Título: Confissão de mais um criminoso
Autor: Daniel Pereira e Paulo de Tarso Lyra
Fonte: Jornal do Brasil, 02/08/2005, País, p. A3

O presidente nacional do Partido Liberal, Valdemar Costa Neto (SP), renunciou ontem ao mandato de deputado federal. Ele confessou que recebeu do PT recursos não contabilizados para saldar dívidas da campanha de 2002 e isentou do crime eleitoral todos os demais integrantes de seu partido. A revelação do crime de caixa 2 faz assim sua terceira vítima ¿ já havia levado Delúbio Soares a renunciar ao cargo de tesoureiro do PT, e contribuiu para que o deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) pedisse afastamento da presidência do PTB. Valdemar, que fazia parte da lista de parlamentares com mandato ameaçado, é a primeira baixa na Câmara por conta da crise do mensalão e da distribuição para aliados de verbas das empresas de Marcos Valério Fernandes de Souza. A oposição acredita que outras renúncias virão. ¿ Podemos estar diante de um efeito dominó. O sacrifício de Valdemar dá a dimensão política do escândalo ¿ avaliou o deputado Gustavo Fruet (PSDB-PR).

Valdemar chegou ao plenário aparentando tranqüilidade. Aos poucos, a bancada do PL, incluindo o líder, Sandro Mabel (GO) e o vice-líder, Carlos Rodrigues (RJ) ¿ ambos citados por Roberto Jefferson como beneficiários do mensalão ¿ foram chegando ao plenário. Valdemar subiu à tribuna após um discurso do presidente da Câmara, Severino Cavalcanti (PP-PE), afirmando que ¿os deputados têm que sair do parlamento de cabeça erguida¿. No início do discurso, o liberal afirmou que teve a promessa do PT de que receberia os recursos para cobrir as despesas da coligação PT-PL.

Reconheceu que os repasses começaram em setembro de 2003. Mas, como já havia reclamado Roberto Jefferson em relação ao PTB, os recursos do PT não tinham como ser contabilizados pelo PL.

¿ Tínhamos a clara certeza de que, enquanto não fosse recebido o instrumento de legalização daquele dinheiro doado, os recursos não poderiam dar entrada na caixa do PL ¿ disse.

Valdemar teria cobrado do PT a apresentação dos documentos de doação, mas, como não recebeu nada, desistiu de esperar. O presidente do PL não poupou o PT, afirmando que foi induzido ao erro ao aceitar recursos destinados à campanha sem comprovação. E que errou pela segunda vez, ao aceitar a pressão de credores em fazer os pagamentos informalmente.

¿ Para provar a boa fé dos meus atos e a inocência de parlamentares que compõem a bancada do PL, comunico à Mesa Diretora a renúncia do meu mandato de deputado federal ¿ anunciou Valdemar.

Um silêncio fúnebre tomou conta do plenário. Valdemar disse dever uma satisfação aos 158.510 cidadãos de São Paulo que votaram nele. E avisou que eles não terão motivos para deixar de acreditar em sua dignidade.

¿ Renuncio ao meu mandato, senhor presidente, mas não renunciarei aos objetivos e à inspiração que me trouxeram a esta Casa por quatro vezes ¿ declarou.

A renúncia de Valdemar acontece antes do depoimento do tesoureiro do partido, Jacinto Lamas, à Polícia Federal. Lamas foi ao Banco Rural 11 vezes e sacou R$ 1,650 milhão. Seguindo a linha adotada pelo tesoureiro licenciado do PT, Delúbio Soares, Valdemar preferiu reconhecer o crime eleitoral.

¿ Posso garantir que os recursos que o PL recebeu do PT não serviram para pagar mesada a deputados ¿ afirmou.

Valdemar também antecipou-se aos movimentos do deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ), que anunciava a apresentação de uma representação contra ele ¿ e outros deputados ¿ ao Conselho de Ética por quebra de decoro parlamentar. Seria um troco, já que há quase 50 dias, o PL pediu a cassação do presidente nacional do PTB. Ontem, Valdemar reforçou a artilharia contra o petebista.

¿ Não podemos permitir que um delinqüente, que foi o primeiro a ser acusado, possa sair livre das penas da lei e do julgamento político. Exijo que Jefferson responda por seus crimes ¿ atacou.

Ao renunciar ao mandato, Valdemar evita a perda dos direitos políticos por oito anos, acrescido do tempo em que resta para encerrar o mandato parlamentar. No caso do presidente do PL, caso a cassação fosse confirmada, ele ficaria inelegível por nove anos e meio. Valdemar também perde o foro privilegiado no Supremo Tribunal Federal e passa a responder por crimes na Justiça comum.