O Globo, n. 32043, 30/04/2021, País, p. 5

 

Autora de requerimentos é ligada a Flávio
Daniel Gullino
Paulo Cappelli
Jussara Soares
30/04/2021

 

 

 

Servidora do Palácio do Planalto que aparece como autora de requerimentos apresentados por senadores governistas na CPI da Covid, Thais Amaral Moura é considerada dentro do governo federal como uma pessoa ligada ao senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ). Como o GLOBO mostrou na edição de ontem, o nome de Thais figura nos registros eletrônicos de requerimentos apresentados por Ciro Nogueira (PP-PI) e Jorginho Mello (PL-SC) defendendo a convocação de médicos que defendem tratamento precoce. Flávio admite conhecê-la, mas nega ter proximidade.

Moura está na Secretaria de Governo desde janeiro — chegou quando Luiz Eduardo Ramos ainda era o ministro desta pasta —, e ocupa o cargo de assessora especial na Secretaria Especial de Assuntos Parlamentares. Antes, passou também pelo Ministério do Turismo e pela Embratur, após ter feito campanha para Jair Bolsonaro em 2018.

Flávio afirmou ao GLOBO conhecer a servidora, defendeu sua competência, a descreveu como apoiadora fiel do presidente, mas negou ter proximidade:

— Conheço a servidora, assim como centenas de servidores, mas não tenho nenhuma relação pessoal nem de proximidade. Sei que é muito competente. Ela fez campanha para o presidente, é bolsonarista convicta e tem mais é que estar no governo para ajudar —disse.

Formada em Direito pela UFMG, Moura atuou em escritórios de advocacia e não tinha experiência na administração pública antes da gestão Bolsonaro. Ela entrou no governo em fevereiro de 2019, como chefe da Assessoria de Projetos e Parcerias da Embratur. Em junho do mesmo ano, foi deslocada para o Ministério do Turismo, comandado na época por Marcelo Álvaro Antônio, de quem virou assessora especial em julho de 2020.

A proximidade dela com a família Bolsonaro era conhecida dentro do ministério. Em janeiro, segundo interlocutores, Moura recebeu o convite do então chefe da Secretaria de Governo, ministro Luiz Eduardo Ramos, com o aval do filho mais velho do presidente. No Planalto, a assessora, apesar de pouco tempo no cargo, é considerada habilidosa e estabeleceu uma boa rede de contatos no governo.

Informações registradas nos arquivos do Senado apontam que o nome de Moura aparece em sete arquivos protocolados por Ciro Nogueira e Jorginho Mello.

Integrantes do governo também veem a digital de Flávio Bolsonaro na ação que a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP) ingressou na Justiça para tentar retirar Renan Calheiros (MDB-AL) da relatoria da CPI da Covid. Um juiz de primeira instância chegou a aceitar o pedido, mas a decisão foi posteriormente derrubada pelo TRF-1.

Flávio nega que tenha instruído Zambelli a ingressar na Justiça para barrar Renan.

— Estão fazendo essa insinuação porque, em entrevista, eu disse que acreditava que essa ação poderia ser exitosa. A iniciativa foi 100% da deputada.

“É ALGO NUNCA VISTO”

Parlamentares da CPI viram na revelação que os requerimentos saíram do Palácio do Planalto uma confirmação da tentativa de interferência do governo na CPI.

— É algo nunca visto na história das CPIs. É uma interferência indevida. Agora nós podemos assegurar que não admitiremos que essa comissão sofra interferência externa — afirmou Randolfe Rodrigues (Rede-AP).

O tema foi também motivo de bate-boca durante a reunião da comissão. Renan questionou ao presidente Omar Aziz (PSD-AM) se seriam colocados em votação os documentos que “vieram diretamente do Palácio do Planalto”.

Os governistas defenderam que todos fossem votados. Ciro Nogueira não negou a origem dos documentos e disse que a CPI não pode se negar a avaliar o que for “assinado por um senador”. Renan disse que não daria seu voto para aprovar esses pedidos. Os requerimentos produzidos no Planalto acabaram fora da lista dos aprovados ontem.