Valor Econômico, n. 4955, 10/03/2020. Brasil, p. A2

Apesar de MEC, educação avançou, diz estudo

Hugo Passarelli


Apesar da atuação errática do Ministério da Educação (MEC), as políticas educacionais brasileiras avançaram em 2019 com ajuda de outros protagonistas do poder público. Sem a “perna” do governo federal, no entanto, as conquistas são lentas e insuficientes para dar conta dos desafios do setor. A conclusão é do Relatório Anual Educação Já!, lançado em Brasília pelo movimento Todos Pela Educação.

A análise mapeou a situação de sete áreas consideradas cruciais e constatou que três tiveram avanços relevantes e quatro mesclaram pontos positivos e negativos, o que é um sinal de alerta. Se fosse um aluno, a educação brasileira teria passado de ano raspando com uma nota “C”, compara o estudo.

“Uma análise objetiva dos fatos e do desempenho do MEC ao longo do ano mostra enorme incapacidade da atual gestão de organizar e conduzir uma agenda para enfrentar os múltiplos desafios que precisam ser confrontados. ”

Sinalizações mais recentes apontam para um risco maior de a pasta se consolidar como campo para o que o deputado federal Eduardo Bolsonaro, filho do presidente Jair Bolsonaro, já chamou de “revolução cultural”.

“Tivemos uma subida de tom nos últimos meses com o afastamento de uma gestão voltada para resultados para um caminho mais dogmático, de uso do MEC como instrumento mais ideológico”, disse Priscila Cruz, presidente-executiva do Todos Pela Educação.

E mesmo as poucas entregas feitas por essa gestão, como o Plano Nacional de Alfabetização (PNA), são vistas com ressalvas. “A PNA está parcialmente no caminho correto [do ponto de vista teórico]. Mas a mecânica de implementação é insuficiente para que ela chegue à sala de aula. ”

Quatro avanços merecem destaque apesar do cenário desafiador. Houve aprovação de novas diretrizes curriculares nacionais para a formação inicial de professores; os novos currículos para a educação infantil e ensino fundamental, construídos a partir da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), foram concluídos; os Estados continuaram a expandir as escolas de ensino médio em tempo integral; e a experiência cearense em alfabetização começou a ser replicada.

O relatório elogia ainda a cooperação entre Estados e municípios e a apresentação de projeto de lei que institui o Sistema Nacional de Educação, que visa definir as responsabilidades de União, Estados e municípios na educação.

Jogaram contra as recorrentes trocas no alto escalão do MEC, o que gerou paralisia da gestão, atraso em repasses de recursos e baixa capacidade de execução. O relatório também destaca que há pouco esforço do governo federal para fortalecer as secretarias de Educação, responsáveis diretas pela educação básica.

As discussões sobre o novo Fundeb, principal fonte de recursos da educação básica, foram intensificadas, embora o governo federal, em especial o MEC, tenha se ausentado do debate, diz o relatório. Também é visto com temor o orçamento do MEC para 2020 - 8% menor que o de 2019.

Os esforços para a primeira infância tiveram melhora, destaca o relatório, com a ampliação do Criança Feliz, programa que alcançou metade dos municípios brasileiros. Mas falta uma estratégia nacional para garantir boas condições de educação e saúde para as crianças de 0 a 6 anos.

Para 2020, o estudo destaca que a implementação do novo ensino médio é um dos desafios. Mesmo que 12 Estados e o Distrito Federal tenham colocado em consulta pública os novos currículos para essa etapa em 2019, o MEC pouco fez para ajudar os entes nessa virada do ensino, diz o relatório.