O globo, n. 31316, 04/05/2019. País, p. 4

 

Entrevista - Gilberto Giradelli: ‘Falta estrutura para receber essas ações’

Gilberto Giradelli

04/05/2019

 

 

A concentração de processos com crimes conexos a caixa dois na Justiça Eleitoral é benéfica ou pode representar desafio?

Não vejo como positiva a remessa desses processos para a Justiça Eleitoral, exatamente pela falta de estrutura para o processamento desse tipo de ação que sabidamente é mais complexa.

Que tipo de adaptações o tribunal vem planejando para atender à decisão do STF?

A providência seria de, primeiramente, definir a quantidade dessas ações que viriam para a Justiça Eleitoral. Isto, porém, não é fácil, porque os processos e eventuais recursos estão espalhados pelas inúmeras varas criminais do estado e até mesmo nos respectivos Tribunais de Justiça e nos demais tribunais superiores.

Será necessária uma reorganização para atender à nova demanda de casos?

Seria necessário verificar caso a caso, para identificar se os possíveis crimes de corrupção e lavagem de dinheiro têm alguma vinculação com as campanhas eleitorais.

O tribunal considera, para atender à nova demanda, concentrar em zonas eleitorais específicas os casos de corrupção conexos a crimes de caixa dois?

A princípio, a melhor alternativa seria a atribuição de competências a determinadas zonas eleitorais para esses processos, escolhendo juízes com prática na atuação em varas criminais e servidores em número suficiente para o satisfatório processamento das ações.

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Entrevista - Carlos Eduardo Padin: ‘Temos condições de receber essa demanda’

Carlos Eduardo Padin

04/05/2019

 

 

A concentração de processos com crimes conexos a caixa dois na Justiça Eleitoral é benéfica, ou pode representar desafio?

Não digo que é benéfica, nem prejudicial, nem que representa desafio. É uma vinda de processos cuja quantidade se desconhece. Nossa expectativa está dentro da normalidade. Nós nos sentimos, evidentemente, em condições de receber e nos adequar a essa demanda. O Brasil é muito grande e os estados são distintos. É preciso antes que possamos dimensionar essa demanda, caso contrário ficamos na mera especulação, e fazendo agravos à Justiça Eleitoral sem o menor cabimento.

Que tipo de adaptações e reorganizações o tribunal vem planejando para atender à decisão do STF?

As soluções são variadas. É possível especializar determinadas varas, ou fazer pedidos de convocação maiores de juízes. Vamos adequar recursos humanos e materiais à demanda, que já é o que normalmente nós fazemos.

O tribunal considera, para atender à nova demanda, concentrar em zonas eleitorais específicas os casos de corrupção conexos a crimes de caixa dois?

Essa é uma das alternativas. No Brasil todo nós temos varas especializadas em várias matérias. Não seria nenhuma novidade especializar algumas zonas eleitorais para essa ou aquela matéria.

Como avalia a possibilidade de que juízes federais reforcem a atuação dos tribunais eleitorais?

Não vejo necessidade. A Justiça Eleitoral tem bastante capilaridade.

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A queda de braço pelos crimes eleitorais

Bernardo Mello

Carolina Brígido

Marlen Couto

04/05/2019

 

 

 Recorte capturado

Juízes federais e estaduais concorrem por protagonismo e ganhos extras

Uma audiência pública organizada ontem pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE) expôs uma disputa corporativa entre juízes estaduais e federais, intensificada nos últimos meses. Em março, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que crimes como corrupção e lavagem de dinheiro, quando ligados a caixa dois, poderão tramitar na Justiça Eleitoral, formada atualmente por juízes estaduais. A audiência do TSE visava a debater a adaptação da Justiça Eleitoral, já sobrecarregada, para esse aumento de demanda. Associações ligadas à Justiça Federal, no entanto, têm defendido que juízes desse ramo ocupem postos na primeira instância dos Tribunais Regionais Eleitorais (TREs). Entidades de representação estadual e até alguns presidentes de TREs, por outro lado, entendem que o preenchimento das vagas com juízes estaduais já seria suficiente para a demanda. Por trás da queda de braço pela prerrogativa de julgar crimes eleitorais existem fatores que vão desde a remuneração dada a juízes com atuação eleitoral até a tentativa de garantir que o Ministério Público Federal (MPF) e tribunais federais continuem atuando em crimes como os da Lava-Jato. Membros dos TREs também têm interpretações distintas sobre o novo cenário (leia as entrevistas abaixo).

Gratificação de R$ 5 mil

O objetivo da audiência de ontem foi justamente colher sugestões para o grupo de trabalho, coordenado pelo ministro do TSE Og Fernandes, que estabelecerá diretrizes para adaptar a Justiça Eleitoral à decisão do STF. Em abril, a Corte decidiu que crimes comuns conexos a delitos eleitorais devem ser julgados por cortes eleitorais. Em março, a procuradorageral da República, Raquel Dodge, pediu ao TSE a convocação de juízes federais para atuar na Justiça Eleitoral. Nesses casos, processos criminais conexos a crimes eleitorais seriam conduzidos pelo Ministério Público Federal, e não pelo Ministério Público Estadual. Em 2012, o TSE já negou um pedido da Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe) e de outras quatro associações para que os juízes federais também pudessem ocupar cargos na primeira instância eleitoral. Na época, o TSE entendeu que a Constituição reserva essa função aos juízes estaduais. Na audiência de ontem, o presidente da Ajufe, Fernando Mendes, apresentou a proposta de incluir um juiz federal, além do juiz estadual, em cada uma das zonas eleitorais do país:

— A decisão do STF colocou um impacto significativo no tipo de trabalho da Justiça Eleitoral. Há uma transformação da realidade fática, principalmente a partir da atuação da Lava-Jato. Você repassar para a Justiça Eleitoral um contexto de macrocriminalidade e lavagem de dinheiro, que cabe à Justiça Federal, pode levar à ineficiência do sistema.

Já o presidente da Associação de Magistrados Brasileiros (AMB) Jayme Martins, que reúne representantes dos Tribunais de Justiça (TJs) dos 26 estados mais o Distrito Federal, defende a convocação de juízes estaduais para reforçar as varas eleitorais: — É falsa a afirmação de que a decisão do STF conduz à impunidade. A magistratura brasileira como um todo atua firme no combate à corrupção. Todos os juízes são da maisal ta competência. Nesse caso,éa Justiça Estadual que atua na Justiça Eleitoral. A disputa também envolve uma gratificação de R$ 5.390,26, paga ao juiz convocado para atuar na Justiça Eleitoral. Atualmente, são chamados juízes estaduais. Magistrados federais passariam a receber o benefício extra caso atuem nos TREs. Cada tribunal tem se preparado deforma distinta para anova demanda de processos. Os TREs da Bahi aedo Rio Grande do Sul publicaram resoluções que instituem zonas eleitorais específicas para julgar os crimes comuns. O TRE de Pernambuco, que criou seu próprio grupo de trabalho para debater o assunto, sugeriu ao TSE destinar às 11 zonas eleitorais da capital Recife os julgamentos sobre crimes conexos adelitos eleitorais. Outros tribunais informaram que estudam medida sou que aguardam a resolução do TSE. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), referentes a 2017, apontam a discrepância na realidade dos TREs. A relação entre casos pendente se o total de mostra que há grande acúmulo de processos, oque resulta em lentidão. O Rio Grande do Norte lidera alista com 116 casos ainda pendentes para cada magistrado do TRE local.