Correio Braziliense, n. 20724, 18/02/2020. Mundo, p. 12

Apoio de Obama não surte êxito

Rodrigo Craveiro



A mensagem, publicada no Twitter pelo ex-presidente democrata Barack Obama, provavelmente teve viés eleitoral. “Exatamente 11 anos atrás, perto do fundo da pior recessão em gerações, eu assinei a Lei de Recuperação, pavimentando o caminho para mais de uma década de crescimento econômico e a maior faixa de criação de empregos na história dos Estados Unidos”, escreveu. Prêmio Nobel da Paz e primeiro líder afro-americano do país, Obama não conseguiu capitalizar o seu prestígio político em candidatos que fizeram parte de seu governo. Nos caucus de Nevada e nas primárias de New Hampshire, o ex-vice Joe Biden; a senadora Elizabeth Warren; o ex-governador de Massachusetts Deval Patrick e o ex-secretário de Habitação e Desenvolvimento Urbano Julián Castro — todos aliados de Barack Obama — fracassaram na prévia da corrida à Casa Branca. Patrick e Castro abandonaram a disputa após o fiasco nos dois primeiros compromissos.

Uma das apostas do Partido Democrata para conter o ímpeto à reeleição de Donald Trump, Biden se foca no caucus (assembleia de eleitores) de Nevada, no próximo sábado, para tentar evitar um desastre político. A coordenação de campanha espera que ele consiga ao menos uma segunda colocação, antes de uma aguardada vitória nas primárias da Carolina do Sul, em 29 de fevereiro. Naquele estado, Biden pretende fazer valer a influência de Obama entre os afro-americanos, que formam grande parte da população, para recuperar terreno na corrida à Casa Branca.

Por sua vez, a campanha de Elizabeth Warren veiculou um clipe de 30 segundos, em Nevada, destacando as façanhas da senadora e de Obama na economia. “Ela se tornou, talvez, a principal voz em nosso país em nome dos consumidores. Elizabeth compreende que eu fortemente acredito que uma economia forte e crescente começa com uma classe média forte e próspera”, diz o ex-presidente, na peça publicitária. No entanto, Obama evita fazer qualquer referência a Warren e a Biden em seus perfis nas redes sociais.

Tobe Berkovitz, professor de publicidade da Faculdade de Comunicação da Universidade de Boston, explicou ao Correio que, enquanto presidente, Obama não tinha o chamado “efeito coattails” — o poder de influenciar as pessoas a votarem em candidatos aos quais apoiava. “O Senado e o Congresso têm sido frequentemente comandados por republicanos, pois Obama foi incapaz de eleger democratas apenas com o seu endosso”, disse. “Não é de surpreender que, ao tentarem se apegar a Obama, candidatos não se saiam bem. Vários deles buscaram se conectar a Obama por meio de comerciais de TV e de menções ao ex-presidente durante debates e comícios.

Por sua vez, Dick Simpson, professor de ciência política da Universidade de Illinois, em Chicago, admite que não basta uma conexão com Obama para que isso se reflita em votos do eleitorado democrata. “Ainda que os últimos anúncios de Michael Bloomberg tenham destacado o trabalho feito pelo ex-prefeito de Nova York em cooperação com Obama”, afirmou à reportagem. “É um bom cartão de visitas, mas o candidato deve se posicionar por conta própria e sobre seus própros temas.”

Pelosi

Com ou sem a figura de Obama como suporte político, os democratas enfrentam um racha interno. A presidente da Câmara dos Representantes, Nancy Pelosi, advertiu que o partido “deve ser unificado” para ser capaz de derrotar Trump, em 3 de novembro. Em entrevista exclusiva à rede de TV CNN, ela reforçou que qualquer um dos pré-candidatos seria um presidente melhor do que o magnata republicano. “Não posso nem imaginar uma situação em que ele (Trump) seria reeleito. Temos de ter nossa própria visão para o futuro. Mas todo mundo sabe que devemos ser unificados para garantir que ele não tenha um segundo mandato”, declarou Pelosi.

