Título: Lula culpa EUA por dólar fraco
Autor: Aline Duque Erthal
Fonte: Jornal do Brasil, 03/05/2005, Economia & Negócios, p. A17

Presidente afirma que oscilações não têm afetado indústria nacional, mas Volks considera câmbio atual ''um desastre''

Entre vaias e faixas que exigiam a correção da tabela do Imposto de Renda e uma reforma sindical que preserve os direitos dos trabalhadores, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva apontou ontem a política econômica dos Estados Unidos como principal responsável pela desvalorização do dólar. E sustentou que as oscilações do câmbio não têm afetado a indústria nacional. O discurso se deu na fábrica da Volkswagen em São Bernardo do Campo, durante evento comemorativo que marcou os 15 milhões de veículos produzidos pela montadora no Brasil. - A gente deveria fazer uma comitiva para se queixar do câmbio onde efetivamente está a razão da desvalorização do dólar, que não é no Brasil. Todo empresário sabe que o câmbio tem um problema com a política americana, e não é um problema para que nós resolvamos, como alguns pensam - afirmou o presidente, que ganhou projeção como líder sindical justamente durante a greve dos metalúrgicos do ABC, em 1979.

Lula, contudo, não se deixou intimidar pelas vaias, compartilhadas com o presidente da Central Única dos Trabalhadores, Luiz Marinho, e o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, José Lopez Feijoó. O presidente se disse emocionado depois de assistir, durante a cerimônia, a imagens do Volkswagen TL, antigo modelo da montadora alemã. Sobraram recordações, sem qualquer relação com greves do passado.

- Eu adquiri, em 1973, um TL, que era o carro mais chique da Volkswagen na época. Eu e dona Marisa namoramos bastante naquele carro - suspirava, para desgosto da esposa, que não cabia em si de tanto constrangimento, e deleite de Geraldo Alckmin, governador de São Paulo, Ricardo Berzoini, ministro do Trabalho, e Aloizio Mercadante, líder do governo no Senado, que participavam da cerimônia.

Lembrando que ''países como o México importaram 100 mil carros brasileiros, para a Argentina foram mais de 40 mil e para a Venezuela, mais de 20 mil'', Lula insistiu que as oscilações do câmbio não têm prejudicado o desempenho da indústria.

- Com o câmbio da forma que está, salvo alguns setores da indústria brasileira, o restante continua não apenas produzindo bem, mas exportando muito bem, e o resultado é a nossa balança comercial. No dia de hoje, nós comemoramos, em 12 meses, US$ 104 bilhões de exportações, com saldo comercial de US$ 37,6 bilhões - afirmou, citando ainda que, para a África, o comércio exterior brasileiro cresceu 45%; para a América do Sul, 58%; e, para o mundo árabe, 55%, sem que houvesse diminuição na União Européia e nos Estados Unidos.

Tanto otimismo, porém, contrastava com os pés no chão de Hans-Christian Maergner, presidente da Volks no Brasil. Logo depois de apresentar o primeiro Fox Europa a sair simbolicamente da linha de montagem da fábrica de Anchieta rumo ao Velho Continente, Hans sublinhou que a desvalorização cambial obrigou, sim, a montadora a rever as metas para este ano, ameaçando as margens de lucro previstas. E foi além: classificou de um ''desastre completo'' a exportação no Brasil sob o aspecto financeiro.

- Ter as exportações como estratégia dominante neste país não dá certo a longo prazo. O Fox é um caso à parte, um carro projetado especificamente para a Europa. Mas o foco da empresa é e continuará sendo crescer no mercado interno. A exportação será só o chantilly em cima do doce - declarou.

Se por um lado Maergner mordia a política de exportação brasileira, por outro assoprava agradecido a iniciativa de liberar créditos do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) em São Paulo, defendendo a adoção da medida em todo o país.

- Esta é a primeira vez que um estado brasileiro permite que usemos os créditos do ICMS. Nosso balanço crescia e, se não usássemos os créditos, os auditores iriam tirá-los de nós por não estarem sendo aplicados. Hoje, temos R$ 259 milhões para investir principalmente na fábrica de Anchieta para a produção do Fox destinado à Europa - disse.