Título: O dia dos namorados
Autor: Eduardo Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 12/06/2005, Outras Opiniões, p. A11

A interação com as pessoas que amamos, aquelas que mais gostamos, em quem mais confiamos, é tão importante para as nossas decisões que, quando decidem nos dar um conselho, sabemos que é correto e para o nosso bem. Digo isso a propósito do processo de decisão que me levou, no dia 25 de maio último, a assinar o requerimento da CPI sobre os atos de corrupção que possam ter havido nos Correios. Pela primeira vez, em 25 anos, agi de maneira contrária à orientação da direção nacional do PT e da maioria de minha bancada no Senado.

Felizmente, na última terça-feira, após a entrevista dada pelo deputado Roberto Jefferson, presidente do PTB, à Folha de S. Paulo, toda a bancada de 13 senadores do PT assinaram uma declaração pública apoiando a realização da CPI dos Correios, delimitando-se claramente o fato determinado que seria objeto de apuração. A bancada também recomendou ao PT na Câmara dos Deputados que tomasse a iniciativa de propor o inquérito parlamentar sobre as denúncias de pagamento de mensalidades indevidas a deputados.

No dia 7 ouvi o pronunciamento do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na abertura do Fórum Global de Combate à Corrupção, promovido pela ONU. Ele disse que o governo estava tomando todas as providências para apurar os atos de corrupção, envolva quem envolver, assim como estava estimulando o Congresso Nacional a fazer as investigações as mais completas possíveis: ''Digo que cortaremos na própria carne, se necessário.''

Logo após a sua fala, cumprimentei o presidente, dizendo-lhe: Fiz o que considerei o melhor para o seu bem, o do PT e da nação brasileira. Ele me respondeu: ''Agora tudo vai se acertar''.

Quero agradecer a todas as pessoas que, nos dias que precederam aquela decisão, me telefonaram e passaram mensagens eletrônicas, dizendo que assinar o pedido da CPI seria o caminho mais consistente com toda a história do PT. Consultei alguns diretamente, como os estudantes da FGV-SP e as 450 pessoas que participaram do Congresso de Direito Público de Alagoas. Ouvi meus três filhos, Supla, André e João. Estou grato também aos que, por onde passei, me pediam para assinar: nos aeroportos, nos aviões, nos restaurantes, na farmácia, na praça onde faço ginástica, no cinema, no parque e assim por diante.

E especialmente à minha namorada. Naqueles dias, ela registrou em meu celular diversas mensagens perguntando se eu já havia assinado. Informava que 85% da opinião pública queria que eu assinasse. Dela recebi então a seguinte mensagem:

''Muita força. O que decidir será conseqüência de muita reflexão. Conte comigo. Eu te amo. Muitos beijos.''

Naquele 25 de maio, logo após o anúncio pela Internet que, em que pese a minha carta ao presidente Lula afirmando que a decisão do sábado, 21 de maio, estava em grande dissonância com a vontade popular, eu iria acatar a decisão da maioria dos senadores que avaliaram que era melhor acatar a orientação do Diretório Nacional, recebi dela a seguinte mensagem:

''Lamento muito a decisão tomada. Você vai pagar um preço alto por ela. Inclusive na tentativa de reeleição. Bj''.

Dezenas de comentários ofensivos e destruidores inundaram a Internet. Outros fatores, conforme já expliquei em artigo anterior, também contribuíram para a decisão que acabei por tomar por volta das 19:45 hs daquele dia.

Às 20:09 hs chegou uma nova mensagem. Era dela:

''Parabéns. Esse é o meu senador, o nosso senador, que tanto respeitamos e tanto nos representa. Te amo muito.''

Nunca, em minha vida política, uma decisão tinha alcançado tamanha repercussão positiva. Até anteontem chegaram mais de 2.300 mensagens eletrônicas. Cerca de 95% a favor. Importante é que na própria base do PT a reação também foi de forte aprovação. Fiz reuniões de avaliação em duas cidades do interior de São Paulo, Franca e São Joaquim da /barra. A aprovação foi de 75% nas duas.

Segunda-feira passada fiz palestra sobre ''Probidade na administração'' na Universidade do Desenvolvimento Regional do Pantanal, em Campo Grande, Mato Grosso do Sul, terra de meu líder no Senado, senador Delcídio Amaral. Foi por ocasião do lançamento do livro sobre Dorcelina Folador, a ex-prefeita de Mundo Novo, assassinada por sua bravura na defesa da honestidade e da justiça. Logo ao chegar no aeroporto, antes de visitar meu amigo, o governador Zeca do PT, a imprensa me perguntou: ''O senhor virá no ano que vem aqui em Campo Grande apoiar o candidato a governador Delcídio Amaral, ainda que ele tenha dito que o senhor o havia entristecido, que era uma decepção?'' Respondi que certamente eu viria, pois avaliava que meus colegas senadores iriam rever aquela posição. E que contribuiria para isso a consulta que eu faria ali na Uniderp. Assim, ao final daquela palestra, pedi ao viúvo de Dorcelina, César Folador, hoje vice-prefeito de Mundo Novo, que fizesse a pergunta às 300 pessoas presentes no auditório: ''Levantem a mão as que acham que os senadores do PT deveriam ter assinado o requerimento da CPI''. Todos levantaram a mão. No dia seguinte, o líder e os 12 demais senadores apoiaram a CPI.

Muito obrigado à minha namorada, Mônica Dallari. A todos que me escreveram de todos os cantos do Brasil. Não tive ainda tempo de responder.

Eduardo Suplicy (eduardo.suplicy@senador.gov.br) escreve aos domingos nesta página.