Título: Dialogar com o povo
Autor: Eduardo M. Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 26/06/2005, Outras Opiniões, p. A11

Na última sexta-feira, fui convidado pelo deputado Chico Alencar (PT-RJ) para dialogar com o povo no Buraco do Lume, ali na esquina das Avenidas Rio Branco e Nilo Peçanha, uma praça que vai tomar o nome de Mário Lago, no centro do Rio de Janeiro. Trata-se de uma prática super saudável, inaugurada há anos pelo ex-deputado Wladimir Palmeira e pelo deputado Fernando Gabeira, de se dispor a conversar semanalmente com as pessoas que lá circulam sobre os principais acontecimentos nacionais. Nesta sexta-feira, além de Chico Alencar, estiveram os deputados federais Antonio Carlos Biscaia, André Costa, os estaduais Alessandro Molon e Paulo Pinheiro, e o vereador Eliomar Coelho, todos do PT, além do ex-deputado Milton Temer, hoje no PSol.

Durante quase duas horas, logo depois do meio-dia, cerca de 500 pessoas se aglomeraram em torno do caixote onde cada um de nós passamos a refletir sobre o difícil momento político atual. Chico Alencar e os demais parlamentares historiaram os compromissos de todos nós com os princípios da transparência e da ética, que nos levaram a apoiar a apuração completa das diversas denúncias que são agora objeto de CPI no Congresso Nacional.

Comecei dando notícia do apelo feito ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que possa receber a Sra. Isabel Vasconcellos, irmã de João José Vasconcellos Junior, engenheiro seqüestrado no Iraque em 19 de janeiro último. Seus familiares têm a esperança de que ele ainda possa estar vivo, sob cativeiro dos rebeldes iraquianos. Observam que o esforço pessoal dos chefes de Estado da França, Itália, Japão e Austrália acabou sendo bem sucedido na libertação de cidadãos daqueles países respectivos.

Comentamos todos a manifestação incisiva do presidente da República à nação, na última quinta-feira, quando ressaltou a importância, a todos nós que estamos na vida pública, de colocar o interesse nacional acima dos interesses particulares. Propus ali que todos os presentes pudessem responder à seguinte questão:

Quem estaria de acordo que o presidente Lula dissesse a todos os membros do Congresso Nacional que cada parlamentar, na hora de votar qualquer projeto de lei ou de emenda à Constituição, levasse em conta o que considera mais importante para o interesse público, em vez de submeter sua decisão à liberação de verbas de suas emendas ou se suas indicações para este ou aquele cargo foram efetivadas.

Praticamente todas as pessoas levantaram a mão e em seguida aplaudiram a sugestão. Pode o presidente ter a certeza de que, ao expressar e colocar em prática esta norma, contará com forte apoio popular. Em verdade, tornará mais claro o que constitui o dever de cada parlamentar e que está dito claramente no artigo 54 da Constituição, que veda a qualquer um tirar vantagens de quaisquer contratos porventura realizados com qualquer entidade de direito público.

Fiz outra consulta aos presentes, sobre um dos pontos ainda controversos da reforma política que tramita no Congresso Nacional. É a expectativa positiva da maioria para que se institua a fidelidade partidária, segundo a qual os eleitos devam permanecer em seus respectivos partidos durante os seus mandatos. Também que haja o financiamento público das campanhas. Algumas pessoas argumentam que o financiamento público deve combinar com a votação em lista fechada, ou seja, que os eleitores devem votar em listas de candidatos ao parlamento definido pelas convenções partidárias, previamente organizadas por suas respectivas direções. Tendo em vista esta preocupação, perguntei aos presentes:

Quem gostaria de continuar votando diretamente nos seus próprios vereadores, deputados federais e senadores? Novamente, quase todos os presentes levantaram a mão expressando esse desejo. O que pode ocorrer, como acontece em alguns países, é alguma combinação da votação da lista com a possibilidade de todos os eleitores poderem expressar o desejo de que seus candidatos estejam melhor colocados na lista do partido.

Chico Alencar levantou ainda uma questão importante, por vezes proposta por Wladimir Palmeira: quantas vezes um parlamentar pode ser eleito para o mesmo cargo, seja de vereador, deputado ou senador? Será que não é demasiado um senador de dois mandatos se candidatar outra vez? Foi pensando nisso que resolvi convidar todos os interessados a comparecer hoje às três da tarde no Teatro Oficina, à rua Jaceguai, Bela Vista, em São Paulo, para uma plenária de avaliação de meus atos, projetos, palavras, ao longo de meus quinze anos de mandato. E para que todos possam responder à seguinte pergunta: deve o PT lançar Eduardo Suplicy para um novo mandato no Senado em 2006? Podem responder. Serão todos bem-vindos.

Era dia de São João. Ali na praça acendeu-se, como observou Chico, a fogueira da esperança renovada de todos nós.