Valor econômico, v.19, n.4695, 21/02/2019. Política, p. A8

 

Aposentado que trabalha pode perder direito a multa de 40% do FGTS

Edna Simão 

Fabio Graner 

Fábio Pupo

21/02/2019

 

 

O governo Bolsonaro pegou carona na reforma da Previdência Social para adotar medidas mais amigáveis às empresas que aos trabalhadores. A proposta de emenda constitucional (PEC), enviada ontem ao Congresso Nacional, prevê o fim do pagamento da multa de 40% do saldo do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) para o trabalhador que já estiver aposentado pelo Instituto Nacional do Seguro Social (INSS), em caso de rescisão contratual. Com isso, também foi retirada a obrigatoriedade de recolhimento de FGTS dos empregados.

Segundo o secretário especial de Previdência, Leonardo Rolim, apesar de criar uma barreira a menos para demissão do trabalhador aposentado, a medida tem como objetivo estimular o emprego e reduzir os custos desse empregado para as companhias.

Rolim afirmou que o aposentado que estiver trabalhando, no momento em que a proposta de emenda constitucional (PEC) for aprovada, não terá mais o acesso a multa correspondente a 40% do saldo do FGTS. "A empresa não pagará [multa de 40%] para esse trabalhador já que o FGTS é uma proteção contra o desemprego. Por ser aposentado, não tem sentido falar em desemprego", destacou Rolim.

Outra medida que consta da proposta e atinge especialmente o trabalhador de menor renda é a restrição da concessão do abono salarial a quem recebe um salário mínimo. Atualmente, esse limite é de dois salários mínimos. O secretário especial de Previdência Social e Trabalho, Rogério Marinho, explicou que a medida está em linha com a realidade fiscal do país no momento. Ele lembrou que quando o benefício foi criado a realidade fiscal era totalmente diferente e o benefício visava compensar o baixo valor do salário mínimo pago à época. "Naquela ocasião, a realidade fiscal era totalmente diferente de hoje", ressaltou Marinho. Segundo o secretário, o país precisa de recursos para resolver o problema fiscal atual.

A PEC da reforma estabelece medidas para transparência das contas públicas. Se aprovada pelo Congresso Nacional, haverá uma segregação do orçamento da seguridade social entre saúde, previdência e assistência. Com a medida, será possível avaliar onde estão sendo gastos os recursos públicos. Além disso, prevê o fim da incidência da Desvinculação de Recursos da União (DRU) da seguridade social, ou seja, da transferência de 30% da arrecadação do PIS-Pasep, principal fonte de receita do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT), para o Tesouro Nacional. Com isso, também haverá uma redução de 40% para 28% das receitas do PIS/Pasep destinadas ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). "28% do PIS/Pasep para o BNDES já é real porque retiramos a DRU, que levava a esse nível de repasse [40%]", disse Marinho.

Nos últimos anos, o FAT - que financia o seguro-desemprego e abono salarial - tem registrado sucessivos déficits que têm sido cobertos pelo Tesouro Nacional. Com o fim da desvinculação da DRU, redução dos repasses ao BNDES e restrição ao abono salarial, o rombo deverá ser reduzido consideravelmente. Segundo Rolim, o fim da incidência da DRU e menor repasse para o BNDES deve ajudar a ampliar os recursos da seguridade social, que foi deficitária em R$ 281 bilhões em 2018.

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Militares terão proposta separada 

Fábio Pupo

Edna Simão

Fabio Graner 

21/02/2019

 

 

Além das medidas enviadas ontem ao Congresso, o governo pretende encaminhar mais duas propostas aos parlamentares para alterar as regras da Previdência. Uma delas vai tratar especificamente dos militares, que ficaram de fora da primeira rodada devido a "dificuldades" encontradas pela equipe econômica na finalização do texto.

O secretário especial de Previdência e Trabalho, Rogério Marinho, afirmou que as mudanças ligadas às Forças Armadas demandarão modificações em cinco leis e que, devido à complexidade, as alterações ficarão em um projeto separado. "Nosso grupo ficou até a madrugada de hoje [quarta] fazendo os últimos ajustes no processo de reforma, então tivemos dificuldades em nos debruçar", disse ele.

Apesar disso, ele garantiu que o presidente Jair Bolsonaro decidiu incluir os militares no esforço para melhorar a situação da Previdência. Alguma mudanças, inclusive, já estão certas. O secretário adiantou que no texto a ser enviado será aumentado o tempo de contribuição dos militares de 30 para 35 anos e haverá aumento da alíquota previdenciária de 7,5% para 10,5%. As pensões, que hoje não recolhem contribuição, passarão a pagar 10,5%.

Outra proposta a ser encaminhada ao Congresso vai intensificar a cobrança de dívidas previdenciárias. Atualmente há R$ 160 bilhões em recursos recuperáveis. A prioridade deve ser 4 mil devedores que têm débitos acima de R$ 15 milhões e respondem por mais de 60% do estoque total. Com as medidas, o governo espera acelerar o recolhimento por meio das cobranças, que em 2019 estão estimadas entre R$ 5 bilhões e R$ 6 bilhões.

O procurador-Geral Adjunto de Gestão da Dívida Ativa da União, Cristiano Neuenschwander, afirmou que contribuintes com capacidade de pagamento alto têm deixado de pagar por conta da expectativa de criação de novos programas de regularização de dívida - os chamados "Refis", que concedem benefícios aos devedores com o objetivo de eles quitarem logo seus débitos com a União.

Mas mesmo com o discurso contrário aos Refis, a equipe econômica deixou uma brecha para novos programas na PEC enviada ao Congresso. No texto, o governo deixou de proibir novos pacotes e sugeriu apenas que novos Refis tenham parcelamento de até 60 meses.

Outro ponto importante da PEC é que ela prevê a criação de um regime de capitalização, por meio do qual os trabalhadores contribuem para suas contas individuais (diferente do regime atual, de repartição, em que todos contribuem para uma conta geral). O governo aproveitou para incluir no texto, inclusive, a possibilidade de o Tesouro Nacional gerir parte dos recursos das contas individuais dos trabalhadores - o que geraria resultado primário.

De acordo com os técnicos, uma parte do recurso destinado à Previdência poderia ser administrada por uma instituição financeira pública ou privada e outra destinada para uma conta também individualizada, mas administrada pelo Tesouro. Nesse caso, o trabalhador receberia taxas de juros e teria a garantia do Tesouro. De qualquer forma, o detalhamento final precisa do aval do Congresso e terá que ser regulamentado posteriormente.