Título: Um ano depois: horizonte incerto
Autor: Carvalho, Jiane
Fonte: Jornal do Brasil, 11/08/2008, Economia, p. A17

Para consultores, extensão dos problemas registrados pelos bancos superou as expectativas

Jiane Carvalho

SÃO PAULO

Há um ano, os mercados financeiros mergulhavam na crise das hipotecas subprimes, tendo como epicentro o mercado americano de crédito imobiliário. Em agosto do ano passado, um ponto em comum permeava os discursos de analistas sobre a longevidade do ajuste necessário para afastar os riscos.

Boa parte dos analistas considerava limitados os potenciais efeitos do fim da bolha imobiliária nos demais mercados. O ajuste, acreditavam, seria pontual. Os prejuízos bilionários dos bancos, a redução no crescimento global e a forte volatilidade das bolsas jogaram por terra esta idéia.

A exposição do setor financeiro às subprimes ¿ hipotecas de segunda linha concedidas a quem normalmente não poderia ter crédito ¿ surpreendeu.

¿ Achava que não duraria muito, mas o choque nos bancos começou devagar, foi crescendo e ainda não terminou ¿ avalia Guilherme da Nóbrega, economista-chefe da Itaú Corretora. ¿ As perdas estão próximas de US$ 500 bilhões e podem ser muito maiores.

O dia mais nervoso ocorreu em 16 de agosto, uma quinta-feira. A Bovespa chegou a cair quase 9%, fechando com recuo de 2,58%, o dólar subiu 4,43% e o risco-país disparou 14%. Um dia antes, a financiadora imobiliária Countrywide Financial ¿ maior empresa americana do setor de hipotecas ¿ havia feito um empréstimo de US$ 11,5 bilhões para enfrentar um problema de liquidez.

Dois bancos centrais, o americano Fed e o Boj, do Japão, abriram os cofres e injetaram US$ 20 bilhões nos bancos para garantir a liquidez do sistema. A ação coordenada dos BCs ao longo da crise, embora não tivessem impedido uma forte alta nos spreads das linhas de crédito, foi determinante para evitar um colapso do sistema.

¿ O erro foi deixar a situação chegar onde chegou, mas depois não havia o que fazer a não ser sair em socorro das instituições e evitar um mal pior ¿ diz Nóbrega, do Itaú. ¿ Faltou muita coisa, um ambiente com boas práticas, e não um sistema baseado apenas na avaliação de risco das agências de rating.

Para Nóbrega, os instrumentos de controles estavam frouxos.

¿ Vínhamos de um ciclo longo de crescimento dos EUA, com juros baixos e excesso de liquidez global. Toda vez que ocorre um ciclo longo benigno, os instrumentos de vigilância e controle ficam frouxos, é normal.

Medidas

Segundo a consultoria UpTrend, desde setembro do ano passado, foram injetados US$ 860 bilhões no sistema financeiro, com linhas de crédito entre US$ 20 e US$ 75 bilhões em leilões. Também foram adotadas medidas para estimular o consumo, com pacote fiscal de US$ 168 bilhões.

Outro fato marcante foi a compra do Bear Sterns pelo JP Morgan, pela bagatela de US$ 1 por ação, negócio tutelado pelo Fed americano. Tudo para evitar uma quebradeira de bancos e, principalmente, que a economia americana entrasse numa recessão.

¿ Não dá para saber quando este movimento acaba, mas o efeito no Brasil é mais benéfico do que maléfico ¿ faz coro Padovani, do WestLB. ¿ Acredito que haja uma recuperação suave das bolsas, não vejo que haja espaço para piorar muito. O ajuste nos preços das commodities deve perder força e o preço da bolsa, particularmente a brasileira, ficará atrativo.

Só este ano, a Bovespa acumula queda de 11,42%. Em Wall Street, o índice Dow Jones cai 11,54% este ano e o S&P 500 recua 11,72%.