Título: Energia e meio ambiente
Autor: Santos, Antonio Oliveira
Fonte: Jornal do Brasil, 01/08/2008, Economia, p. A19

A crescente dependência energética da União Européia, em relação a fornecimentos de fora da área, e a preocupação com as mudanças climáticas, resultante da agressão ambiental, provocadas pelas emissões de gases e material particulado, demandam resposta, que o presidente da Comunidade Européia, Durão Barroso, batizou de "nova revolução industrial", ao apresentar a planificação energética para a Europa dos 27.

Para reduzir a instabilidade do suprimento de energia, seja pelo encarecimento do petróleo, seja pelos embates políticos entre terceiros países, e frear o agravamento do efeito estufa, a economia de energia é peça chave. Essa economia, que resultaria da busca de equipamentos mais eficientes do ponto de vista energético, aliada ao uso de formas de energia mais limpas, representaria uma redução da emissão de gases, comparativamente aos níveis de 1990, da ordem de 20%, em 2020, podendo chegar a 60% em 2050.

Dentre as providências para alcançar esses ambiciosos objetivos, merece menção especial o estímulo aos biocombustíveis, caso em que a Comissão de Energia da UE se compromete a impulsionar a respectiva produção, prevendo que, em 2020, 10% de todos os veículos utilizem esse tipo de combustível.

A questão da dependência energética, em termos do suprimento russo de gás natural e da passagem do gasoduto que abastece a Europa por novos países, antigos membros da União Soviética ¿ os quais certamente guardam ressentimento da Mãe Rússia gerando incertezas geopolíticas ¿ talvez devesse ser um tema para reflexão.

A julgar pelo comportamento de seus líderes, que não hesitam em promover a insegurança jurídica, desrespeitando contratos, Venezuela e Bolívia não parecem parceiros confiáveis para garantir ao Brasil gás natural nas condições pactuadas ou em vias de serem pactuadas. Chávez e Morales não tranqüilizam a Petrobras. Ora, se há 20 anos o gás natural era inexpressivo na composição de nossa matriz energética, a expansão do seu uso como combustível veicular, insumo para geração de energia elétrica e, não menos importante, geração de calor em processos industriais, criou um estado de coisas tal que nossa produção doméstica atual é insuficiente para atender a demanda que foi criada. Desde logo, valeria por as "barbas de molho", deixar de lado a idéia de um gasoduto que atravesse o subcontinente e desenvolver nossas próprias reservas, sem prejuízo da busca por novas fontes de fornecimento.

Quanto ao conflito entre o uso de energia "suja" e o meio-ambiente, no que concerne aos biocombustíveis, forma indireta de captura de energia solar, não resta dúvida de que o Brasil está na dianteira, começando com o Programa do Álcool, resposta ao segundo choque de preços do petróleo, em 1979. Da mistura carburante com 20% de etanol adicionado à gasolina passou-se ao desenvolvimento de motores ciclo Otto alimentados totalmente a álcool. Dispomos, hoje, de automóveis que usam diferentes tipos de combustível.

Mesmo no caso dos óleos vegetais ¿ mamona, soja, colza e muitos outros ¿ a tecnologia já estava perfeitamente dominada na década de 1980, para uso em motores estacionários, em substituição ao diesel. A disseminação do uso dos óleos vegetais como biodiesel é simplesmente uma questão de preço relativo e eficiência em termos de liberação de energia, quando comparado com gasolina e diesel. Tomando o óleo de soja como exemplo, sua viabilidade como combustível depende de seu preço não ser superior a R$ 1.400 a tonelada e o preço do petróleo inferior a US$ 55 o barril. Na perspectiva do longo prazo, o preço do barril de petróleo terá forçosamente tendência à alta, na medida em que o aumento das reservas conhecidas significa maiores custos. Assim, a aposta do atual governo no sentido da forte expansão da produção do biodiesel, incentivando a quadruplicação da atual produção, é certamente uma boa aposta, na convergência entre independência energética e o entorno ambiental. Na precedência, a Europa se curva ante o Brasil.