O globo, n. 31817, 16/09/2020. Rio, p. 15

 

O rastro do dinheiro

Lucas Altino

16/09/2020

 

 

Campanha de Witzel recebeu doações de grupo que ganhou contratos na Saúde

 Exposto a partir de primeira quinze nade abril, o esquema de desvios de recursos Saúde culminou com o afastamento de Wilson gode governador por 180 dias. A proximidade do ex juiz coma área queéalv ode investigações, no entanto, remonta a 2018, durante a arrecadação de recursos para sua campanha. Um levantamento feito pelo GLOBO junto aos 43 doadores registrados apontam nessa direção. Dos R$ 785 mil a eles computados, R$ 105 mil saíram de sete médicos de Volta Redonda, incluindo cinco funcionários do Hospital Jardim A máli a(Hinja ), quepertence a Gothardo Lopes Net to, ex-prefeito da cidade, preso no fim de agosto. Segundo o Ministério Público Federal (MPF), o Hinja depositou R$ 280 mil nas contas do escritório de advocacia da primeiradama, Helena Witzel, entre agosto de 2019 e maio de 2020. Esse, no entanto, não é o único elo. Um montante de R$ 105 mil partiu de dois doadores ligados à Unir, organização social (OS) que teria como sócio oculto o empresário Mario Peixoto, presos oba acusação dese rum dos vértices do esquema de corrupção na administração estadual.

A campanha de Witzel, candidato do PSC que partiu de 2% das intenções de voto, recebeu R$ 2,8 milhões, sendo a maior parte, R$ 1,8 milhão, oriunda da cota do partido no Fundo Eleitoral. Do R$ 1 milhão proveniente de doações, R$ 215 mil saíram do bolso do então juiz. Os R$ 785 mil restantes estão distribuídos entre os 43 doadores, sendo três de “origem não identificada” e uma cota coletiva. Entre os 39 identificados, há indícios de que pelo menos dez têm ligações com os nomes de Gothardo ou Peixoto.

— Fui assaltado antes das eleições, botaram uma arma na minha cabeça e levaram meu carro. Nunca conheci o governador, só acreditei no projeto de segurança dele — disse Kopke, que também afirma nunca ter visto Peixoto. — Para mim, ele é igual ao caviar da música do Zeca Pagodinho: nunca vi nem comi, só ouço falar.

A Unir é objeto de várias convocações da Comissão Especial de Acompanhamento das Ações de Combate ao Covid, da Alerj. Isso porque ela foi desqualificada em outubro de 2019, por falhas nas gestões de UPAs, mas requalificada em março deste ano, por decisão de Witzel, mesmo contrariando dois pareceres jurídicos, da Secretaria de Saúde e da Procuradoria Geral do Estado, conforme revelou O GLOBO. KopkeeWan der lerf oram chamados par aprestar depoimentos a deputados. O primeiro faltou. O segundo negou ter relações diretas coma OS, mas admitiu ser amigo de Witzel.

Citadona delação de Edmar porque teria indicado um nome que facilitaria negócios entre a Secretaria de Saúde e empresas ligadas a Peixoto, Neves negou as acusações e disse que fez a doação para a campanha de Witzel por ser amigo dele desde 2015, quando se conheceram num curso de pós-graduação:

— Achei que ele reunia as condições para fazer um governo sério e independente.

Do núcleo de Volta Redonda, responsável por 13% das doações, sete nomes ganham destaque pela proximidade com Gothardo. Ozorio Carvalho Chaves (R$ 30 mil) é, segundo o Cadastro Nacional de Estabelecimentos de Saúde (CNES), diretor do Hinja; Norton Pinheiro Filho (R$ 10 mil) consta como médico do hospital; Leonardo Mollica (R$ 10 mil), também médico em Volta Redonda, seria amigo próximo do ex-prefeito; Giselle Bandeira (R$ 10 mil) ocupou a Secretaria de Saúde na gestão de Gothardo entre 2008 e 2009. Outras doações menores, no valor de R$ 5 mil, cada, foram feitas por Miltom Netto, identificado na denúncia do MPF como irmão do exprefeito, e Monike Valerie, médica do Hinja. Houve, ainda, R$ 15 mil de Simone Barreiros, que possui uma clínica em Volta Redonda. O GLOBO tentou contato com todos eles e com o Hinja, mas não obteve retorno.

Para o advogado Acacio Miranda, professor de Direito Eleitoral da PUC-Campinas, não há ilegalidade no fato de alguém efetuar uma doação e ter ligações com o governo. Ele, entretanto, destaca que as verbas eleitorais são parte importante na investigação de possíveis fraudes.

— A doação eleitoral é um indício par amostrar eventuais trocas entre o doador e o agente público. No caso de Volta Redonda, por exemplo, acende-se uma luz vermelha quando está provada a ligação entre os doadores e o réu por improbidade. É preciso apurar se houve ilicitude ou lavagem de dinheiro na utilização dessas pessoas.

