O Globo, n. 31440, 05/09/2019. País, p. 7

Grupo da Lava-jato na PGR pede demissão em protesto contra Dodge
Aguirre Talento


O grupo de trabalho da Lava-Jato na Procuradoria-Geral da República (PGR) formalizou na noite de ontem um pedido de demissão coletiva em protesto contra a procuradora-geral, Raquel Dodge. O movimento ocorreu após Dodge solicitar o arquivamento preliminar de trechos da delação premiada do ex-presidente da OAS Léo Pinheiro que citam o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEMRJ), e um irmão do presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Dias Toffoli.

Os seis procuradores que compõem o grupo de trabalho da Lava-Jato na PGR — Raquel Branquinho (coordenadora), Maria Clara Noleto, Luana Vargas, Hebert Mesquita, Victor Riccely e Alessandro Oliveira — avisaram sobre a demissão por meio de mensagem enviada a grupos de trabalho das forças-tarefa da operação em Curitiba e no Rio.

No texto, os procuradores citam “grave incompatibilidade” com uma manifestação enviada por Dodge ao STF na noite de anteontem, sem explicar detalhes do motivo. De acordo com fontes que acompanham o caso, a insatisfação se deve à decisão de Dodge sobre a delação premiada de Léo Pinheiro.

A procuradora-geral enviou a delação do ex-presidente da OAS na terça-feira ao ministro do STF Edson Fachin pedindo para homologar o acordo. A insatisfação, porém, é motivada pelo fato de que Dodge pediu também para que sejam arquivados preliminarmente trechos da delação que envolvem Maia e o ex-prefeito de Marília (SP) José Ticiano Dias Toffoli, irmão do atual presidente do STF. Os procuradores do grupo de trabalho da PGR consideram que há elementos para abrir as investigações, mas Dodge apontou que as provas são insuficientes e pediu o arquivamento antes mesmo de a delação ser homologada.

Reação

A procuradora-geral divulgou ontem uma nota sobre o pedido de demissão coletiva. “Raquel Dodge reafirma que, em todos os seus atos, age invariavelmente com base em evidências, observa o sigilo legal e dá rigoroso cumprimento à Constituição e à lei. Todas as suas manifestações são submetidas à decisão do Supremo Tribunal Federal”, diz o texto.

Na proposta de colaboração, Léo Pinheiro cita doações oficiais e repasses via caixa dois a Maia em troca da defesa de interesses da OAS no Congresso. Já no anexo sobre o ex-prefeito de Marília, Léo Pinheiro o acusa de ter recebido caixa dois e propina.

Maia e Toffoli vinham defendendo nos bastidores a recondução de Dodge para mais um mandato à frente da PGR, masa procuradora-geral não figura mais na listados cotados para a indicação. Seu mandato termina no dia 17 de setembro. O presidente Jair Bolsonaro prometeu anunciar até hoje o novo procurador-geral.

Procurada, a defesa de José Ticiano afirmou que não iria comentar o caso. A assessoria de Maia não respondeu até o fechamento desta edição.

A delação de Léo Pinheiro foi alvo de muitas idas e vindas. Parado no gabinete de Dodge desde fevereiro, o acordo só agora foi enviado para homologação. A demora foi uma das razões para o antigo coordenador da Lava Jato, José Alfredo, ter pedido demissão em julho. A procuradora Raquel Branquinho, que coordenava as investigações criminais da PGR, também vinha demonstrando desconforto. Pessoa de extrema confiança de Dodge, ela considerou que o caso Léo Pinheiro era o estopim e articulou a saída conjunta.