Título: Homens estão perdendo a capacidade de liderança
Autor: Abade, Luciana
Fonte: Jornal do Brasil, 10/09/2008, País, p. A12

Mulheres chefiam 2,2 milhões de famílias, 10 vezes mais que há 13 anos.

BRASÍLIA

Nos últimos 13 anos, o total de famílias formadas por casais com filhos e chefiadas por mulheres cresceu 10 vezes. Passou de 3,4% (247.795 famílias), em 1993, para 14,2% (2.235.233 famílias) em 2006. No mesmo período, a proporção de mulheres, casadas ou não, que sustentam um ou mais parentes passou de 19,7% para 28,8%. É o que mostra pesquisa divulgada, ontem, em Brasília, pela Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), em parceria com o Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e o Fundo de Desenvolvimento das Nações Unidas para a Mulher (Unifem).

¿ Observamos uma mudança cultural no país. Antes, se existia um homem na família, ele era o chefe. Agora não mais. A mulher pode chefiar, mesmo que não tenha a maior renda. A questão da autoridade conta muito ¿ afirma Laura Simões, pesquisadora da SPM.

Mesmo timidamente, tem crescido o número de famílias em que o pai é o provedor e cuida dos filhos: de 2,1% em 1993 para 2,7% em 2006. "É um indício de mudança nos padrões hegemônicos da masculinidade brasileira" diz o relatório.

Trabalho doméstico

Ainda assim, o tempo dedicado pelos homens ao trabalho doméstico caiu, no geral, de 10,9 horas semanais em 2001 para 10 horas semanais em 2006. Esse número varia por região. Os homens da região Nordeste são os que mais se dedicam a essas atividades, 10,5 horas semanais.

O fato de a expectativa de vida ser influenciada pela ligação a um grupo de cor e ao sexo chama muita atenção. Os números mostram que, apesar da expectativa de vida do brasileiro ter aumentado de uma maneira geral, as desigualdades entre os grupos permanecem.

As mulheres vivem mais e os negros menos. Em 2006, 9,3% das mulheres negras tinham 60 anos ou mais de idade. Essa proporção entre as brancas era de 12,5%. Em 1993 tinha-se 7,3% de mulheres negras nessa faixa etária e 9,4% de brancas.

¿ Quando vai procurar emprego, por exemplo, a mulher negra sofre um duplo preconceito. De gênero e raça ¿ afirma Luana. ¿ Apesar dos avanços, os números mostram que além das políticas públicas universais, são necessárias políticas afirmativas para determinados grupos. Só elas podem acabar com as desigualdades mais rapidamente.

A pesquisadora, no entanto, ressalta que todas as políticas públicas têm limites e que é preciso tempo para mudar questões culturais. Segundo o relatório, a diferença da expectativa de vida pode ser resultado de uma maior vitimização das mulheres negras em decorrência do sexismo e do racismo, que precarizam o acesso aos serviços de saúde, habitação, emprego e renda. "O que constitui uma das mais perversas facetas das desigualdades raciais existentes em nosso país", acrescenta o documento.

A diferença entre o número de brancos e negros na população brasileira diminuiu entre o período pesquisado. Se em 1996 o total de brancos correspondia a 55,2% (85.261.961) da população e o de negros a 44,7% (68.929.113), em 2006, o total passou a ser de 49,7% (93.096.286) de brancos, frente a 49,5% (92.689.972) de negros.

Maior identidade

¿ Desde a década de 1980, houve uma reafirmação da identidade negra. Isso provocou uma mudança entre as pessoas que antes se consideravam pardas e, agora, se assumem negras ¿ acredita Maria Inês Barbosa, representante da Unifem.

Maria Inês também é a favor das políticas afirmativas. Ela acredita que as desigualdades não diminuem tão rapidamente quanto o crescimento do país porque as políticas públicas fazem recorte por renda e não por gênero ou raça.

O fato de os estudos contribuírem para uma renda salarial maior parece não valer quando se trata de gênero. Embora as mulheres apresentem, em praticamente todos os indicadores educacionais, melhores condições do que o grupo masculino, elas ganham menos que os homens.

¿ Ainda não é fácil ver mulheres em cargos de chefia ¿ diz Luana. ¿ Persiste a idéia de que não fomos feitas para chefiar. E os homens continuam ocupando os cargos mais reconhecidos socialmente, como o mercado financeiro.

A média de anos de estudo das pessoas ocupadas aumentou para todos os grupos. Mas a média feminina é maior que a masculina e os brancos ainda estudam mais que os negros. No primeiro caso, de acordo com o relatório, a distância se mantém. No segundo, pouco se alterou. A maior média de escolaridade é das mulheres brancas da região Sudeste, 9,8 anos de estudo, e a menor, dos negros do Nordeste, 5,1.