De acordo com o MPF e a Polícia Federal, a relação ilícita entre Witzel e Gothardo se materializou por meio de um pagamento de R$ 280 mil feito pelo Hinja, entre agosto de 2019 e maio deste ano, para o escritório de Helena Witzel. As investigações encontraram, inclusive, e-mails do governador para a mulher intermediando a contratação, sem que tenha sido comprovada atuação jurídica efetiva do escritório em ações do hospital.

A denúncia do MPF indica que a “retribuição” para o grupo de Gothardo ocorreu através de duas ações principais. A primeira foi uma parceria de assistência oncológica no valor de R$ 5,3 milhões firmada em janeiro, com repasses até o fim deste ano, entre o governo doestado e aG L N, que tem como sócios três parentes do ex prefeito. A segunda seria a contratação da OS Apmim, que teria Gothardo como sócio oculto, para uma expansão de leitos no Hospital Regional Estadual Zilda Arns, orçada em R$ 58 milhões.

Procurada, a defesa de Peixoto afirmou que o empresário desconhece as doações e que não possui qualquer relação coma Unir. Já os advogados de Gothard o não retornaram as ligações do GLOBO. O governo do estado afirmou que “todas as doações para a campanha deWilson Witzel foram feitas dentro doque prevê a legislação e sua prestação de contas foi aprovada pela Justiça Eleitoral”.

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Há três anos, um encontro que teria definido uma eleição

Pedro Zuazo

16/09/2020

 

 

Delator contou a procuradores como conheceu o juiz que, segundo ele, viria a ser o candidato de uma organização criminosa

 O governador afastado Wilson Witzel teria sido cooptado, antes das eleições de 2018, para se tornar “o novo rosto” de uma organização criminosa acusada de aparelhar o estado para desviar cerca de R$ 50 milhões em contratos, segundo o Ministério Público Federal (MPF). A história de como a candidatura do então juiz federal foi supostamente orquestrada pela quadrilha é contada num depoimento prestado ao Ministério Público Federal (MPF) pelo empresário Edson Torres, apontado como operador financeiro do grupo.

Segundo Torres, o grupo teria se infiltrado na política fluminense no fim dos anos 1990. A quadrilha também teria participado da campanha de Sérgio Cabral, mas foi supostamente traída pelo ex-governador, que, de acordo com o delator, não cumpriu acordos. Após um período de afastamento do Palácio Guanabara, a organização, diz o MPF, usou seu poder econômico para fazer de Witzel o novo governador do Estado do Rio.

Em seu depoimento, Torres contou que, anos após perder negócios com o estado, conseguiu contratos com o o Hospital Universitário Pedro Ernesto. Foi nesse período que teria conhecido o futuro secretário de Saúde de Witzel, Edmar Santos. Ele era o diretor da unidade e recebia 10% do valor pago para a empresa Magna e 15% do total repassado à Verde, prestadoras de serviços que pertenciam a Torres. O próprio Edmar confirmou isso, em delação premiada.

Com o avanço da Operação Lava Jato no Rio e a desarticulação da quadrilha chefiada por Cabral, velhos atores de esquemas de corrupção se mobilizaram para voltar ao poder. Para essa empreitada, teriam escolhido Witzel, no primeiro semestre de 2017.

REGISTRO EM CELULAR

Torres disse a procuradores que foi convidado pelo Pastor Everaldo, presidente nacional do PSC, a participar de uma reunião com Witzel na sede do partido, no Centro. Um registro extraído do celular do então juiz, anexado à denúncia do MPF, mostra que o encontro ocorreu em 10 de abril de 2017. Após a conversa, Torres e Everaldo teriam percebido a necessidade de “dar um conforto e segurança financeira” para Witzel, caso ele abrisse mão da magistratura e perdesse as eleições.

Torres acrescentou que, em conversa com seu grupo, ficou decidido que Witzel receberia R$ 1 milhão para se manter por dois anos, se saísse derrotado das urnas. O montante efetivamente pago, segundo ele, foi R$ 980 mil, em espécie. A entrega teria sido feita em parcelas, e Torres afirmou que, para a quitação da última, teve um encontro com Witzel e Everaldo numa sala comercial do Centro. Ele disse que o futuro governador levou uma bolsa, na qual teria colocado maços de R$ 50 mil.

VIAGEM SUSPEITA

Witzel teria continuado a receber propina do grupo após eleito. Além de dar dinheiro a autoridades, a organização criminosa usava uma agência de turismo para fazer agrados a políticos. Witzel e a família embarcaram para a Disney no último réveillon, viagem que é investigada pelo MPF.

Por meio de notas, Witzel e Everaldo negaram as acusações de Torres. Edmar não quis se manifestar.