Título: Natal do povo da rua com o Lula
Autor: Eduardo M. Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 24/12/2005, Outras Opiniões, p. A14

Pela terceira vez consecutiva, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva resolveu passar a tarde de 23 de dezembro, ante-véspera do Natal, com o povo da rua, em São Paulo, a convite do Padre Júlio Lancelotti. Desta vez o encontro se deu embaixo do Viaduto João Moura, onde funciona a Coopamare, a Cooperativa dos Catadores Autônomos de Papel, Aparas e Materiais Reaproveitáveis. Conforme destacou D. Cláudio Hummes, naquela tarde o presidente estava transportando o palácio presidencial para os baixos de um viaduto, onde moram tantas pessoas das ruas das cidades brasileiras. Para ele, naquele momento, aquele local havia se transformado na sua catedral.

O exemplo de Jesus, de se solidarizar e viver dentre os mais pobres, disse D. Claudio, estava sendo uma vez mais praticado pelo presidente, com quem tanto convivera e aprendera nos 21 anos em que foi Bispo de Santo André, inclusive no final dos anos 70 e início dos anos 80 em que, ambos mais jovens, tiveram que correr um bocado para escapar da repressão da polícia da época, que agia contra os trabalhadores em greve. Houve momentos em que D. Cláudio foi o responsável por transformar a Matriz de São Bernardo em guardiã dos metalúrgicos para poder fazer as suas reuniões, então proibidas na sede de seu sindicato.

Na presença de centenas de catadores de rua, não apenas de São Paulo, mas das mais diversas cidades brasileiras, o presidente ouviu os depoimentos de inúmeros representantes dos moradores de rua, como do presidente da Coopamare, Eduardo Ferreira de Paula, que expôs um projeto bem elaborado e já colocado em prática pelo Movimento Nacional dos Catadores de Materiais Recicláveis e pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome.

Resultados concretos foram apresentados: 1.350 lideranças foram capacitadas, no lugar das 701 previstas. Projetava-se a realização de 14 Congressos Estaduais e foram realizados 16, com alcance de 18 estados. Pensava-se criar 26 Centros de Referência Regionais do Catador e se abriram 32 que levantaram necessidades e articularam políticas de inclusão. Uma pesquisa sobre o custo de um posto de trabalho para o catador indicou resultou uma demanda nacional para gerar 35.000 postos de trabalho, que poderão beneficiar 175.000 famílias.

Foram consideradas diversas situações desde grupos organizados em associação ou cooperativa com prensa, balança, carrinhos e galpão próprio, podendo ampliar sua estrutura física e de equipamentos a fim de absorver novos catadores e criar condições para implantar unidades industriais de reciclagem, incluindo os grupos mais desorganizados, que atuam em rua ou lixão e não possuem qualquer equipamento, além de trabalhar freqüentemente em condições precárias para atravessadores. Foi feita uma análise sobre o custo de um posto de trabalho nas cooperativas ou associações dependendo da sua situação. O valor varia de R$ 3.094 até R$ 4.979. O número de cooperados varia de 1.391 até 25.783. Para se realizar todo o investimento nas diversas situações a soma total será da ordem de R$ 170 milhões.

Foi feita também a comparação com o valor médio da criação de postos de trabalho em diversos outros setores da economia, desde uma micro empresa - uma pizzaria, por exemplo - que é de R$ 5.472, uma indústria metalúrgica, que chega a R$ 62.500 até na indústria química, que atinge R$ 491.260. O resultado para os cooperados catadores será sair da situação presente de renda de R$ 60 a R$ 100 por mês para R$ 300 a R$ 450 mensais. Em conseqüência haverá redução do custo de operação dos aterros sanitários e da coleta convencional de lixo, bem como redução dos custos de energia e matérias primas através do aproveitamento de resíduos sólidos.

O presidente Lula confirmou que no dia 17 de janeiro, em Brasília, haverá reunião com os ministros que compõem o Comitê Interministerial para apresentação detalhada desse plano. Diante das palavras tão bem formuladas por Sebastião Nicomedes Oliveira, do Movimento Nacional de Luta e Defesa pelos Direitos da População de Rua, o presidente Lula expressou sua solidariedade aos que foram mortos nas ruas de São Paulo, há mais de um ano, e mostrou preocupação com a demora dos órgãos da polícia e da Justiça em apurar o caso. Comprometeu-se a solicitar do Ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, a devida atenção ao caso. O objetivo do Padre Júlio, que agradeceu o empenho do Secretário pessoal do presidente, Gilberto Carvalho, também presente, foi plenamente preenchido. Para aqueles moradores da rua, o Natal começou com um passo importante na Terra e uma estrela a mais brilhando no céu.

Desejo a todos os leitores e amigos um feliz Natal.