Título: Por que assinei a favor da CPI
Autor: Eduardo Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 29/05/2005, Opinião, p. A11

Assinei o requerimento da CPI para apurar os problemas ocorridos na Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos porque considero que esta é a melhor decisão para o presidente, para o seu governo, para o PT e para a nação brasileira. Pela primeira vez nos 25 anos de nossa história contrariei uma recomendação do Diretório Nacional, feita uma semana atrás, e pela bancada do PT no Senado, na última quarta-feira, em que sete dos 13 senadores haviam considerado melhor atender a orientação do DN, enquanto seis, dentre os quais eu, havíamos argumentado que seria melhor assinar o requerimento de CPI.

Na reunião da bancada, o líder do governo, senador Aloizio Mercadante, em respeito à convicção dos que queriam assinar, ponderou que uma alternativa seria deixar um documento assinado em mãos do líder do PT, senador Delcídio Amaral, com as assinaturas dos seis para incluir nossos nomes no requerimento de CPI poucos instantes antes da meia-noite, desde que ficasse configurada a inevitabilidade da realização da CPI, ou seja, desde que, mesmo com a retirada de assinaturas de parlamentares, ainda restassem pelo menos um terço na Câmara e no Senado, 171 deputados e 27 senadores.

Estávamos ainda em reunião quando o presidente Lula telefonou para Mercadante, que lhe informou sobre o resultado a que havíamos chegado. O presidente pediu que nos informasse de sua determinação para que todos os episódios de corrupção fossem profunda e rigorosamente apurados, assim como os seus responsáveis; e que gostaria de ter logo um encontro conosco.

Pouco depois da entrevista de Delcídio, informando que os senadores que pensavam assinar respeitariam a orientação do DN, começou a ocorrer uma enxurrada de mensagens e comentários nos sites de notícias, que eram destruidores, algumas vezes ofensivos a nós. Pessoas próximas que tanto haviam contribuído para estarmos no Senado telefonaram pedindo que refletíssemos melhor. Por volta das cinco da tarde, o senador Paulo Paim recordou-nos, em plenário, da sugestão de Mercadante. Resolvemos os seis - Paulo Paim, Cristovam Buarque, Flávio Arns, Serys Slhessarenko, Ana Júlia Carepa e eu - deixar pronto o requerimento com nossas assinaturas pela CPI. Delcídio ponderou a mim que refletisse bem se não ficaria mal entregarmos apenas pouco antes da meia noite, constatada a inevitabilidade da CPI. Pensamos bem e acordamos que seria melhor registrar nossa posição do que não fazê-lo.

Em minha mente, ainda recordava o que presenciara na noite anterior, em jantar na Embaixada da China: o senador Ney Suassuna comentou de maneira interessante que o PT era um partido caracterizado por inúmeras tendências. Disse também que o governo demorava em atender às demandas de inúmeros parlamentares da base aliada, e deu exemplos de como os senadores assim criavam dificuldades para se comportar de acordo com as diretrizes do Planalto. O que resultou no comentário de uma das senadoras do PT: ''Nós não sabemos destas coisas!''.

Por volta das seis e meia, ouvi a previsão de uma pessoa bem informada de que até a meia-noite poderiam ser retiradas as assinaturas necessárias para inviabilizar a CPI na Câmara. Isto significava, obviamente, que não haveria a oportunidade de os seis senadores confirmarem o ato de assinatura ditado por nossa consciência.

Às sete horas o senador Pedro Simon começou o seu pronunciamento, em que recordava os momentos da história em que o MDB, depois transformado em PMDB, havia alcançado enorme credibilidade. Alertava então o PT, como amigo, que não deveríamos permitir que inúmeros fatos como esse viessem a contribuir para o enfraquecimento de nosso partido, como acontecera com o dele.

Conversei com pessoas em quem confio. Li as inúmeras mensagens. Disse em aparte a Pedro Simon que falaria da tribuna para comunicar minha decisão. Entreguei ao senador Paulo Paim o documento com as nossas assinaturas, transmitindo que avaliava melhor assinar naquele momento, por volta das 20h, pois depois passaria a oportunidade.

Expliquei, depois de registrar o avanço do programa Bolsa-Escola, porque considerava minha obrigação de consciência assinar o requerimento de formação da CPI. Citei que outros senadores tinham ponto de vista semelhante, ainda que eu estivesse me adiantando em relação ao combinado anteriormente. Mas o fazia de maneira transparente. É claro que poderiam seguir o mesmo caminho - que, entretanto, significava outro em relação ao combinado com Delcídio. Disse ao Paim que ele poderia consultar os demais se desejassem também fazê-lo. Explicou-me que, por eu ter me adiantado, prefiriam não mais assinar o requerimento.

Os que argumentaram contrariamente à CPI disseram que ela se tornaria um instrumento de desestabilização do governo, que paralisaria os trabalhos do Congresso Nacional e da administração pública. Penso que, ainda que alguns parlamentares tentem agir assim, caberá aos congressistas responsáveis fazer da CPI um organismo que saiba trabalhar com imparcialidade, firmeza e serenidade, com o propósito de apurar completamente os fatos irregulares e as responsabilidades de quem agiu contrariamente ao interesse público.