Título: Em marcha batida
Autor: MAURO SANTAYANA
Fonte: Jornal do Brasil, 11/01/2006, País, p. A2

Coube a Geraldo Alckmin iniciar o processo eleitoral, anunciando que deixará o governo de São Paulo antes de abril, a fim de disputar, no PSDB, sua candidatura à Presidência da República. A cúpula de seu partido, ao que parece, está convencida de que só há dois candidatos tucanos à Presidência, o governador e o prefeito José Serra. A social-democracia brasileira se identifica, assim, com sua seção paulista. Do outro lado, o PT não tem outro candidato que possa empolgar o eleitorado que não seja outro paulista, o atual presidente da República. Embora nascido no Nordeste, a visão do mundo de Lula é a de São Paulo, onde se alfabetizou, aprendeu sua profissão no Senai, tornou-se líder sindical e líder do partido de que foi o primeiro fundador. Se as coisas continuarem assim, teremos mais quatro (ou mais oito) anos de domínio de São Paulo sobre a federação. Somados os mandatos de Fernando Henrique e de Lula - até agora -, temos 12 anos de presidência paulista. Se a eles acrescentarmos mais oito (na hipótese de que se eleja e se reeleja um tucano) serão 20 anos, um quinto de século, o que - convenhamos - é tempo demais para o predomínio de uma região sobre as outras. É evidente o desconforto das forças políticas dos outros estados com essa situação, e o assunto já foi tratado pela imprensa. Uma das grandes vantagens do sistema democrático é a alternância de homens e de idéias no poder. Ao sugerir que só em São Paulo o PSDB encontraria seu candidato à Presidência, os tucanos se confrontam com seus companheiros de outros estados e tornam difícil a unidade, sem a qual não há vitória eleitoral possível. Tudo está levando a articulações suprapartidárias nessa campanha. O PMDB avança em sua tese, já conhecida, de que é chegada a hora de o partido chegar à Presidência. Germano Rigotto, governador do Rio Grande do Sul, parece ser o preferido das lideranças históricas do partido, uma vez que os governadores Roberto Requião, do Paraná, e Luís Henrique, de Santa Catarina, preferem disputar a reeleição.

Em política - e a constatação é velha - só são possíveis as soluções naturais. A solução natural - e essa era uma prática no passado - se encontra nas conversações entre os líderes dos estados e deve atender aos interesses regionais do país. É de se esperar que os governadores passem a conversar mais nestas próximas semanas, antes que chegue, para muitos, a hora da desincompatibilização.

O problema não é só do Poder Executivo. O desgaste do Congresso, agravado agora pela desastrosa convocação extraordinária, está desorientando os eleitores, incentivando o danoso voto nulo e trazendo a ameaça de que muitos dos novos membros da Câmara (o Senado é um pouco diferente) sejam piores do que os péssimos de hoje.

Intolerância

O texto publicado neste espaço, sexta-feira passada (''Os equívocos sangrentos''), provocou irada reação de muitos leitores, e o elogio de alguns poucos. Mas devo atenção especial ao artigo de Paulo Geiger, publicado ontem no Jornal do Brasil, em que procura desqualificar a minha opinião - baseada na obra do judeu Arthur Koestler. Há duas coisas na coluna: a teoria de Koestler, que não acolhi sem reservas, e a minha posição quanto ao Estado de Israel. Respeito a opinião de todos os que quiseram contestar-me, menos em um ponto: nunca fui racista, em nenhum momento da vida. Os que puderam ler textos meus sobre o racismo, o nazismo e o holocausto sabem disso; os que conhecem a minha conduta pessoal, também. Não admito que haja povos ou raças superiores. Por isso abomino tanto a tentativa da Endlösung dos nazistas contra os judeus, quanto o massacre dos ciganos, para os quais a ONU deveria também providenciar um lar nacional. E nem poderia ser de outra forma. Eu pertenço à singular raça dos homens, a que chamamos Humanidade, com aparência e cultura diferentes, de acordo com a latitude em que viva. É essa espécie singular que, tendo recebido a graça da vida, pode, em sua totalidade - embora não mereça o privilégio -, considerar-se o povo eleito de Deus, tenha Ele o nome que lhe dermos.