O globo, n. 31341, 29/05/2019. País, p. 6

 

Pacto entre poderes

Jussara Soares

29/05/2019

 

 

Dois dias após atos de rua, Bolsonaro tenta acordo com Legislativo e Judiciário

Na tentativa de aparar rusgas e retomar o crescimento econômico, o presidente Jair Bolsonaro se reuniu ontem com os chefes dos outros Poderes, em café da manhã no Palácio da Alvorada, para lançar um “pacto de entendimento e metas”.

O encontro ocorreu dois dias depois dos atos favoráveis ao governo, que tiveram também críticas ao Legislativo e ao Judiciário.

Além das reformas da Previdência e tributária, Bolsonaro aposta em medidas para dar mais poder a estados e municípios, uma de suas promessas de campanha. O pacto também prevê medidas na área da segurança.

Uma minuta do texto foi apresentada na reunião com os presidentes do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli; da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ); e do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP). A união em favor das pautas em caráter geral, no entanto, não resolve discordâncias nos detalhes de cada medida.

A relação de Bolsonaro com o presidente da Câmara tem sido marcada por atritos. Eles já tiveram batebocas públicos por causa da articulação política do governo para aprovar a reforma da Previdência. Maia foi um dos principais alvos de crítica dos bolsonaristas nos atos do último domingo.

Maia reticente

Durante o encontro, o presidente da Câmara foi o mais reticente. Embora tenha concordado com as pautas, Maia defendeu que elas não fossem tão específicas.

— Vou levar aos líderes (partidários) para que leiam e deem o de acordo para que eu possa assinar — disse Maia, após o encontro.

Entre as propostas defendidas por Bolsonaro está a reformulação do pacto federativo, para dar garantias de empréstimo a estados e municípios em troca de medidas fiscais, e leis que reduzam a interferência do Estado na vida dos cidadãos, outra bandeira de campanha. De acordo com um auxiliar de Bolsonaro, também devem estar entre as metas a proteção à vida e à liberdade de expressão.

A ideia do pacto foi apresentada pelo presidente do STF em outubro do ano passado com pontos convergentes com os de Bolsonaro. Em fevereiro deste ano, segundo um auxiliar do Palácio do Planalto, a iniciativa ganhou a simpatia de Bolsonaro e coube à Casa Civil fazer uma nova versão do documento.

O ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, afirmou que o documento foi “praticamente validado por todos” e agora passará por ajustes finais. A assinatura está prevista para dia 10.

As questões de cada um

Jair Bolsonaro

Apesar de não ter uma base parlamentar, o presidente mostrou no fim de semana que preserva um grupo significativo de seguidores. Ao retomar a discussão de um pacto republicano, Bolsonaro tenta se distanciar dos ataques de seus apoiadores ao Congresso e ao Poder Judiciário. A tarefa não é fácil. Há muita desconfiança dos parlamentares, por considerarem que a mobilização virtual é orquestrada pelo núcleo mais radical do governo.

Dias Toffoli

O presidente do Supremo foi o idealizador do pacto republicano, ainda no ano passado. A defesa explícita de temas como as reformas, no entanto, fragiliza sua atuação como juiz nessas pautas. Não está claro até o momento se Toffoli conta com a anuência dos demais integrantes da Corte para a mobilização. Por outro lado, o pacto pode ajudá-lo a reduzir o desgaste sofrido desde que abriu um inquérito para investigar ataques ao STF.

Rodrigo Maia

Um dos principais alvos dos protestos bolsonaristas, o presidente da Câmara vê com ceticismo a aproximação do Planalto. Sua relação com Bolsonaro já vinha sendo marcada nos últimos meses por trocas de farpas, e há pouco espaço para uma reconciliação efetiva. Maia, no entanto, pretende fazer o contraponto ao Planalto tomando para si a liderança da agenda de reformas econômicas, privilegiando as posições dos congressistas.

Davi Alcolumbre

O Presidente do Senado, eleito para o cargo com apoio de Bolsonaro, tem conseguido passar incólume pela crise entre os poderes. Até o momento, tem sido ajudado pelo fato de as propostas prioritárias estarem na Câmara. Ontem, no entanto, a dificuldade de garantir a votação rápida da medida provisória que reorganiza os ministérios deixou claro que o desafio de se manter longe da tensão entre os poderes não será pequeno.

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Maia quer acelerar votação da reforma da Previdência

Manoel Ventura

29/05/2019

 

 

Presidente da Câmara pediu para relator na comissão especial antecipar em uma semana apresentação de parecer; ele concordou

O Presidente da Câmara pediu a relator da reforma da Previdência, Samuel Moreira, que apresente texto na comissão especial antes de 15 de junho. O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), quer antecipar o calendário de votação da reforma da Previdência. Ele afirmou ontem que pediu ao relator da proposta, deputado Samuel Moreira (PSDB-SP), que a presente seu texto na comissão especial antes do dia 15 de junho.

— O tempo está ficando apertado e pedi ao relator que antecipe em uma semana ou cinco dias a leitura do texto. Esperamos chegar na economia que o ministro Paulo Guedes dese japara a Previdência.

Moreira afirmou que não vê problema em antecipar seu parecer em alguns dias. Caso a apresentação do relatório seja antecipada, deve haver tempo da proposta ser votada também no plenário da Câmara ainda no primeiro semestre.

Bolsonaro prova Maia

Apesar de um dia de pactos, o presidente Jair Bolsonaro afirmou, em discurso na noite de ontem, ter mais poder que Maia, e prometeu usar sua caneta Bic para revogar decretos, portarias e instruções normativas que atrapalhem quem quer produzir e investir.

—Eu disse( pela manhã) para ele, Maia: coma caneta, eu tenho muito mais poder do que vocês, apesar de você fazer leis. Eu tenho o poder de fazer decretos. Evidente que decretos com fundamentos — disse Bolsonaro em evento, em Brasília, do lançamento da Frente Parlamentar Mista da Marinha Mercante Brasileira.

Após as manifestações de domingo, Maia reconheceu a aliados que a narrativa martelada pelo governo e por pessoas que foram às ruas de que “o centrão quer cargos” foi bem explorada.

A negociação para a recriação de dois ministérios na tramitação da Medida Provisória 870, que tinha o aval do presidente, é um exemplo. Mesmo depois de ter concordado com a iniciativa, Bolsonaro recuou, sem interceder diante das acusações de que a Câmara buscava o “toma lá, dá cá”.

Segundo aliados, Maia deve evitar responder publicamente às provocações bolsonaristas. A ideia é tocara reformada Previdência e liderar apauta de reformas econômicas.