Título: Responsabilidade Fiscal e Sex Shop
Autor: José Sarney
Fonte: Jornal do Brasil, 28/01/2005, Outras opiniões, p. A11

Um avanço extraordinário para moralização da administração pública foi a criação da Lei de Responsabilidade Fiscal. Trouxe uma transformação institucional vigorosa para extinguir a irresponsabilidade de gestores públicos que não dão bola a qualquer controle.

A primeira destas diretrizes é a de que ninguém pode gastar mais do que arrecada. A lei regula os atos em todos os níveis da administração, desde o presidente até ao prefeito, visa à transparência e à obrigação legal de colocar à disposição da sociedade todas as informações sobre como se aplica o dinheiro do povo arrecadado em impostos. Dizem alguns que esta lei foi uma imposição do Fundo Monetário Internacional, o popular FMI. Qualquer que seja a inspiração é muito boa.

Vejamos o que ocorreu com os prefeitos que tomaram posse em 1º de janeiro. A gritaria foi geral. Os prefeitos que deixavam levavam tudo. Um caso, para chamar Cervantes para assunto tão cotidiano, foi exemplar: o acontecido na Prefeitura de Magé, no Estado do Rio de Janeiro. A nova prefeita, Núbia Cozzolino (PMDB), querendo receber tudo que era do município, entrou com uma ação criminal contra sua antecessora - também mulher - para apurar o sumiço de dois pênis de borracha e uma pelve feminina. É inqualificável o procedimento de surrupiar pênis do patrimônio da prefeitura, violando as normas da moralidade pública e ferindo a lei de responsabilidade. A prefeita Núbia chegou à descoberta desse procedimento quando encontrou notas fiscais da empresa Semina Produtos Educativos, que vendera os singulares instrumentos, para programas de educação sexual. Objetos dessa natureza, destinados à mais alta finalidade, uma vez desaparecidos, podiam ser utilizados com outros objetivos menos claros que não o de educar. A procuradora de Magé, dra. Marcele, declarou aos jornais que vai solicitar à diretoria de patrimônio do município a relação dos bens desaparecidos. A primeira parte da investigação concentrou-se em saber se realmente a firma vendera somente dois pênis ou se foram mais. A averiguação constatou que realmente o estoque para Magé fora modesto, apenas dois; mas para o ano de 2004 o Rio comprara 110 pênis, considerando que a população do Rio era menos instruída nessa área e necessitava de um esforço educativo sexual mais dinâmico, talvez pela proximidade do Carnaval.

O inquérito aberto contra a ex-prefeita de Magé inclui ainda a recuperação de uma geladeira e ar-condicionado. Esses bens, corria na cidade, eram necessários às aulas, gerando uma especulação secundária e investigação para saber porque geladeiras e ar-condicionado estavam ligados aos pênis desaparecidos.

A Lei de Responsabilidade Fiscal abriu espaços para um melhor controle social dos gastos, podendo o povo exigir e fiscalizar, até mesmo em audiências públicas.

Magé está cumprindo a lei. O que preocupa é que, se eles não forem encontrados, uma nova concorrência será aberta, convidando as Sex-shops, que poderão cobrar mais caro, dependendo das especificações do edital, pois são produtos com grande variedade. Cumprir a lei, mas a suspeita mais forte é de que os pênis estejam escondidos na geladeira roubada.