Título: Câmbio força demissões na indústria
Autor: Rosa, Leda
Fonte: Jornal do Brasil, 10/08/2008, Economia, p. E3

Para compensar depreciação do dólar, exportadores revêem a folha de pagamentos.

SÃO PAULO

O impacto negativo da política cambial já provoca demissões em setores industriais tradicionalmente afeitos à exportação. Áreas mais sensíveis aos preços do dólar, como a de madeira processada, estimam que, de maio a julho, as demissões atingiram 15 mil trabalhadores. Nas produtoras de calçados, vestuário e têxteis , o drama é a extinção de aproximadamente 200 mil vagas a cada ano. No chão destas fábricas, os empregados já sabem: caso haja a manutenção das taxas de câmbio, o desemprego virá em 2009.

¿ Nosso volume físico exportado tem caído, em média, 17%. Com tal encolhimento, produzimos menos e temos menor necessidade de mão-de-obra ¿ explica Antonio Rubens Camilott, presidente da Associação Brasileira da Indústria de Madeira Processsada (Abimci).

O contingente empregado pelo setor é de dois milhões de trabalhadores. O executivo calcula que, se confirmadas as previsões de valorização do dólar, a escalada de demissões pode ser estancada ainda neste ano, no fim do quarto trimestre.

¿ As condições de competitividade estão permitindo uma formalização muito aquém do que poderíamos gerar ¿ diz Fernando Pimentel, diretor superintendente da Associação Brasileira da Indústria Têxtil e de Confecção (Abit). ¿ Em vez de estarmos gerando no mínimo mais de 160 mil empregos por ano diretamente no setor, vamos ficar com patamares reduzidos de 30, 40 mil postos de trabalho este ano ¿ diz o executivo. ¿ A continuar o câmbio apreciado em 2009, com juros altos trazendo redução no nível de atividade econômica interna e queda de consumo, poderemos ter sim demissões formais.

Tidos como os mais voláteis da economia ¿ por sentirem mais rapidamente as variações cambiais ¿ estes setores representam uma fatia bastante específica dentro do universo formado pelos quase 30 segmentos da indústria nacional. Diante de uma reviravolta na política cambial, serão os primeiros a serem beneficiados.

¿ Com esta taxa de câmbio, não conseguimos ter preço competitivo no mercado internacional, então deixamos de exportar produtos manufaturados. Aumentamos o preço mas reduzimos o volume ¿ diz José Augusto de Castro, vice-presidente da Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB).

Nó cambial

Segundo ele, o câmbio é tão nocivo para os exportadores que está estimulando a exportação de capitais do Brasil.

¿ Atualmente muitas empresas têm comprado ou aberto filiais no exterior para produzir no exterior o que produziam aqui no Brasil. São justamente aqueles que gostaríamos que se desenvolvessem aqui no Brasil: os manufaturados como fabricantes de carrocerias de caminhões e manufaturados de borracha, porque geram mais emprego.

Para desatar o nó cambial, Paulo Mol, economista da Confederação Nacional da Indústria (CNI) elege como prioridade a política monetária.

¿ A taxa de juros mais alta acaba sendo um estímulo ainda maior à entrada de dólares no Brasil em busca do retorno mais fácil e alto, isto acaba pressionando a elevação do real.

Segundo estudo da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), com a valorização do real, os setores com maior rentabilidade são: siderúrgica, extrativa mineral, autopeças, químicos, metalúrgica, material de transporte e fertilizantes. Na contramão, os que amargam menor rentabilidade são: celulose, petroquímico, vestuário, minerais não metálicos, têxtil, materiais elétricos e produtos alimentares.

A análise de 53 trimestres (aproximadamente 13 anos) de estatísticas sobre rentabilidade mostra que o câmbio baixo está associado a reduzido retorno sobre o capital e à desaceleração do crescimento econômico. Segundo a entidade, "sai fortalecida a tese segundo a qual os ganhos econômicos da queda do dólar não compensam, no médio prazo, seus prejuízos".

Para 2009, os resultados recentes da balança comercial ¿ com queda estimada de 42,2% no superávit em 2008 frente à 2007 ¿ aparece como fator decisivo nos rumos a serem trilhados.

¿ O déficit no setor externo já está gerando déficits muito fortes e isto pode balancear esta tendência de valorização da nossa moeda. Pode ser que R$ 1,50 seja o nível abaixo do qual a cotação do dólar não volte ¿ diz Júlio Gomes de Almeida, economista do Instituto de Estudos para Desenvolvimento Industrial (IEDI).