Correio braziliense, n. 20496, 03/07/2019. Economia, p. 7

 

Acordo com a UE é a porta para o mundo

Augusto Fernandes

03/07/2019

 

 

Conjuntura » Chanceler brasileiro diz que mais duas parcerias do Mercosul com outros mercados devem ser fechadas ainda este ano. Ele afirma que a cada acordo feito, o bloco se torna mais interessante. Para entrar em vigor, pacto precisa ser aprovado por parlamentos

O desfecho dos 20 anos de negociação entre Mercosul e União Europeia para a criação de um acordo de livre-comércio entre as duas partes, na semana passada, animou o governo federal e pode abrir portas para que mais pactos comerciais entre o bloco sul-americano e outros mercados internacionais sejam assinados antes do fim de 2019. De acordo com o ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, o grupo formado por Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai tem condições de estabelecer ao menos mais duas parcerias neste segundo semestre: com a Associação Europeia de Livre Comércio (EFTA, na sigla em inglês), e o Canadá.

Segundo o chanceler, com o Brasil na presidência do Mercosul a partir deste mês, as negociações devem ser estimuladas. “Pretendemos, muito em breve, fechar novos acordos. Cada um que você faz, você se torna um parceiro mais interessante para aquele com quem você não tem acordo”, explicou, em coletiva de imprensa no Palácio do Itamaraty.

Araújo disse ainda que as conversas do Mercosul com Cingapura e Coreia do Sul estão bastante avançadas. A depender do sucesso das tratativas do bloco econômico, parcerias com as duas nações asiáticas também devem ser concluídas até dezembro. Além disso, o ministro afirmou que o grupo tem condições de firmar pactos comerciais com mais países. Tudo vai depender, contudo, de uma interação entre integrantes do Mercosul. Apesar disso, caso as demais nações não estejam interessadas, ele garantiu que o Brasil pode negociar isoladamente.

“Temos que conversar com os sócios do Mercosul e ver em que aspectos poderíamos fazer um acordo do entendimento de todos e em quais seria mais fácil trabalhar individualmente. De repente, podemos colocar o Brasil no centro de um processo que estávamos muito distantes. Vemos com muito entusiasmo esse horizonte que se abre para nós. Seremos um país que abre a economia para melhor se inserir nos fluxos internacionais e que se dedica a atrair mais tecnologia de ponta por meio de novas parcerias. Isso comparte com o processo de reformas internas que farão o Brasil mais competitivo, próspero e coeso e com uma economia sólida e dinâmica”, disse.

Como possíveis aliados à economia brasileira, Araújo citou Arábia Saudita, China, Emirados Árabes Unidos, Estados Unidos, Israel, Japão e Líbano. “Já tem havido sinalizações altamente promissoras de alguns países de apostar no Brasil. Na visita de Bolsonaro aos EUA, por exemplo, o Donald Trump (presidente norte-americano) expressou o desejo de ter uma interação comercial conosco. Com a China, estamos tentando ações pontuais para abrir novos mercados interessantes na parte agrícola para atrair tecnologia de investimentos. Acho que em um período de dois anos, certamente teremos criado uma rede muito densa de acordos comerciais do Brasil com as grandes economias”, destacou.

Aprovação

Para entrar em vigor, o acordo entre Mercosul e UE ainda precisa ser aprovado no Congresso Nacional e em 31 parlamentos: nas casas legislativas de Argentina, Paraguai e Uruguai e dos 27 países-membros da União Europeia (considerando a exclusão do Reino Unido), e pelo Parlamento Europeu. O texto que deve ser encaminhado para análise dos poderes legislativos ainda não ficou pronto, no entanto, algumas nações já apresentam resistência em ratificar documento, como a França. Representantes do governo do país europeu afirmaram que a nação não está pronta para assinar o documento.

“A nova Comissão Europeia e sobretudo o Parlamento Europeu analisarão minuciosamente esse acordo antes de ratificá-lo. É preciso lembrar a todos os países, entre eles o Brasil, de suas obrigações. Quando assinamos o Acordo de Paris colocamos em prática uma política que permite atingir objetivos de redução de emissão de gases de efeito estufa e de proteção da Floresta Amazônica”, disse o ministro francês do Meio Ambiente, François de Rugy.

Araújo disse entender o posicionamento da França, e lembrou que “no momento, nenhum país está pronto para ratificar dentro da questão constitucional”. No entanto, também cobrou que os países da União Europeia cumpram com os seus compromissos de defesa do meio ambiente. “Geralmente, colocam como se fosse um tema europeu apenas, mas é nosso também. A grande maioria dos países europeus tem um uso de agrotóxico por hectare maior que o Brasil. Também queremos que isso seja feito de maneira sustentável”, frisou.

O chanceler garantiu que “nada que está no acordo é uma surpresa para os países-membros”. “Eles já conhecem o que está lá dentro. De qualquer forma, estamos prontos para conversar com a França e qualquer país”, afirmou. Segundo Araújo, ele deve receber o ministro francês das Relações Exteriores, Jean-Yves Le Drian, para uma reunião no Palácio do Itamaraty.

