Título: O papel do professor no combate à violência doméstica
Autor: Lorenna Rodrigues
Fonte: Jornal do Brasil, 07/02/2005, Brasília, p. D3

Pesquisa de socióloga da Universidade de Brasília discute o papel da escola na luta contra a violência contra as crianças

Há cerca de quatro anos, a professora Cláudia Kane teve que fazer uma escolha muito delicada. Então vice-diretora de uma escola pública em Taguatinga, Cláudia se deparou com uma criança que apresentava sinais de agressão. - Uma menina de 9 anos começou a apresentar hematomas e um dia chegou com um corte grave na cabeça. Conversamos com ela que acabou contando que a agressora era sua própria mãe - conta.

Apesar de prever as dificuldades que enfrentaria, Cláudia decidiu não se omitir. Contactou imediatamente o conselho tutelar do bairro, que tomou as providências legais.

- Sofri muitas ameaças da mãe da criança e de seu companheiro, mas não deixei que isso me calasse - diz.

A mãe acabou perdendo a guarda da menina, que hoje mora com a avó. Casos como o da professora Cláudia recheiam a pesquisa De casa à escola: caminho fecundo para o enfrentamento da violência contra a criança, da historiadora e mestre em Sociologia Adriana Costa de Miranda da Universidade de Brasília, que discute o papel da escola na identificação e combate à violência doméstica.

Adriana conta que, ao contrário do que fez a professora Cláudia, muitos educadores preferem se omitir.

- O principal motivo é o medo do agressor. Muitos também se calam porque são coniventes, acreditam que a violência é um modo de educar a criança - explica.

Para a pesquisadora, o mais importante é orientar os professores, para que eles possam identificar os sinais da agressão, muitas vezes sutis e agir contra isso.

Adriana conta que não existe um padrão de comportamento apresentado por crianças agredidas, por isso o professor precisa ficar atento.

- A criança que sofre violência pode tanto ficar depressiva ou muito agressiva. Entretanto, mudanças repentinas de comportamento muitas vezes são sinais de que há algo errado - esclarece.

Ao identificar uma criança agredida, o primeiro passo a ser tomado pelo professor deve ser conversar com os pais. Em um dos casos ouvidos por Adriana, por exemplo, uma criança de 9 anos de uma escola no Paranoá apresentou marcas de agressão no rosto. Chamada à escola, a mãe confessou a autoria da agressão e pediu ajuda.

- A mãe se sentiu acolhida pela escola, que a ajudou a encontrar outros meios de educar o filho sem o uso da violência - conta

Muitas vezes, porém, o diálogo não é alternativa.

- Nesses casos, os professores têm o dever de denunciar o agressor, para ajudar a acabar com a prática da agressão contra a criança.

Adriana lembra que o professor que se omitir pode ser penalizado.

- O artigo 245 do Estatuto da Criança e do Adolescente prevê a responsabilização de profissionais de educação e saúde que não denunciarem casos de violência infantil - afirma.

A Secretaria de Educação informou que vários cursos são oferecidos para capacitar os professores no enfrentamento da violência doméstica, como o curso Prevenção à violência, , oferecido anualmente na Escola de Aperfeiçoamento dos Profissionais da Educação (EAPE). Além disso, as Diretorias Regionais de Ensino distribuirão o Guia escolar - Métodos para identificação de sinais de abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, elaborado pelo Ministério da Educação.