Valor econômico, v.20, n.4800, 25/07/2019. Brasil, p. A8

 

ANP estuda como 'dar mais opções' a consumidor de gás 

André Ramalho 

25/07/2019

 

 

Para além do programa de abertura do mercado de gás natural, com foco no aumento da competitividade industrial, o governo prepara também um pacote de medidas para flexibilizar a comercialização dos botijões de gás liquefeito de petróleo (GLP), o gás de cozinha. A expectativa é que o assunto seja objeto de uma resolução do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), em agosto. Em paralelo, a Agência Nacional do Petróleo (ANP) estuda hoje uma longa pauta de medidas para "dar mais opções ao consumidor", disse ontem o diretor-geral do órgão regulador, Décio Oddone.

A ANP avalia iniciativas como a permissão para que o cliente encha de forma parcial o botijão, sem ser obrigado a comprar o cilindro cheio, e a permissão para a venda de botijões sem a marca do distribuidor. Hoje, uma distribuidora não pode encher o botijão de uma marca diferente da sua. Esse modelo é entendido como uma barreira à entrada de novos agentes que não possuem uma infraestrutura consolidada no mercado brasileiro, para operar essa troca de cilindros com os concorrentes. De acordo com dados da agência, o Grupo Ultra lidera o mercado de distribuição, com 23,51% de participação, seguido por Liquigás (21,38%) e Supergasbras (20,13%)

"A retroca de botijão custa dinheiro. [A flexibilização] Vai aumentar a competição. A marca, hoje, é uma reserva de mercado", disse Oddone. "O modelo do mercado de GLP hoje é engessado e restritivo", afirmou

O diretor-geral da ANP também destacou que o órgão regulador estuda uma resolução para liberar o GLP para outros usos (hoje o combustível não pode ser usado para aquecimento de saunas, piscinas e para motores a explosão) e outras medidas como a instalação de chips nos novos botijões. O objetivo, nesse caso, é ajudar no combate à informalidade e crimes associados à lavagem de dinheiro e controle e milícias sobre a revenda.

Ainda na esfera do CNPE, o governo avalia acabar com os preços diferenciados do botijão de gás de 13 quilos. O produto é vendido pela Petrobras a preços mais baratos do que o mesmo gás comercializado para indústrias e comércio, por força de uma resolução de 2005 do conselho. O fim da diferenciação dos preços é a condição primária para atração de investimentos na infraestrutura de abastecimento do setor.

Em paralelo, a ANP pretende concluir até o fim de agosto uma análise sobre o modelo de precificação da Petrobras para o GLP. Oddone explicou que a Petrobras precifica hoje o gás com base no mercado europeu, mas importa sobretudo dos Estados Unidos. Se a ANP entender que precificação da estatal não segue as "práticas adequadas", o órgão regulador acionará o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), disse Oddone.

Algumas das propostas da ANP enfrentam resistência das distribuidoras. Na avaliação do Sindicato Nacional das Empresas Distribuidoras de GLP (Sindigás), a venda fracionada de GLP e o fim da marca não garantirão a queda dos preços do botijão de gás para os consumidores.

"O GLP é um produto de escala. Qualquer produto vendido em menor quantidade, seja ele um botijão, seja ele um cream cracker, é mais caro por quilo. Além disso, o enchimento fracionado exigiria o desenvolvimento de novas embalagens, que podem custar entre 50% e 120% mais caro", afirma o presidente do Sindigás, Sérgio Bandeira de Mello.

O Sindigás também questiona a proposta de permitir a venda de botijões sem a marca do distribuidor. Bandeira de Mello destaca que é a marca estampada nos cilindros que permite identificar as empresas responsáveis por eventuais não conformidades.

O advogado José Roberto Faveret, sócio do escritório Faveret Lampert, vê como positiva a iniciativa da ANP de rever a regulação, na direção de um mercado mais liberalizado. "A regulação do mercado de combustíveis no Brasil foi ao longo do anos virando um labirinto jurídico que eleva o custos das empresas. A ANP está fazendo uma reflexão sobre sua regulação, para simplificá-la", afirma.