O globo, n.31375, 02/07/2019. Economia, p. 14

 

UE e Mercosul concordam em proibir subsídios 

Eliane Oliveira 

Renata Oliveira 

02/07/2019

 

 

O acordo de livre comércio entre o Mercosul e União Europeia (UE), anunciado na sexta-feira, vai proibir os subsídiosà exportação. Segundo um aversão preliminar divulgada ontem por representantes da UE, confirmada pelo governo brasileiro, ai deiaé evitara concorrência desleal no intercâmbio de mercadorias entre os dois blocos. A medida beneficiará, principalmente, Brasil e Argentina, países competitivos no agronegócio.

O Mercosul vai liberalizar totalmente 91% das suas importações da UE, durante um período de transição de até dez anos. Foi estabelecido um prazo mais longo, de até 15 anos, para produtos mais sensíveis. Já a UE vai liberalizar 92% de suas importações do Mercosul, em um prazo de até dez anos.

Nos 20 ano sem que Mercosul e UE negociaram, o fim dos subsídios domésticos eà exportação sempre enfrentou resistência de alguns países, como França e Irlanda, que garantem a produtores agrícolas preço mínimo, juros baixos e outros benefícios. Os dois blocos concordaram em não permitir subvenção às exportações, prática condenada pela Organização Mundial do Comércio (OMC).

O secretário especial de Comércio Exterior e Assuntos Internacionais do Ministério da Economia, Marcos Troyjo, afirmou ontem que o acordo tem poder de acelerar o ritmo das reformas internas do Brasil. Mas ressaltou que acordos internacionais não são a cura para todos os males do país:

—Acordos externos funcionam como aceleradores, catalisadores e incentivadores de reformas internas. O grande acordo comercial que o Brasil precisa fazer é com ele mesmo. Isso significa harmonizar as condições internas para avançar internacionalmente.

ABERTURA PARA VINHOS

Com tarifa de importação de 35%, os automóveis de passageiros são considerados produtos sensíveis, por isso terão tratamento especial: o imposto só será zerado 15 anos após o acordo entrar em vigor. Essa redução começa no oitavo ano. Nesse período de carência, o Mercosul terá uma quota de 50 mil unidades por ano de carros europeus a serem importados com alíquotas menores.

Na parte industrial, partes e peças para veículos também terão um período de transição. Outros setores sensíveis são o químico e o farmacêutico.

A UE abrirá seu mercado para 82% das importações agrícolas do Mercosul, ficando as compras restantes sujeitas a compromissos de liberalização parcial, incluindo cotas com tarifas de importação reduzidas. São os casos de carnes bovina, de frango e suína, açúcar, etanol, arroz, mele milho.

Queijos, leite em pó e alimentos infantis só serão liberalizados em até dez anos pela UE. Já o Mercosul abrirá seu mercado para os vinhos europeus que, dependendo do tipo, se finos ou espumantes, por exemplo, as tarifas serão zeradas em até 12 anos. Também estão na lista bebidas energéticas, refrigerantes, azeite, frutas frescas, pêssegos em calda, conservas de tomate, malte, batatas congeladas, chocolates e biscoitos.

O Brasil, no entanto, decidiu manter fechados os setores de mineração, defesa, exploração de petróleo e pesca. Em serviços marítimos, embarcações europeias poderão transportar contêineres entre portos de países do Mercosul, por exemplo, de Santos (SP) para Buenos Aires. Mas continuará proibido o serviço entre portos dentro do Brasil, comode Santos para Itajaí( SC ).

Apesar dessas restrições na área de serviços, fontes do governo brasileiro disseram que os europeus poderão participar de licitações públicas em infraestrutura, educação (fornecimento de merenda escolar, por exemplo), transportes e bens de capital.

Outro ponto diz respeito ao tratamento isonômico entre empresas do Mercosul e da UE em compras públicas. No Brasil, serão exceções as licitações voltadas a programas de incentivo à ciência e à tecnologia, a pequenas empresas e à saúde pública. Estados e municípios serão convidados a participar após o acordo entrar em vigor. As compras governamentais realizadas anualmente pela UE somam € 1,3 trilhão. Já o Brasil contratou, em 2017, R$ 78 bilhões em licitações públicas.

No acordo, a UE não dará isonomia a empresas do Mercosul em contratos voltados para o desenvolvimento de firmas locais, incluindo programas sociais. Já em serviços, retiraram audiovisual, educação e saúde.

Na área de propriedade intelectual, o acordo prevê proteção para 355 produtos europeus, como champanhe, conhaque, queijo parmesão e presunto de Parma. Do lado do Mercosul, 220 itens passarão a ser tratados como exclusivamente do bloco, dos quais 38 do Brasil, como a cachaça de Paraty e o queijo da Serra da Canastra.

INCREMENTO DE US$ 1 TRI

O secretário de Comércio Exterior, Lucas Ferraz, prevê um incremento de US$ 1 trilhão na corrente de comércio em 15 anos. Em investimentos, o ganho chegaria a R$453 bilhões.

Os detalhes serão conhecidos nos próximos dias. A divulgação pela UE ontem departe do acordo irritou o governo brasileiro, que apontou imprecisões. Por exemplo, a informação de que os setores de telecomunicações e de entrega expressa postal são fechados e se abririam com o tratado bilateral. Uma fonte disse que as duas áreas permitem o ingresso de capital estrangeiro.