia Federal, Fernando Segóvia, para esclarecer declarações feitas pelo delegado em uma entrevista sobre este inquérito. Após algumas semanas, Segóvia acabou afastado pelo novo ministro da Segurança Pública, Raul Jungmann.

Esta é a primeira vez que um presidente da República tem o sigilo quebrado por ordem judicial. Além de Temer e Rocha Loures, são investigados o presidente do grupo Rodrimar, Antônio Celso Grecco, o diretor da empresa Ricardo Mesquita, o coronel João Baptista Lima Filho e o advogado José Yunes, amigos próximos de Temer.