Título: CPI do Mensalão chega ao fim em meio a bate-boca
Autor: Renata Moura
Fonte: Jornal do Brasil, 18/11/2005, País, p. A2

Sem choro nem vela, a CPI do Mensalão acabou sendo enterrada ontem por extinção do prazo regimental. Nem mesmo o presidente do Congresso Nacional, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), que se atirou no meio da briga entre governo e oposição, conseguiu negociar com os líderes da Câmara a continuidade das atividades da comissão. Sem as 171 assinaturas de deputados exigidas pelo regimento para prorrogar o prazo, Renan precisava da unanimidade das lideranças para tomar uma decisão política. Uma vez que a regimental não seria mais possível, já que o prazo expirou à meia-noite de ontem. ¿ Longe de mim essa coisa de coveiro de investigação. No que depender de mim, a CPI tem de ser prorrogada. A questão regimental não pode ser maior que a questão política. Temos de ter preocupação com a expectativa que a sociedade tem e exige. Mas isto tem de ser uma decisão de líderes, não pode ser só minha ¿ afirmou minutos antes da reunião fracassada com lideranças das duas Casas para negociar um acordo de prorrogação.

Cientes da publicação no Diário Oficial do Congresso de que a CPI havia perdido a validade por falta de prazo, sem nem mesmo chegar à apresentação de um relatório final, os membros da comissão se reuniram ainda na tarde de ontem. Depois da notícia trazida pelo presidente da comissão, Amir Lando (PMDB-RO), de que a Mesa do Congresso teria oficializado o encerramento das atividades da CPI, o bate-boca tomou conta do plenário. Enquanto oposição e governo trocavam acusações, de braços cruzados, o relator, deputado Ibraim Abi-Ackel (PP-MG), ameaçava iniciar a leitura de seu parecer.

O deputado Júlio Redecker (PSDB-RS) disse que o relator estava fazendo o ¿jogo do governo¿, apresentando um documento que iria beneficiar o julgamento de José Dirceu (PT-SP) no plenário da Câmara.

¿ Já que a CPI acabou porque o governo trabalhou para não assinarem a prorrogação, não acho justo divulgar esse relatório. Porque não teremos chances, nem mesmo de pedir vista e apresentar um relatório em separado ¿ completou.

Redecker e outros deputados da oposição estavam preocupados com os benefícios que o relatório de Abi-Ackel poderia trazer para a defesa do deputado José Dirceu (PT-SP). No documento, o deputado diz que não houve mensalão nos termos em que o ex-deputado Roberto Jefferson havia denunciado. ¿ A oposição já descobriu que há interesse muito forte na leitura do relatório. Vamos parar de mentir e mostrar logo que jogo é esse. Não vamos permitir que dêem palco para o PT usar o relatório para sustentar a defesa de Dirceu ¿ afirmou o tucano .

Ibraim Abi-Ackel respondeu às acusações. Negou haver um acordo para não citar a existência de mensalão e ainda afirmou que nem mesmo o PSDB gostaria que a CPI continuasse.

¿ Nada do que acontece aqui hoje é novidade. Sempre foi assim. O problema aqui é que tem um ringue com dois lutadores que correm da luta ¿ afirmou Abi-Ackel sugerindo que PT e PSDB estariam interessados em que a CPI fosse enterrada sem a leitura de seu relatório.

Mesmo com o fim da CPI e a presença de cinco pessoas no plenário da comissão, Abi-Ackel leu o parecer. Nele, confirmou a existência do recebimento de vantagens indevidas por parlamentares e dirigentes partidários com periodicidade variável, mas constante em 2002 e em 2003.

¿ Chame-se a isso mensalão quem quiser, chame-se a isso quinzenão quem quiser, chame-se a isso semanão quem quiser ¿ diz o texto.

A comissão da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) que estuda apresentar à Câmara um pedido de impeachment do presidente Luiz Inácio Lula da Silva solicitou nos dois últimos dias a representantes das CPIs do Mensalão, dos Correios e dos Bingos o envio de documentos que irão subsidiar os seus trabalhos.