Valor econômico, v.19 , n.4654 , 20/12/2018. Empresas, p. B2

 

Regras corporativas contra corrupção reduzem os jabás

Emma Jacobs

20/12/2018

 

 

O Natal pode ser a época mais maravilhosa do ano, mas quando se trata de presentes corporativos, a coisa mudou muito. "Já estou aqui há tempo suficiente para me lembrar dos velhos tempos", diz Crispin Rapinet, que comanda a prática de investigações globais, fraudes e crimes de colarinho branco do escritório de advocacia Hogan Lovells. "As pessoas enviavam uma caixa de vinhos e você a levava para casa para apreciar com a família, sem precisar declarar isso a ninguém."

As regras de combate à corrupção e os orçamentos corporativos mais restritos significam que quando o assunto é mandar presentes aos clientes e fornecedores no Natal, os patrões aconselham cautela. Conforme diz um banqueiro: "O advento da compliance realmente acabou com o Natal". Muitas companhias agora enviam produtos baratos como cadernos, carregadores de celulares e copos reutilizáveis.

"A crise bancária basicamente mudou a economia mundial e as coisas não voltaram a ser como eram", afirma Rapinet. Isso coincidiu, segundo ele, com uma maior conscientização e escrutínio das práticas que levam à corrupção e também com uma mudança cultural.

No Reino Unido, por exemplo, o Bribery Act entrou em vigor em 2010. Hoje, grandes empregadores possuem códigos de ética que incluem políticas de presentes. Nos Estados Unidos, Moira McGinty Klos, vice-presidente da rede de organizações sem fins lucrativos Ethics and Compliance Initiative, diz que não existe uma regra universal, mas a maioria das empresas estipulou o valor máximo dos presentes em US$ 25 (pouco menos de R$ 100).

Geralmente, os funcionários serão solicitados a entregar os presentes acima desse valor para a empresa, que pode doá-los a instituições beneficentes. Flores ou comida podem ser distribuídos para as equipes. As diretrizes elaboradas pela Alphabet, a controladora do Google, por exemplo, aconselham que "no geral, é permitido aceitar presentes baratos que não envolvam dinheiro".

Satingar Dogra, sócio de resolução de litígios do escritório de advocacia Linklaters, tem visto empresas tomarem um cuidado muito maior com eventos como Wimbledon e a Copa do Mundo, e impor limites financeiros que precisam de aprovação gerencial para serem superados. "Também tenho visto empresas imporem controles muito mais rígidos quando autoridades públicas estão envolvidas - por exemplo, nada de dar presentes", diz.

Mesmo assim, Simon Thompson, diretor de varejo e hospitalidade da loja de departamentos Fortnum & Mason, diz que os negócios estão aquecidos. Alguns clientes corporativos compraram cestas de Natal "imperiais" para dar de presente. Elas incluem champanhe, vinho do Porto, bolo de Natal, carne bovina e presunto. O preço: seis mil libras.

Andy Ducksbury é diretor de vendas da Prominate, que encomenda e despacha presentes corporativos para clientes de negócios, além de presentes promocionais. "Historicamente, lidávamos com artigos de couro de luxo, especialmente para as companhias farmacêuticas, além de canetas Montblanc avaliadas em centenas de libras. Mas há dez anos não vemos mais esse tipo de gasto", diz.

Robert Cialdini, psicólogo social e autor do livro "A Arte da Persuasão", diz que em sua própria empresa, a Influence at Work, ele tenta dar "um valor não monetário aos nossos presentes, personalizando-os para o recebedor". Isso pode envolver, por exemplo, inscrever o nome do cliente, juntamente com o nome da companhia (em um corpo bem menor), em canetas ou garrafas d'água. "A prática envolve um custo pequeno para nós, mas um grande aumento no valor da experiência do presente para os nossos clientes", afirma.

Até mesmo pequenos presentes têm um efeito sobre o recebedor, diz Cialdini, citando um estudo de uma confeitaria que mostrou que se os clientes recebem um chocolate na entrada, aumentam as possibilidades de eles comprarem alguma coisa.

Em estudos em que os pesquisadores deram pequenos presentes aos participantes, como canetas ou canecas, eles constataram que esses objetos "têm uma grande influência sobre o comportamento do recebedor em favor de quem deu o presente". "Os participantes estão cientes de que o presente foi dado para influenciar seu comportamento, mas mesmo assim retribuem... Receber um presente desencadeia uma obrigação de pagar esse presente", diz Cialdini.

Mick Humphries, diretor de vendas do TC Branding Group, afirma que os gostos mudaram. Dez anos atrás, "a cultura envolvia muito vinhos e outra bebidas. Não estamos mais seguindo esse caminho... as empresas agora precisam parecer responsáveis, e não só na época do Natal. As pessoas no geral estão mais cuidadosas".

Andy Thorne, diretor de vendas e marketing da Oustanding Branding, concorda. "Antes, muita gente dava vinhos ou abridores de garrafas de vinho. O mundo mudou. As pessoas não querem ser vistas encorajando outras a beber." Isso pode acontecer por motivos de saúde ou de religião.

As empresas querem ser vistas como ecologicamente corretas e estão cautelosas com o envio de presentes que possam acabar no aterro sanitário. Ainda assim, chapéus em formato de peru e canetas que acendem podem estar a caminho das salas de correspondência das empresas. Um fornecedor tentou apostar em "taças de vinho que acendem", diz Humphries.

Outra tendência são os suéteres de marca com motivos natalinos. O recebedor é então encorajado a fazer uma foto usando a blusa e a postá-la nas redes sociais, conseguindo com isso a chance de ganhar um prêmio.

Uma pesquisa conduzida pela Associação Britânica de Merchandises Promocionais descobriu que 87% das pessoas consultadas geralmente guardam itens promocionais por mais de um ano, então os presentes podem mesmo promover a conscientização de marca de forma contínua.

Jon Birrell, executivo-chefe da associação, diz: "Ainda vendemos mousepads. Surpreendentemente, algumas pessoas ainda os compram. Os copos reutilizáveis estão vendendo muito no momento". O problema então passa a ser como chamar a atenção em meio a todos os outros copos reutilizáveis.

A personalização é a dica de John Ruhlin. O especialista em presentes e autor de "Giftology" chega ao ponto de acrescentar os nomes dos membros da família da pessoa que está recebendo o presente. Sua principal mensagem, no entanto, é poupar o orçamento corporativo para outra época do ano, quando é maior a probabilidade de ser notado e a distribuição de presentes não parece tão relacionada aos negócios. "Sou como o Grinch. Não gasto nada do meu orçamento entre o dia de Ação de Graças e o Natal", diz.