O Estado de São Paulo, n. 46687, 14/08/2021. Política p.A4

 

Presidente do PTB é preso por ataques à democracia

 

Pepita Ortega

Fausto Macedo

O presidente do PTB, ex-deputado Roberto Jefferson, foi preso preventivamente na manhã de ontem, no Rio, por determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal Alexandre de Moraes. Aliado do presidente Jair Bolsonaro, Jefferson é investigado no chamado inquérito das milícias digitais, que mira suspeita de organização criminosa “de forte atuação digital, com a nítida finalidade de atentar contra a democracia e o estado de direito”. A Polícia Federal também fez buscas na residência do ex-deputado e apreendeu armas, munições e aparelhos eletrônicos.

Jefferson foi detido em sua residência, em Levy Gasparian, no interior do Estado. Após passar por uma triagem no presídio de Benfica, na zona norte do Rio, onde chegou por volta das 16h, seguiu para Bangu 8, na zona oeste. Ele ficará detido nesse presídio, onde estão o ex-governador do Rio Sérgio Cabral (MDB) e o ex-vereador Jairo de Souza Santos, o doutor Jairinho.

O pedido de prisão partiu da PF e foi acolhido por Moraes, que fundamentou a ordem de custódia na “garantia da lei e da ordem e conveniência da instrução criminal”. Para ele, foram “inequivocamente demonstrados nos autos fortes indícios de materialidade e autoria” dos crimes de calúnia, difamação, injúria, incitação ao crime, apologia ao crime ou criminoso, associação criminosa, denunciação caluniosa, além de delitos previstos na Lei de Segurança Nacional e no Código Eleitoral.

Depois que Jefferson foi preso, a Procuradoria-geral da República divulgou nota na qual diz que enviou ao Supremo manifestação contra a medida cautelar porque “atingiria pessoa sem prerrogativa de foro nos tribunais superiores” e “representaria censura prévia à liberdade de expressão”. Moraes, no entanto, afirmou em sua decisão que a Procuradoria foi intimada a se posicionar sobre o caso, em 24 horas, mas deixou o prazo transcorrer “em branco”.

De acordo com Moraes, o exdeputado tem se manifestado “contra as instituições democráticas”, em conduta “gravíssima”. O relator do inquérito registrou que Jefferson “pediu o fechamento do STF e a cassação imediata de todos os ministros para acabar com a independência do Poder Judiciário, incitando a violência”. Para o ministro, as declarações do petebista são “atentatórias ao estado democrático de direito e às suas instituições republicanas” e “se destinaram a corroer as estruturas do regime democrático”.

“Tanto são inconstitucionais as condutas e manifestações que tenham a nítida finalidade de controlar ou mesmo aniquilar a força do pensamento crítico, indispensável ao regime democrático, quanto aquelas que pretendam destruí-lo, juntamente com suas instituições republicanas, pregando a violência, o arbítrio, o desrespeito à separação de poderes e aos direitos fundamentais. Em suma, pleiteando a tirania, o arbítrio, a violência e a quebra dos princípios republicanos”, anotou o ministro-relator.

A investigação que levou à prisão de Jefferson foi aberta em julho, após Moraes arquivar, a pedido da Procuradoria-geral, o inquérito dos atos antidemocráticos. O ex-parlamentar também já foi alvo de buscas em outro inquérito que tramita no Supremo, o das fake news. Ontem, Jefferson chamou Moraes de “cachorro do STF” e foi defendido por aliados. Em nota, o PTBSP afirmou que seus dirigentes “sempre respeitaram o estado democrático de direito”.

 

Bloqueio. Ao pedir a prisão de Jefferson ao Supremo, a PF afirmou que, durante as investigações, houve “um agravamento da atuação incisiva” do presidente do PTB, “que passou a reiterar divulgações de ofensas em mídias de comunicação ao mesmo tempo que incita pretensos seguidores a agirem ilicitamente, em violação às regras do estado democrático de direito, indicando uma crescente agressividade no discurso”.

Moraes determinou a suspensão da conta de Jefferson no Twitter sob o argumento de que o ex-deputado, por meio da plataforma, “publica vídeos e declarações onde exibe armas, faz discursos de ódio, homofóbicos, e incentiva a violência, além de manifestar-se frontalmente contra a democracia”.

