Correio Braziliense, n. 21515, 11/02/2022. Cidades, p. 14

STJ decide suspender investigação

Ana Maria Campos


Todas as medidas cautelares, de busca e apreensão, bloqueio de bens e novas diligências da Operação Tenebris, que apura supostas irregularidades no programa Brasília Iluminada, estão suspensas. O ministro Raul Araújo, do Superior Tribunal de Justiça (STJ), deferiu em parte a liminar requerida pela defesa do conselheiro André Clemente, do Tribunal de Contas do Distrito Federal (TCDF), um dos alvos da investigação que está a cargo do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Distrito Federal e Territórios (MPDFT).

 

Os promotores apontam superfaturamento na contratação, sem licitação, do instituto Idheias, por meio de emendas parlamentares apresentadas por 17 deputados distritais. A entidade que recebeu quase R$ 14 milhões repassou o serviço para duas empresas, a Primer Serviços de Comunicação e Eventos e a Mark Systems, que organizaram a ornamentação do Natal no centro de Brasília. Com base em informações colhidas na primeira fase, os promotores pediram autorização da Justiça para cumprir novas buscas na casa de Clemente e no gabinete dele no TCDF. O motivo é uma suspeita, obtida em mensagens trocadas entre os investigados, de que informações sigilosas sobre os pedidos de busca e apreensão vazaram para o conselheiro da Corte.

 

Mas todas as informações podem ser anuladas pelo STJ. A discussão envolve a competência na Justiça para processar e julgar Clemente. Todas as diligências até agora, em duas fases, foram autorizadas pela juíza Ana Claudia Loiola, da 1ª Vara Criminal de Brasília. Houve o entendimento da magistrada de que, no momento da ação cautelar, Clemente não era mais secretário de Fazenda e, portanto, não tinha mais foro no Conselho Especial do Tribunal de Justiça do Distrito Federal e dos Territórios (TJDFT). O caso também não deveria ser apreciado pelo STJ, onde tramitam processos criminais relacionados a conselheiros dos tribunais de contas, por envolver atos anteriores à posse de Clemente na função.

 

Jurisprudência

 

Na decisão, o ministro Raul Araújo argumentou que, até o julgamento pelo Supremo Tribunal Federal (STF) da Ação Penal nº 937, que flexibilizou o foro especial, não havia dúvidas sobre qual instância deveria analisar investigações e denúncias envolvendo detentores de foro. Valia sempre o cargo exercido no momento pelo réu. Nesse processo, julgado em 2018, a Corte definiu que o foro só vale para os crimes cometidos no exercício da atual função. Ilícitos ocorridos anteriormente são analisados na primeira instância.

 

Mas a nova jurisprudência, segundo Raul Araújo, abriu brechas para dúvidas quando está em questão o deslocamento de competência, como é o caso de André Clemente na Operação Tenebris. “No Superior Tribunal de Justiça, prevalece o entendimento de que cabe à própria Corte Superior a análise de sua competência, quando houver dúvida, diante do caso concreto”, ressaltou o ministro.

 

Assim, todos os atos e investigações da Operação Tenebris estão suspensos até que a Corte Especial do STJ, integrada por 15 ministros, analise de quem é a competência para apreciar o caso. Se o Superior Tribunal de Justiça considerar que houve usurpação de competência, como alega a defesa de Clemente, o próximo passo será decidir se as provas obtidas nas duas fases da operação têm ou não validade.

 

O caso é tratado em reclamação impetrada pelos advogados Eduardo Toledo, Cleber Lopes e Marcel Versiani, no STJ. Ao analisar o pedido de liminar na reclamação, o ministro Raul Araújo observou que medidas cautelares invasivas, como buscas e apreensões, foram cumpridas a partir de decisões de juízo que pode ser incompetente, o que justifica a concessão da liminar.

 

Em nota, a defesa de André Clemente ressaltou que, além da questão da competência, o conselheiro está tranquilo em relação ao mérito das suspeitas levantadas pelo MPDFT. “É importante destacar que, independentemente da questão da competência, o eminente desembargador James Eduardo Oliveira já havia alertado que ‘não se colhe dos autos elementos concretos de que o ex-secretário de Estado de Economia do Distrito Federal incorreu em alguma ilicitude’, sendo também certo que a própria magistrada de primeiro grau reconheceu que os elementos colhidos nas investigação ‘não são suficientes à formação de uma convicção — ainda que indiciária, superficial’ contra André Clemente”, registram os três advogados. Eles concluem: “A defesa prossegue confiante quanto ao pleno reconhecimento da inocência de seu constituinte e ao cabal esclarecimento dos fatos”.