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França faz cobrança

 

 

 

 

 

Thaís Moura

Marina Torres

03/07/2019

 

 

 

O acordo entre o Mercosul e a União Europeia, anunciado na última sexta-feira, só será ratificado “se o Brasil respeitar os seus compromissos”, segundo o ministro francês do Meio Ambiente, François de Rugy. Ontem, ele chamou a atenção para as obrigações ambientais do país, principalmente no que diz respeito à luta contra o desmatamento da Amazônia. Dados divulgados, na segunda-feira, pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), mostram que, em junho, a floresta teve um desmatamento quase 60% maior que no mesmo período do ano passado. Com isso, a região perdeu 762,3km² de mata nativa, o que representa duas vezes a área total de Belo Horizonte. No documento, o país se compromete a zerar o desmatamento ilegal na Amazônia até 2030.

Em entrevista à rádio Europe 1, o ministro francês reforçou a necessidade de o Brasil cumprir o Acordo de Paris, que estabelece medidas para redução de emissão de gases-estufa a partir de 2020, a fim de conter o aquecimento global. O ministro das Relações Exteriores brasileiro, Ernesto Araújo, respondeu às declarações: disse que as falas francesas não representam riscos para a aprovação do acordo com a UE. Ele acredita que os setores franceses interessados na confirmação do acordo pressionarão as autoridades para garantir sua implementação.

“No acordo com a União Europeia, todos os membros reafirmam seus compromissos com diferentes instrumentos ambientais, inclusive o Acordo de Paris. Nós também esperamos que sejam implementados os compromissos deles, países desenvolvidos, de desembolso de recurso, de financiamento de energia renovável”, afirmou Araújo. “Temos total compromisso contra o desmatamento. Nossa política é de preservação ambiental e de utilização sustentável dos nossos recursos naturais, seja na Amazônia, seja nos outros biomas.”

Segundo o consultor internacional Matheus Andrade, a França foi um dos países mais resistentes ao acordo, pois os agricultores de lá “são muito barulhentos”. “Obviamente, a gente não pode descartar a questão do meio ambiente. O desenvolvimento sustentável está no acordo, é um dos 22 capítulos que foi negociado e o Brasil sabe dos compromissos que assumiu.”

Aumento da competitividade

 

O consultor internacional Matheus Andrade considera o acordo fechado entre o Mercosul e a União Europeia (UE) muito ambicioso e acredita que facilitará negócios nas áreas de serviços, energia, intercâmbio e eliminação de roaming. “Noventa por cento de tudo que é comercializado entre os dois blocos vai ter tarifa zero, ou seja, os produtos brasileiros entrarão mais facilmente na UE, com vantagens competitivas e em pé de igualdade com outros mercados”, explicou, durante o CB Poder, programa do Correio Braziliense em parceria com a TV Brasília. Na opinião dele, o acordo vai aumentar a competitividade da indústria interna e externa e, a longo prazo, propiciará uma redução de preços no país. (MT)

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Indústria recua 0,2%

 

 

Rafaela Gonçalves

03/07/2019

 

 

 

A produção industrial brasileira registrou em maio queda de 0,2% em relação ao mês de abril, segundo a pesquisa divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Apesar de ficar bem abaixo do 0,35% previsto pelos analistas, o resultado reforça a leitura de que a economia se manteve fraca no segundo trimestre. Nos primeiros cinco meses do ano, o setor acumula perda de 0,7%, com 18 dos 26 ramos pesquisados apresentando queda.

Apesar das projeções pessimistas devido ao resultado negativo da indústria, ao alto índice de desemprego e à piora na confiança dos empresários, analistas não acreditam em uma recessão técnica, que ocorre quando o PIB cai por dois trimestres seguidos. “Muita gente olhou o que aconteceu no primeiro trimestre e extrapolou as projeções para o próximo. Porém, os primeiros quatro primeiros meses foram bons no ano passado,  depois foram marcados por crises como a greve dos caminhoneiros que fez com que a trajetória da indústria declinasse totalmente”, analisa a pesquisadora.

O economista-chefe da Rio Bravo Investimentos, Evandro Buccini, também não acredita em recessão técnica. “A hipótese de uma contração do PIB neste trimestre está muito perto da estabilidade e as projeções são para que fique perto de zero. Continua muito volátil e difícil de prever, mas neste mês a indústria extrativa cresceu bastante, como compensação do mês anterior com o resto do setor de transformação foi fraco, o posto do mês passado”, diz.

Destaque

A fabricação de veículos teve destaque negativo, com queda de 2,4% em relação a abril, mas subiu 37,1% em relação a maio do ano passado.Couro, artigos de viagem e calçados registraram o maior índice negativo, com -7,1%. O destaque positivo ficou com a indústria extrativa, que após quatro quedas seguidas registrou o maior ganho do mês, com crescimento de 9,2% na produção. Os derivados de petróleo e biocombustíveis também apresentaram alta de 3,2%, que interromperam dois meses consecutivos de queda.

O crescimento do setor extrativo, contudo, não significa que os efeitos de Brumadinho tenham cessado. “Os desdobramentos do desastre continuam e isso é preocupante para a indústria. A gente não sabe quando vai passar e a produção da Vale estabilizar. Tudo isso representou um choque de oferta no setor que não está relacionado ao estado da economia, o problema gerou maior fiscalização nas comunidades produtivas que reduziram em todo Brasil”, considera Luana Miranda, pesquisadora da área de Economia Aplicada do FGV Ibre.