O ex-prefeito de South Bend (Indiana) Pete Buttigieg e o senador Bernie Sanders lideram, por enquanto, a corrida à indicação democrata. Buttigieg conquistou 22 delegados, um a mais que Sanders. Warren conseguiu fazer oito delegados, seguida pela senadora Amy Klobuchar (7) e por Joe Biden (6). Para ter direito a concorrer à Presidência, o pré-candidato precisa reunir em torno de si mais de 1.990 delegados. Segundo o site The Hill, muitos democratas de centro-esquerda acreditam que Sanders é o favorito, pelo fato de o partido contar com muitos candidatos na faixa mais central, dividindo o restante dos votos. Uma pesquisa recente encomendada pelo Las Vegas Review-Journal mostra que o senador lidera a preferência do eleitorado para o caucus de sábado, em Nevada. Contra as expectativas da campanha, Biden aparece apenas em quarto lugar nas sondagens, e pesquisas nacionais atestam uma queda no apoio dos afro-americanos.

Novo vídeo de campanha

No início da noite de ontem, o presidente Donald Trump publicou, em seu perfil no Twitter, um vídeo para a campanha eleitoral. A peça publicitária, de 30 segundos, começa com a mensagem de que “A América está ótima, melhor do que nunca”. Crianças correm e apontam em direção a uma imensa bandeira dos EUA. A seguir, cenas de Trump batendo continência para um soldado, e uma corrida de Daytona. “Sob a liderança do presidente Trump, estamos correndo rumo a novos recordes. Milhões de novos trabalhos, salários em alta, baixo desemprego histórico, fronteira segura, país protegido e respeito aos veteranos”, afirma o locutor. O vídeo se encerra com o aviso “O melhor está por vir” e a chancela do presidente: “Eu sou Donald J. Trump e aprovo essa mensagem”.

Para Donald Trump, tamanho é documento...

Ao desdenhar os adversários políticos por sua estatura, Donald Trump utiliza a própria altura como arma. O republicano adota uma máxima da política americana: os candidatos mais altos tendem a ganham a Casa Branca. Os últimos inquilinos medem, todos, pelos menos 1,80m: Barack Obama (C); George W. Bush (E); seu pai, George H. Bush (na cadeira de rodas); Bill Clinton (D); e Ronald Reagan. No alto de seu 1,90m, Trump não perde tempo e centra ataque no também magnata Michael Bloomberg (de 1,70m), desde que o democrata começou a avançar nas pesquisas. Em tuítes e entrevistas recentes, Trump apelidou Bloomberg de “Mini Mike”, chegou a lhe dar até 10cm a menos e afirmou que o ex-prefeito de Nova York pediu para ficar em cima de uma caixa, durante os debates democratas. O presidente já ironizou a estatura de vários congressistas americanos, como Adam Schiff, Marco Rubio e Bob Corker. Trump parece ser muito consciente de que nos Estados Unidos a estatura (física) importa e está determinado a tirar proveito disso.

Eu acho...

“A batalha pela nomeação democrata é baseada na ideologia e nas personalidades dos candidatos. Esta é uma longa tradição, que remonta à campanha de 1972. Ativistas muito liberais contra ativistas liberais mais moderados. Isso não é uma reflexão sobre Barack Obama, mas uma batalha pelo coração e pela alma do partido. De qualquer forma, Obama ainda é reverenciado por muitos cidadãos. Eles têm nostalgia do tempo em que ele foi presidente. Sua popularidade é alta, mas isso não se refletiu em sua influência sobre a política em geral.”

Tobe Berkovitz, professor de publicidade da Faculdade de Comunicação da Universidade de Boston

“Barack Obama e Michelle Obama ainda gozam de enorme reserva de apoio pessoal nos Estados Unidos. Faz uma grande diferença quem os democratas escolham como candidato. Existe um racha entre os mais liberais ou radicais e os mais moderados. No entanto, creio que o Partido Democrata se unificará em torno de qualquer um dos favoritos à indicação.”

Dick Simpson, professor de ciência política da Universidade de Illinois, em Chicago, e ex-vereador