O globo, n. 31327, 15/05/2019. País, p. 8

 

Centrão cancela encontro com Bolsonaro

Bruno Góes

Natália Portinari

15/05/2019

 

 

De última hora, integrantes de siglas nanicas foram levados ao presidente. Líder do governo disse a aliados que, se MP da reforma administrativa cair, Planalto vai nomear sete generais para os ministérios que serão criados

O presidente Jair Bolsonaro tentou ontem conversar com dois líderes de partidos do centrão, mas o encontro foi cancelado pelos parlamentares. A convite do líder do governo na Câmara, Major Vitor Hugo (PSL-GO), os deputados Elmar Nascimento (DEMBA) e Arthur Lira (PP-AL) iriam ao Palácio do Planalto para que o presidente pudesse fazer um gesto de aproximação.

A rejeição ao governo na Câmara, entretanto, prevaleceu. De última hora, então, foram levados ao presidente líderes de partidos nanicos, que somam apenas 43 deputados.

Ontem, o governo ainda teve outros reveses. Além de aprovar a convocação do ministro da Educação, Abraham Weintraub, por 307 votos a 82, deputados decidiram que não vão votar nenhuma Medida Provisória (MP) esta semana. A ação dos líderes, em negociação coordenada entre centrão e oposição, pode fazer com que a reforma ministerial de Bolsonaro, feita no primeiro dia do ano, seja prejudicada.

Embora o líder do governo tente incluir na pauta de votações a MP 870, que reduziu os ministérios de 29 para 22, há outras cinco propostas na fila, com prioridade. Caso a medida que reestruturou o governo não seja votada até 3 de junho, perde a validade. Ou seja, volta a valer o número de pastas do governo Michel Temer.

Para recusar o encontro, Elmar Nascimento e Arthur Lira disseram que a conversa havia sido combinada há mais de dois meses, e que as circunstâncias agora são outras. Foram convidados então representantes de um grupo menor que vem se mobilizando para manter, na votação da MP da reforma administrativa, o Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) sob a alçada do ministro da Justiça, Sergio Moro.

O grupo, convocado às pressas por Vitor Hugo, incluiu PPS, PSC, Podemos, Patriota, Novo e PV. Juntas, essas legendas têm 43 deputados. Após a MP passar por uma comissão na última quinta-feira, esses partidos se uniram para tentar impedir a votação no mesmo dia, no plenário da Câmara, apesar de o próprio ministro da Casa Civil, Onyx Lorenzoni, ter feito um acordo com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para aprovar a matéria.

Posição de Bolsonaro

Na reunião de ontem com esses partidos, Bolsonaro disse que apoia a manutenção do Coaf no Ministério da Justiça. Além disso, admitiu que a MP pode, de fato, perder a validade, mas ressaltou que o governo não abriria mão de sua posição.

Líderes do centrão estão irritados com declarações recentes de Vitor Hugo, que indicou ter apoio de “vários líderes” para votar a MP ainda esta semana e colocou em suspeição parlamentares que queriam votar “tão apressadamente” a proposta na semana passada.

Enquanto a líder do governo no Congresso, deputada Joice Hasselmann (PSLGO), tenta costurar um acordo com líderes do centrão, Vitor Hugo resolveu unir os esforços com outros partidos. Segundo líderes do centrão ouvidos pelo GLOBO, não há clima político para votar nenhuma medida provisória.

No início da noite de ontem, o porta-voz da Presidência, Otávio do Rêgo Barros, foi questionado sobre a desistência dos líderes de DEM e PP e disse que o governo entende “com naturalidade os fatos que ocorrem no Congresso Nacional”. Ele afirmou que “as adaptações da agenda foram de fato realizadas”, mas que não tem informações sobre o que motivou a alteração.

Em sintonia com Bolsonaro, Vitor Hugo deu a entender que pode defender a manutenção do Coaf no Ministério da Justiça a todo custo. A aliados, ele tem dito que, se o Congresso não chegar a um acordo sobre a medida provisória, o máximo que pode acontecer é o governo nomear sete generais para os ministérios que serão criados.

O GLOBO ouviu de três parlamentares que Vitor Hugo cogitou a hipótese de generais ocuparem os sete ministérios que serão criados, caso não haja acordo para votar a MP. Procurado, o líder do governo disse que se trata de uma “brincadeira” e que o presidente terá “liberdade para indicar os ministros”. Hoje, oito ministros são militares.

Algumas alterações feitas no texto original da medida provisória pela comissão especial, como a recriação de dois ministérios (Integração Nacional e Cidades), a devolução do Coaf para o Ministério da Economia e a proibição de que auditores da Receita Federal investiguem crimes não fiscais, como corrupção, foram questionadas pelo grupo de parlamentares recebido ontem por Bolsonaro.

A declaração de Vitor Hugo expõe uma divergência entre ele e o ministro da Casa Civil. Onyx já havia admitido a derrota nos bastidores e contava com a aprovação célere da Medida Provisória.