Correio braziliense, n. 20863 , 06/07/2020. Mundo, p.14
Especialistas alertam sobre desigualdade
06/07/2020
A crise causada pela pandemia de covid-19 evidencia as desigualdades já existentes no mundo e nos países desenvolvidos, e reduzi-las será um dos grandes desafios do futuro, alertam economistas, líderes políticos e empresários durante as reuniões econômicas da Aix-en-Seine, realizada no fim de semana em Paris. “As epidemias tendem a derrubar ainda mais o que já está em declínio. Elas são de alguma forma um acelerador e revelador de fraquezas”, disse o economista Pierre Dockes, professor emérito da Universidade de Lyon 2.
Desde o início da pandemia, médicos e epidemiologistas descobriram que o coronavírus afeta mais gravemente pessoas com doenças crônicas (obesidade, diabetes, doenças cardiovasculares), proporcionalmente, mais presentes na população pobre. E, acima de tudo, as pessoas com empregos de pouca qualificação tiveram que continuar trabalhando para manter os setores de alimentos, o comércio eletrônico ou serviços de saúde. “Todas essas pessoas que continuaram trabalhando, apesar dos riscos, são de classe baixa”, disse Mark Stabile, pesquisador da escola de negócios Insead, especialista em desigualdades.
Desaceleração
Nos países desenvolvidos, as políticas de austeridade após a crise de 2008 “reduziram a qualidade dos serviços públicos, no setor da saúde, por exemplo, e o apoio às pessoas necessitadas, sem emprego”, tornando-as mais vulneráveis atualmente, especificou Insead. “Está claro que haverá um aumento das desigualdades (devido à crise), alertou a presidente do Banco Central Europeu, Christine Lagarde.
O egípcio Mohamed el Baradei, vencedor do Nobel da Paz, lembrou “o número de pessoas pobres que morrem simplesmente porque não têm acesso ao sistema de saúde, porque não conseguem manter distanciamento físico, porque os lugares onde moram são muito populosos e precisam voltar ao trabalho para sobreviver”. Para Pierre Dockes, países como Brasil ou Índia podem observar uma desaceleração no avanço dos padrões de vida de suas classes médias em relação a outras nações ocidentais.
Outra desigualdade após a covid-19 emergiu entre gerações, estima a economista italiana Elsa Fornero, ex-ministra do Trabalho em seu país entre 2011 e 2013. “Enquanto as mais velhas pagam o preço mais alto em termos de vidas humanas, as consequências econômicas, medidas de confinamento — por exemplo, com o fechamento de escolas — deixaram crianças, adolescentes fora do sistema educacional, o que pode ter consequências a longo prazo”, afirmou. Estudos realizados após a crise de 2008 mostraram que as gerações que tiveram dificuldades para entrar no mercado de trabalho durante a crise nunca recuperaram o atraso em termos de carreira.