Título: Violência contra a mulher exige ação coletiva
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Fonte: Correio Braziliense, 21/03/2013, Opinião, p. 18

Estar entre os 10 países campeões da violência contra as mulheres causa vergonha e indignação. Em pesquisa de 2012, o Centro Brasileiro de Estudos Latino-Americanos (Cebela) analisou dados de 84 Estados. Ficamos em 7º lugar. A média nacional é de 4,6 mortes para cada 100 mil cidadãs — a maior parte atacada por marido, companheiro ou pessoa próxima, quase sempre da família.

A tragédia não constitui fenômeno novo, mas a gravidade é crescente. Nos últimos 30 anos, nada menos de 92 mil adultas, adolescentes e crianças perderam a vida vítimas de homicídios. Na última década, a cifra chegou a 43,7 mil. Estudo divulgado esta semana pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apresenta informação relevante — a agressão deixou de ser vista com a naturalidade de antes.

De 2006 a 2011, 677 mil processos contra a bárbara prática tramitaram no país. Entre as 27 unidades da Federação, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul, Minas Gerais e o Distrito Federal lideram em número de ações. A busca do Judiciário como forma de frear a covarde brutalidade tem várias razões. Entre elas, sobressai a Lei Maria da Penha e a criação de órgãos voltados exclusivamente para atendimento de público especial, que tem demandas especiais.

A Lei Maria da Penha, de 2006, deu visibilidade e outro foco ao problema. Antes, escondia-se a agressão e protegia-se o agressor. A vítima, além de pancadas e humilhações, carregava o peso da responsabilidade. Ela era culpada pela barbárie. Se falasse, corria o risco de abandono, privação e perda dos filhos. O preço, alto demais, não compensava atos de rebeldia.

Há sete anos, a mudança na estrutura judiciária e na abordagem da violência deu a vez a novo enredo no drama. A delegacia da mulher acolhe a queixa com respeito e dá-lhe prosseguimento. Natural, cidadã e lógica, a providência era fato excepcional nas instituições mistas, onde não raro a denúncia da ocorrência recebia como resposta piadas, maledicências e o arquivamento.

O resultado não poderia ser outro — o desestímulo, que incentiva novos ataques, que, impunes, aumentam em progressão assustadora. A perspectiva de punição, porém, ainda não se traduziu em redução significativa da violência. É possível que tenha crescido o número de denúncias em decorrência da publicidade da Lei Maria da Penha. De qualquer forma, muitas vidas se perdem.

A questão exige tratamento holístico. Além do cerco jurídico, mudanças culturais se impõem. Escola, igreja, clube e o lar onde se criam os agressores precisam educar os meninos com valores fincados na paz. Especial atenção se exige das mulheres. Elas formam o maior contingente de professores. Sobretudo, elas são as mães que, inconscientemente, reproduzem o machismo.