Título: Nas malhas da Polícia Federal
Autor: Paulo de Tarso Lyra, Sérgio Pardellas e Hugo Marqu
Fonte: Jornal do Brasil, 25/09/2005, País, p. A2

BRASÍLIA - Os 19 deputados e ex-deputados envolvidos com o mensalão começam a ser indiciados pela Polícia Federal nas próximas semanas, por crimes de sonegação e corrupção. O ex-deputado Roberto Jefferson (PTB-RJ) - que disse ter embolsado R$ 4 milhões do esquema - deve ser enquadrado também no crime de formação de quadrilha.

- Os enquadramentos são, em sua maioria, por sonegação e corrupção - diz um dos delegados da PF.

É pelo ex-deputado Roberto Jefferson que a PF deve iniciar o processo de indiciamentos. Esta semana, o ex-deputado será intimado a depor novamente na PF. Sem as prerrogativas de parlamentar, Jefferson perde o direito de ser convidado a depor. Poderá sair do prédio da PF indiciado por formar uma quadrilha acusada de extorquir dinheiro do Instituto de Resseguros do Brasil e dos Correios.

- Se o Roberto Jefferson não comparecer espontaneamente, virá por condução coercitiva - avisa o mesmo delegado.

O futuro de Valdemar Costa Neto - que renunciou ao mandato de deputado pelo PL paulista - não deve ser muito diferente do de Jefferson. O empresário Marcos Valério Fernandes de Souza, acusado de distribuidor do mensalão, informou à PF que deu R$ 10,8 milhões para Valdemar e sua Guaranhuns Empreendimentos, empresa que, segundo denúncias, teria sido utilizada para lavar o dinheiro que o PT repassou ao PL.

Outro que está com indiciamento garantido é o ex-presidente da Câmara, João Paulo Cunha (PT-SP). Além de ter mandado a mulher, Regina Milanésio, buscar R$ 50 mil de Valério na agência do Banco Rural em Brasília, João Paulo mentiu aos seus pares ao informar à CPI dos Correios que ela tinha ido ao banco para pagar uma conta de TV a cabo.

A PF não ouviu até agora explicações convincentes de nenhum dos parlamentares que prestaram depoimento. O deputado José Mentor (PT-SP), que recebeu R$ 120 mil de Marcos Valério, alegou que prestou serviços advocatícios a empresas do dono da SMP&B. Mentor não conseguiu explicar que tipo de serviço prestou. O deputado engavetou a CPI do Banestado, criada para investigar a lavagem de dinheiro internacional, esquema ilegal utilizado por Valério.

Os investigadores não descartam futuras prisões de gente que deve perder o mandato. Por intermédio de seu assessor parlamentar João Cláudio Carvalho Genu, o deputado José Janene (PP-PR) R$ 4,1 milhões do valerioduto.

A PF não tem muita expectativa em relação às ações que deverão ser impetradas pelo Ministério Público contra os parlamentares e ex-parlamentares. As representações contra quem ainda tem mandato serão redigidas pela Procuradoria Geral da República e, contra os que já renunciaram, por procuradores da República em Brasília.

Esta nova fase de indiciamentos e ações judiciais começa assim que os delegados e procuradores receberem as perícias contábeis em fase de conclusão no Instituto Nacional de Criminalística. Uma das perícias cruza todas as entradas e saídas de dinheiro nas contas de Valério. Outra análise é feita sobre as contas do Banco Rural, de onde Valério conseguiu os ''empréstimos'' para abastecer o mensalão do PT.

- As perícias contábeis das empresas do Marcos Valério e do Banco Rural devem trazer pistas da origem dos recursos que financiaram este esquema - diz um dos investigadores da PF.

Os delegados querem identificar, além da destinação do dinheiro, o objetivo dos pagamentos de Valério para os deputados. É o objetivo que poderá delinear melhor o caminho dos indiciamentos, com a respectiva lista de crimes. As perícias, segundo a PF, representam a busca de provas materiais que poderão reforçar tudo o que foi dito em dezenas de depoimentos, colhidos em quatro inquéritos, que confirmam o valerioduto e o esquema de desvios nas estatais.

- É preciso deixar claro que tipo de contraprestação está por trás dos pagamentos - explica um investigador.

Além dos parlamentares, a PF tem um grande trabalho pela frente para punir dezenas de personagens que foram aos poucos surgindo em torno do mensalão. Um deles, de peso, é o publicitário do PT, Duda Mendonça, beneficiário de R$ 15,5 milhões de Valério. Deste total, R$ 10 milhões foram para o paraíso fiscal das Bahamas, na conta Dusseldorf.

No dia 3, uma equipe da Polícia Federal e do Ministério Público vai a Nova York buscar pacotes de documentos que mostram o rastro do dinheiro de Duda. Além de evasão de divisas e sonegação, o publicitário corre o risco de ser indiciado por lavagem de dinheiro.

A lista de ''guilhotinados'' pelo mensalão não pára de crescer dentro e fora do governo. Já são 58 autoridades e funcionários do governo demitidos e, fora do governo, empresários com contratos cancelados em órgãos públicos. Na lista de cassações constam 16 deputados que até dezembro poderão ameaçados de voltar aos seus respectivos Estados, sem a proteção dos mandatos.