O Estado de São Paulo, n. 46680, 07/08/2021. Economia p.B4

 

Novo IR pode ser votado na terça-feira


Apesar de pressão de entidades empresariais para mudar o texto, relator prevê que o projeto terá o apoio de mais de 300 deputados

Adriana Fernandes

Mesmo com manifestações contrárias de entidades empresariais, o relator do projeto de reforma do Imposto de Renda, Celso Sabino (PSDB-PA), prevê que o texto será votado na próxima terça-feira e terá mais de 300 votos de apoio no plenário da Câmara.

Novos manifestos foram divulgados depois que a Câmara aprovou pedido de urgência (uma espécie de "fura-fila" para a tramitação da proposta), assinados por entidades de classe, associações do setor produtivo e secretários de finanças das capitais. "Vamos aprovar da forma como está. A esquerda também vai apoiar, porque é pauta deles a cobrança de dividendos, e os líderes da base deverão encaminhar a favor", disse Sabino ao Estadão.

O relator publicou nas suas redes sociais planilhas para contestar, com números, a posição de entidades que apontam que haverá aumento da carga tributária para as empresas que pagam o Imposto de Renda pelo regime do lucro presumido.

O relator contesta as críticas dos manifestos e vê contradição entre os setores que dizem que terão aumento da carga tributária, enquanto os Estados e municípios falam que vão perder muita arrecadação com o projeto – e pressionam para barrá-lo no Congresso. "O fato é que vai reduzir o imposto a pagar. Por isso, é que os Estados estão reclamando tanto", afirmou o relator.

Sabino disse que tem observado muitos equívocos em cálculos que vem recebendo. Ele contou que um deputado mostrou uma planilha considerando o faturamento integral como sendo todo o lucro a ser distribuído pela empresa na forma de dividendos, o que não acontece na vida real. Pelo projeto, a distribuição de lucros e dividendos será taxada com uma alíquota de 20%

Em um dos manifestos, 52 entidades afirmam que as mudanças pretendidas pelo projeto de lei "trarão enorme recessão para a economia brasileira". O documento também fala em aumento da judicialização. O presidente do Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Cesa), Gustavo Brigagão, é articulador do manifesto. Ele acredita que o projeto trará grande judicialização e aponta os riscos de promover uma mudança da alíquota com base em aumento da arrecadação. O Comitê Nacional de Secretários Estaduais de Fazenda (Comsefaz) também divulgou carta criticando o texto.

Sabino disse que há preocupação com a perda de arrecadação dos Estados e municípios, mas argumenta que o problema já foi resolvido com as recentes mudanças no projeto, incluindo o fim do instrumento dos Juros sobre Capital Próprio (JCP), e não apenas a proibição da sua dedução do imposto a pagar. Pelos seus cálculos, o ganho com o fim desse instrumento que as empresas de capital aberto usam para remunerar os seus acionistas subirá para R$ 20 bilhões. "O principal problema, o JCP ia dar R$ 14 bilhões e vai dar R$ 20 bilhões com o seu fim."

 

Plenário

“Vamos aprovar da forma como está. A esquerda vai apoiar, porque é pauta deles a cobrança de dividendos, e os líderes da base deverão encaminhar a favor.”

Celso Sabino (PSDB-PA)

RELATOR DA REFORMA DO IR

 

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Para tributaristas, reforma eleva impostos de pequenas empresas


Avaliação é que taxação de dividendos vai afetar companhias que usam o regime contábil de lucro presumido

Heloísa Scognamiglio

 

A proposta de tributação de lucros e dividendos incluída na reforma do Imposto de Renda poderá elevar a carga tributária de pequenas e médias empresas que optam pelo regime de lucro presumido. Segundo tributaristas, a redução do IRPJ também proposta no texto não vai compensar a tributação de dividendos na fonte – com uma alíquota de 20% para essas empresas.

"O projeto quase condena à morte as empresas desse regime de lucro presumido", afirma Rodrigo Dias, que faz parte do Conselho Jurídico do Sindicato da Habitação (Secovi-sp) e é sócio do VBD Advogados.

O Secovi realizou uma simulação com uma empresa com seis sócios e receita bruta mensal de R$ 405 mil. Considerando uma média mensal dos pagamentos de tributos, atualmente o total chegaria a R$ 25.256,50. Já com a mudança no IR, esse total passaria a R$ 43.076,50 – aumento de quase 71%. Segundo Dias, o aumento da carga tributária poderá variar dependendo de cada empresa, mas ele reitera que será significativo.

O lucro presumido é um regime de tributação simplificado usado por empresas com faturamento de até R$ 78 milhões ao ano e que não estejam obrigadas à apuração pelo regime de lucro real devido a suas atividades ou constituição societária. Concentra pequenas e médias empresas, além de microempresas, que não se enquadram no Simples por determinadas restrições. O regime de lucro real, considerado mais complexo e que demanda estruturas mais robustas, é o usado por grandes companhias. "Esse regime permitiu a formalização de dezenas de pequenos empreendedores e é responsável por mais de cinco milhões de empregos só em São Paulo. Esse aspecto da reforma é uma maluquice, é contra o Brasil", afirma Ely Wertheim, diretor do Secovi.

Tarcísio Tamanini, líder de Inovação da Laclaw Consultoria Tributária, concorda que a proposta aumentará a carga tributária. "Muitas empresas no lucro presumido trabalham com margens curtas de lucro e com produtos de preços inelásticos, ou seja, um cenário em que não é possível simplesmente repassar a carga tributária elevada no custo, pois isso inviabilizaria a venda. Se as margens forem estreitas, o negócio pode de fato não se sustentar mais", afirma.