Valor Econômico, n. 5203, v.21, 09/03/2021. Política, p.A14

 

 

 

Bolsonaro critica Fachin e ministros se dividem sobre Lula

 

Auxiliares mais próximos do presidente veem riscos e vantagens em concorrer com o petista

Por Fabio Murakawa e Matheus Schuch — De Brasília

 

 

O presidente Jair Bolsonaro disse ontem que a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que anulou as condenações contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na Lava-Jato era “previsível” por conta de ligações do ministro Edson Fachin com o PT. No entorno de Bolsonaro, enquanto isso, a avaliação é que a devolução dos direitos políticos a Lula traz riscos para as pretensões do presidente de se reeleger em 2022.

 

Há ainda quem afirme que Bolsonaro está no momento mais preocupado com a escalada de mortes por causa da covid-19, que pode ter um impacto político maior do que a decisão do STF.

 

“Qualquer decisão dos 11 ministros [do STF] é possível você prever o que eles pensam e o que botam no papel. O ministro Fachin tinha, sempre teve, uma forte ligação com o PT. Então, não nos estranha uma decisão neste sentido”, disse Bolsonaro a jornalistas à porta do Palácio da Alvorada.

 

O presidente criticou as “bandalheiras” do governo petista e opinou que ela terá que ser revista em colegiado.

 

“Obviamente, é uma decisão monocrática, mas tem que passar pela turma, não sei, ou pelo plenário para que tenha a devida eficácia”, afirmou. “Agora, todo mundo foi surpreendido com isso daí. Afinal de contas, as bandalheiras que este governo fez estão claras perante toda a sociedade”, afirmou o presidente, que antes havia dito que a decisão era “previsível”.

 

Na visão de parte de seus auxiliares mais próximos, Bolsonaro pode se beneficiar da polarização com Lula, que tem alta rejeição entre o eleitorado que apertou 17 na última eleição presidencial.

 

“Bolsonaro sempre achou que o adversário dele vinha do PT. Eu acho uma boa decisão”, disse um ministro ao Valor sob anonimato.

 

Um outro grupo, no entanto, afirma que Lula representa riscos para o presidente, por conta de sua capacidade de articulação e também pelo grande potencial de votos que carrega no Nordeste.

 

“Lula limpo pode organizar a oposição ao Bolsonaro. Aí a brincadeira começa a ficar séria”, pondera uma fonte palaciana.

 

Um ministro próximo do presidente afirma que a principal preocupação de Bolsonaro no momento é com a explosão de mortes na pandemia.

 

“Se Lula está solto, preso ou pode concorrer à Presidência, isso não altera o número de mortes amanhã”, disse. “É com isso que o presidente está preocupado.”

 

No Palácio do Planalto, há ainda quem duvide da fidelidade do centrão, que o governo cooptou após se afastar dos bolsonaristas mais radicais. Lula ressurge como presidenciável justamente no momento em que o presidente começa a ser cobrado por conta da falta de vacinas e do agravamento da pandemia no país.

 

Uma alta autoridade do governo, porém, não acredita em uma debandada dos partidos fisiológicos que hoje compõem a base de sustentação no Congresso. “O Centrão só ficou com quem estava no poder. [Foi assim com] Lula, Dilma, Temer. E agora Bolsonaro. Não vão para a oposição”, previu.

 

Já ensaiando uma polarização, Bolsonaro ontem partiu para o ataque e disse que a administração do PT foi “catastrófica”.

 

“Foi uma administração catastrófica do PT no governo. Eu acredito que a população sequer quer ter um candidato como esse em 2022 e muito menos pensar em possível eleição dele”, afirmou o presidente.