O Globo, n.31.629, 12/03/2020. Mundo. p.35

EUA dizem que acordos com Brasil podem conter a China
André Duchiade


 

O chefe do Comando Sul dos Estados Unidos, o almirante de esquadra Craig Faller, disse ontem que acordos de defesa assinados com o Brasil no último fim de semana e no ano passado ajudarão os EUA a responderem a ambições da China na América do Sul. No mesmo depoimento, ele afirmou que os EUA aumentarão sua presença militar no hemisfério neste ano.

Em depoimento ao Congresso do seu país, Faller, que é responsável por operações militares americanas nas Américas Centra ledo Sule no Caribe, disseque o Brasil oferece “boas oportunidades” para os EUA se contra por em à presença chinesa na região, incluindo no âmbito espacial. Ele mencionou as instalações espaciais na Patagônia argentina utilizadas pela China, alegadamente com propósitos civis.

Faller, que recebeu o presidente Jair Bolsonaro na sede do Comando Sul, na Flórida, no último domingo, afirmou que Pequim vê um enorme valor na localização estratégica da América do Sul para atividades espaciais ,“que lhe permitiupousar no lado escuro da Lua ”, e tem“ativamente buscado aumentar seu acesso à infraestrutura espacial” na região. O almirante disseque, para não perder influência, os EUA têm se aproximado de países como o Brasil, classificado como um “bom parceiro”.

— Felizmente, temos avançado com outros países, com bons parceiros como o Brasil, para aumentar o nosso acesso e a cooperação espacial. Eu acho que há oportunidades reais em alguns acordos que assinamos com o Brasil ao longo do ano passado, incluindo neste último domingo, que foi assinado bem rápido para esse tipo de acordo — afirmou no Congresso.

O depoimento de Faller expõe par tedos interesses dos Estados Unidos ao assinarem acordos na área militar com o Brasil. Washington encontra se em uma disputa comercial, tecnológica e estratégica com Pequim, que tem expandido, principalmente por meio de investimentos e comércio, mas também de outros incentivos, sua influência na América Latina.

MAIS PRESENÇA

O espaço foi designado como um dos seis ramos das Forças Armadas dos EUA em dezembro de 2019. As autoridades americanas suspeitam que a China use as instalações na Argentina com propósitos militares, como monitorar satélites militares americanos. Pequim nega, e afirma que o uso da base é civil.

No fim de semana, foi assinado um acordo entre Brasília e Washington para o desenvolvimento de projetos conjuntos na área de defesa, o que tem o potencial de ampliara participação da indústria militar brasileira privada e pública no mercado americano. O documento se seguiu à designação do Brasil como aliado preferencial extra-Otan dos EUA e ao acordo para a proteção da tecnologia americana que permitirá aos Estados Unidos usarem a base de lançamento de Alcântara, no Maranhão, firmado em março de 2019.

No sábado, funcionários americanos disseram aos jornalistas que cobriram a visita de Bolsonaro à Flórida que a participação da empresa chinesa Huawei na implantação da rede de tecnologia 5G no Brasil pode ser um impedimento para a cooperação entre os dois países nas áreas de defesa e de inteligência.

Os americanos alegam que os equipamentos chineses poderiam ser usados para espionagem, o que a Huawei nega. Atualmente, a tecnologia 5G oferecida pela companhia chinesa é considerada por analistas a mais competitiva e com custo melhor do que as de empresas americanas.

Faller disse também que os EUA “ainda têm a vantagem competitiva [na região], mas ela está se erodindo”, em função dos investimentos chineses. Segundo ele, isso torna necessário que os EUA reforcem vínculos com parceiros, ainda que sem aumentar seus investimentos.

— A China começou a dar equipamentos, barcos, caminhões — afirmou.

— Nós não precisamos dar mais do que a China. Nós só precisamos dar o suficiente, estar presentes, para continuar a termos peso e influência.

No mesmo depoimento, em resposta a uma pergunta sobre a Venezuela, Faller disse que os EUA aumentarão sua presença militar na América do Sul em 2020:

— Nossos parceiros estão dispostos a contribuir, especialmente com encorajamento, investimentos e presença americanos. Em reconhecimento às ameaças complexas, haverá um aumento da presença militar americana no hemisfério mais tarde neste ano. Isso inclui uma presença maior de navios, de aviões e de forças de segurança, para tranquilizar nossos parceiros e mostrar a prontidão e interoperabilidade americanas.