Título: Câmara votará nepotismo
Autor:
Fonte: Jornal do Brasil, 18/02/2006, País, p. A3

Um dia depois de o Supremo Tribunal Federal sentenciar o fim do nepotismo no Poder Judiciário, o presidente da Câmara, Aldo Rebelo (PC do B-SP), afirmou que colocará em votação no mês que vem o projeto para inserir na Constituição a proibição da contratação de parentes nos Três Poderes - Executivo, Legislativo e Judiciário - e no Ministério Público. A mulher do presidente da Câmara, Rita Poli, exerce cargo de confiança no gabinete da liderança do PCdoB, ao lado do cunhado, irmão de Aldo, Antônio Apolinário. - Já consultei a maioria dos líderes e obtive acordo segundo o qual a matéria deverá ir a plenário no mês de março - afirmou Aldo, que recebeu recentemente pedido da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para desengavetar o projeto.

A Proposta de Emenda à Constituição em discussão na Câmara (nº 334-B) foi apresentada em 1996. Já havia a reação ao fato de o ex-presidente da Casa, Severino Cavalcanti (PP-PE), que empregava parentes em seu gabinete, defender a prática do nepotismo. Em setembro, a emenda conseguiu ser aprovada em comissão especial, último passo antes da votação em plenário.

Caso seja aprovada pelo Congresso, ela incluirá na Constituição a proibição da contratação de cônjuges ou parentes até o terceiro grau nos três Poderes e no Ministério Público, nos níveis federal, estadual e municipal.

O projeto restringe ainda o número de cargos da administração pública preenchidos por indicação política, sem concurso público, e estabelece quarentena de três anos depois da saída do cargo para que um parente possa voltar a ser nomeado.

A medida entraria em vigor em 90 dias depois da promulgação e, em caso de descumprimento, o responsável responderia por improbidade administrativa.

Por se tratar de uma emenda constitucional, o projeto precisará do apoio de pelo menos nos 60% dos deputados e dos senadores.

A tentativa de acabar com o nepotismo já ocorreu antes no Congresso e naufragou. Em 2000, faltaram 22 votos na Câmara para aprovar a emenda constitucional que proibia a contratação de parentes.

O senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) optou pela contramão e se disse contrário à proibição da contratação de parentes para o Executivo e Legislativo, proposta em tramitação na Câmara.

O senador defende a criação de cota -- que poderia chegar a 10% -- para que o parlamentar ou o funcionário do Executivo contrate um parente.

- Seria uma coisa razoável, que não implicaria que eu tivesse um parente especialista no assunto e que não pudesse contribuir com ele - justificou.

Na opinião dos nove ministros do Supremo que votaram pelo demissão imediata de parentes em tribunais, o nepotismo é ''prática de raízes aristocráticas'' com ''origem nos tempos coloniais''.

No entendimento do STF, a Constituição veda a contratação de parentes por privilegiar os princípios da moralidade e impessoalidade na contratação de servidores.

Mozarildo disse concordar com a avaliação do Supremo, mas apenas em referência ao Judiciário. O senador argumenta que cargos nos tribunais, como de ministro do STF, são vitalícios e nesses casos as contratações de funcionários configurariam nepotismo.

No Legislativo, como os mandatos são fixos, a contratação de membros da família não seria irregular. Interpretações como a do senador, que defende o estabelecimento de cotas, foram motivo de piada ontem no julgamento pelo STF.

A proposta em tramitação na Câmara, se aprovada, proibiria a contratação de parentes de até terceiro grau. Seria vedada também a prática de nepotismo cruzado, quando, por exemplo, um parlamentar contrata a mulher de um colega em troca de reciprocidade.