Título: PT, parabéns pelos 26 anos
Autor: Eduardo Suplicy
Fonte: Jornal do Brasil, 12/02/2006, Outras Opiniões, p. A11

O dia, 10 de fevereiro. O ano, 1980. O fato, a fundação do Partido dos Trabalhadores. Um partido que já nasceu com história, a da redemocratização do Brasil, e surgiu da luta e da necessidade dos trabalhadores terem pleno direito à cidadania. O PT veio dos que se levantaram contra o autoritarismo, as arbitrariedades, a ausência de leis e o estado de exceção. O seu espírito democrático está entre nós até hoje, e desde o primeiro momento, em nome de todos os brasileiros, o PT abraçou a bandeira dos direitos humanos, fundamental para a vida civilizada em sociedade.

O partido também nasceu de amplos setores populares que saíram às ruas defendendo o direito a uma vida mais digna. Refiro-me ao corajoso Movimento contra a Carestia, ou Movimento do Custo de Vida, nos anos 70. Começava aí a se ouvir a voz de quem não tinha vez. O PT reuniu essas vozes e, assim, colaborou para que o povo brasileiro tivesse a certeza que a nação era de todos nós.

Tive afinidade com o PT desde o início. Era professor na escola de Administração de Empresas de São Paulo, da FGV, e redator de Economia na Folha de S. Paulo e, em 1976, fiz uma palestra para os estudantes de Economia da Fundação Santo André. Oswaldo Cavignato, um dos alunos, era amigo e assessor do então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, o Lula, e o levou para assistir à minha palestra. Quando abri espaço para perguntas, Lula fez uma observação e provocou uma reação em um dos professores da escola, que disse: ''O que dirá o diretor da faculdade quando souber que está aqui um perigoso líder sindical?'' Lula sentiu-se constrangido e saiu da sala.

No final da conferência, Lula e Cavignato me esperavam com Devanir Ribeiro e outro companheiro. Convidaram-me para ir ao sindicato. Nasceu aí uma longa amizade e uma grande trajetória. Aquele retirante nordestino, que carregava consigo o sonho de milhares de trabalhadores por dignidade e melhores condições de vida, passou a coordenar as ações para a criação do Partido dos Trabalhadores. Hoje é o presidente da República.

Em agosto de 1978, quando me candidatei pelo MDB a deputado estadual, travei com Lula um diálogo em frente à Livraria Brasiliense, no calçadão da rua Barão de Itapetininga, no centro de São Paulo. Isso aconteceu por sugestão de meu amigo Caio Graco Prado. Lula e eu nos aproximamos ainda mais.

Segundo Osvaldo Bargas, hoje secretário de Relações do Trabalho do Ministério do Trabalho, foi nesse diálogo que Lula formulou publicamente, pela primeira vez, o pensamento de criação do Partido dos Trabalhadores. Tamanha foi a minha interação com os metalúrgicos do ABC, os bancários, os professores e os movimentos sociais que, juntamente com os deputados Geraldo Siqueira, Irma Passoni, Marco Aurélio Ribeiro e João Baptista Breda, assinei, em 10 de fevereiro de 1980, a ficha de fundação do PT.

Lembro-me bem daquela tarde ensolarada de sábado, nos jardins do Colégio Sion na avenida Higienópolis. Como esquecer da satisfação de Mário Pedrosa assinando a ficha nº 1, da emoção de Paulo Freire, da alegria de Apolônio de Carvalho, das lágrimas de Perseu, Zilá e Lélia Abramo? E dos que vinham de movimentos como o da anistia aos exilados e presos políticos, com Luiz Eduardo Greenhalgh e tantos outros, que nos lembravam do que foi, na ditadura, a batalha na clandestinidade daqueles que ali já podiam mostrar seu rosto? Lembro de tantos jovens, como Alípio Freire e Julinho de Grammont, que se abraçavam e distribuíam a todos os primeiros broches com a estrela, que se tornou símbolo do partido que ajudaram a criar. Lembro do líder camponês Manoel da Conceição, junto com o jornalista David de Moraes e o líder dos coureiros Paulo Skromov. Não posso esquecer de Freitas Diniz, do Maranhão; Antonio Carlos, do Mato Grosso; Benedito Marcílio e Airton Soares, que formaram nossa primeira bancada de deputados federais. Lembro que alguém abriu a primeira bandeira vermelha com a estrela branca. .

Lembro também dos vários programas introduzidos pelo PT em suas administrações, como o Orçamento Participativo, o Saúde da Família, o de Garantia de Renda Mínima, o Bolsa Escola e agora o Bolsa Família, além de muitos outros nas áreas da educação, saúde e urbanismo, que representaram e representam o fortalecimento de nossos ideais. E também das concentrações do Movimento pelas Diretas-Já, o maior já realizado no país, em 1984, e do Movimento por Ética na Política, em 1992.

Ao cumprimentar o Partido dos Trabalhadores por seus 26 anos, quero dizer aos nossos militantes e a todos os brasileiros que os recentes acontecimentos envolvendo alguns integrantes do partido não podem ser generalizados como se fossem de todo o PT. Somos 800 mil filiados.

E gostaria de transmitir a pessoas como a senadora Heloísa Helena - que acabou sendo expulsa, contra o meu voto -, o amigo Plínio de Arruda Sampaio, o companheiro de Senado Cristovam Buarque e outros que resolveram deixar o PT, que avalio ser importante, em que pesem erros que possam ter sido cometidos, prosseguir no partido, corrigir as faltas, superá-las e prosseguir com os ideais que nos levaram a criar o Partido dos Trabalhadores.