 

Fundo Partidário. Ainda de acordo com as investigações, Jefferson é suspeito de utilizar dinheiro do Fundo Partidário para promover a disseminação de fake news. Com uma bancada de dez deputados, o PTB recebeu, em 2019, R$ 21,8 milhões do fundo. No ano passado, foram R$ 21,4 milhões, segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

Moraes afirmou que enviou ofícios ao TSE, ao corregedorgeral da Justiça Eleitoral e à Procuradoria-geral Eleitoral para “providências cabíveis, em virtude da possível utilização da condição de presidente de partido – com a consequente utilização de recursos do Fundo Partidário – para incorrer nas condutas em análise”.

O ministro do STF informou que aguarda informações da Justiça Eleitoral “para análise de imposição de medida cautelar referente à suspensão do exercício de função pública”. 

 

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Expoente do bolsonarismo radical

 

PERFIL - Roberto Jefferson, presidente do PTB

 

Tulio Kruse

 

A trajetória de Roberto Jefferson foi do pragmatismo político à atual defesa de bandeiras mais radicais rumo à extremadireita, passando pela notoriedade conquistada no mensalão, escândalo de corrupção no governo Lula do qual foi pivô.

Hoje, aos 68 anos, o presidente do PTB é expoente do bolsonarismo, com discurso armamentista, religioso e anticomunista. Em maio do ano passado, publicou nas redes sociais uma foto portando uma metralhadora. "Contra o comunismo", escreveu.

Jefferson ingressou na política em 1971, ao aderir à ala jovem do MDB, então na oposição ao regime militar. Seu avô e pai tinham sido vereadores em Petrópolis pelo PTB, na época em que a sigla representava o trabalhismo de Vargas. Com o fim do bipartidarismo, em 1979, ficou por cerca de um ano no PP e depois migrou para o novo PTB.

Elegeu-se pela primeira vez deputado federal em 1982 – foi o mais votado da legenda naquele ano. Como parlamentar, se destacou como líder da "tropa de choque" de Fernando Collor no Congresso, em 1992. No governo FHC, integrou novamente a base de apoio ao Planalto. Nessa época, ao contrário de hoje, se dizia a favor do desarmamento. Foi a favor do impeachment de Dilma Rousseff e garantiu o apoio da sigla ao governo Michel Temer. A aproximação com Jair Bolsonaro se consolidou no ano passado.

Esta foi a segunda prisão de Jefferson. Condenado no mensalão, o ex-deputado foi preso em 2014 e, no ano seguinte, passou para regime domiciliar. Obteve o perdão da pena em 2016 e retomou o controle do PTB. No comando da legenda, tem conduzido uma guinada à extrema-direita, com a filiação de integralistas.

 

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Jefferson chama Moares de 'cachorro' do Supremo

 

A prisão do presidente do PTB, Roberto Jefferson, provocou reação no meio político e nas redes sociais. Aliados do ex-deputado e bolsonaristas classificaram a decisão do ministro do Supremo Alexandre de Moraes como “arbitrária”. Jefferson se manifestou mais cedo nas redes sociais. “A Polícia Federal foi à casa de minha ex-mulher, mãe de meus filhos, com ordem de prisão contra mim e busca e apreensão. Vamos ver de onde parte essa canalhice”, postou o ex-deputado, que mais tarde teve a conta no Twitter suspensa.

Antes disso, porém, Jefferson chamou Moraes de “cachorro do STF” e comparou sua prisão ao que ocorre na Venezuela. “Ele (Moraes) está prendendo os conservadores para entronizar os comunistas.”

Filha de Jefferson, a ex-deputada Cristiane Brasil cobrou uma reação do presidente Jair Bolsonaro. “Estão prendendo os conservadores e o bonito não faz nada? O próximo será ele! E, se não for preso, não vai poder sair nas ruas já, já!”, escreveu ela, que foi presa no ano passado em outra investigação.

O deputado Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) considerou a prisão de Jefferson um ataque ao pai. “Alexandre de Moraes não para de abrir inquéritos contra o presidente @jairbolsonaro, num claro ato ditatorial, isto após prender jornalistas, militantes e deputado federal.”

Em nota, o PTB-SP afirmou que seus dirigentes respeitam o estado democrático de direito e a Constituição Federal “em todos os seus ditames”. Disse ainda que se manifestará novamente após ter acesso à decisão e à íntegra dos autos.