Título: Paralisia assusta governistas
Autor: Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 06/06/2005, País, p. A2

O esforço do governo em reatar as relações com a base de apoio, acenando com a liberação de emendas parlamentares e apresentando uma ''agenda positiva para o Congresso'' é mais uma prova de que o Executivo demora a agir e só o faz em momentos de crise. Há mais de um ano os governistas reclamam do péssimo tratamento que recebem do Planalto. Há várias semanas projetos importantes estão parados no Legislativo, entulhado com as medidas provisórias. Foi necessária a ameaça de uma CPI para o governo sinalizar que vai rever suas prioridades. - É a última chance que eles têm. Não quero nem pensar na hipótese de dar errado - reconheceu o líder do PTB na Câmara, José Múcio Monteiro (PE).

Parlamentares da base governista não entendem a morosidade do Executivo. No caso da CPI dos Correios, houve quem defendesse uma demissão coletiva da diretoria dos Correios e uma conversa prévia com o presidente do PTB, deputado Roberto Jefferson (RJ), antes que ele fizesse seu discurso na tribuna. Isso não aconteceu, as denúncias envolvendo Maurício Marinho incendiaram o Congresso, a oposição propôs a CPI e Jefferson assinou o requerimento, embora depois tivesse retirado o nome da lista.

No dia em que a CPI seria protocolada, os governistas corriam sem rumo nos corredores do Congresso tentando convencer 80 deputados a retirarem suas assinaturas. O líder do governo na Câmara, Arlindo Chinaglia (PT-SP), fazia e refazia os cálculos, ainda com esperança de que as coisas pudessem mudar. Brincava com um lápis entre os dedos. Faltando sete horas para o término do prazo, o golpe fatal foi dado pelo líder do PMDB, José Borba (PR) , referendando a tese da falta de timing governista.

- Não dá mais tempo. Deveríamos ter feito isto na semana passada - avisou Borba a Chinaglia.

O petista, de semblante fechado, respondeu:

- Essa informação para mim é nova, eu não sabia.

Nos bastidores do Planalto, a articulação, o discurso e a prática também passam por um impensável processo de depuração. Desde que a oposição começou a recolher as assinaturas, o ministro da Coordenação Política, Aldo Rebelo, avisou aos líderes que algo deveria ser feito. Ele viajou para o Sul, retornou a Brasília e o cenário continuava o mesmo.

Aldo resolveu pedir ajuda ao chefe da Casa Civil, ministro José Dirceu, e ambos convocaram uma reunião com todos os ministros políticos da Esplanada. A orientação era clara: todos tinham que participar do esforço para a retirada de assinaturas. Seis dias depois, a CPI estava sendo protocolada.

- Falta articulação, conversa, só pode ser isso - constatou o líder do PSB na Câmara, Renato Casagrande (ES).

Para Casagrande, a situação vivida no momento pode ajudar a uma revisão de conceitos. O líder do PSB acha que, em certos momentos, há um ''acanhamento'' por parte dos aliados ideológicos do governo de Luiz Inácio Lula da Silva.

- Nós éramos bons na oposição. No governo, em certos momentos, agimos de forma tímida, como se tivéssemos vergonha de ter chegado ao poder - reconheceu Renato Casagrande.

Durante a semana passada, o líder do PMDB no Senado, Ney Suassuna (PB), comparou a oposição a uma orquestra afinada e o governo a uma fanfarra.

- Mas a dor ensina a gemer. A CPI é uma dor, vamos ver se as coisas endireitam agora - espera Suassuna.

E a agenda positiva? Diversos projetos estão parados há mais de um ano, como, por exemplo, o marco regulatório das agências e a reforma tributária. Outros projetos, como o ''Pacote Verde'', criado após o assassinato da missionária americana Dorothy Stang, caminham timidamente pelo Congresso. Embora o relator seja o vice-líder do governo na Câmara, Beto Albuquerque (PSB-RS), não se vê nenhum aliado subir à tribuna para enumerar os benefícios da proposta.

A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara deve discutir na terça-feira o recurso contra a CPI dos Correios. A oposição espalha aos quatro ventos que tem uma estratégia pronta para infernizar o Planalto. Já os governistas vão se reunir na véspera para acertar os últimos detalhes da estratégia.

- Ou o governo começa a gerar fatos positivos, ou vai pular de uma crise para outra - avisa o deputado Luiz Eduardo Greenhalgh, do PT de São Paulo.