Título: Privatização volta à cena em SP
Autor: Eugênio Melloni
Fonte: O Estado de São Paulo, 28/02/2005, Economia, p. B12

A iniciativa do governo de São Paulo de incluir a Transmissão Paulista no Programa Estadual de Desestatização (PED), como alternativa para a obtenção de recursos visando a capitalização da Cesp, a endividada geradora paulista, foi bem-recebida pelos analistas de mercado. Afinal, se o governo do Estado conseguir privatizar a Transmissão Paulista, uma das melhores empresas desse segmento e uma das últimas energéticas sob o seu controle, a companhia poderá abandonar a rigidez da administração financeira e adotar uma política mais agressiva de expansão de seu mercado, dizem os analistas. Eles lembram também que os investidores privados, sobretudo os espanhóis, têm revelado grande apetite por participações no mercado de transmissão - comprovado pelos altos deságios registrados nos leilões de linhas de transmissão realizados pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel).

Por um lado, se a possível privatização da Transmissão Paulista deixa o mercado eufórico com o leque de oportunidades que se abrirá para a transmissora, de acordo com o comportamento das ações da companhia nos últimos dias, por outro, é cedo para se ter uma visão concreta dos benefícios à situação financeira da Cesp.

A geradora enfrenta um pesado endividamento, de US$ 3,5 bilhões, sendo que o serviço dessa dívida em 2005 deverá atingir a marca de R$ 3 bilhões, segundo informações prestadas em dezembro pelo secretário de Energia do Estado, Mauro Arce. A premência das necessidades da Cesp fez com que o governo Alckmin abrisse mão de um dos principais princípios do programa de privatizações adotado no governo Covas: a manutenção sob o guarda-chuva do Estado da área de transmissão de energia, resultante da cisão das estatais paulistas, com o objetivo de garantir uma competição equilibrada entre as empresas dos demais segmentos.

Há quem considere que a privatização da Transmissão Paulista, por maior que seja, será insuficiente para promover um alívio significativo do endividamento da Cesp, diante da magnitude dos débitos. Como explica um analista, a venda da Transmissão Paulista "não dará cabo das dívidas da Cesp; apenas permitirá que a geradora paulista saia do cheque especial".

Outro fator a ser questionado é a possibilidade de que se repitam as acirradas disputas registradas nos leilões de concessões de linhas de transmissão da Aneel. Não se deve menosprezar os atrativos da Transmissão Paulista. A estatal deverá obter este ano um faturamento superior a R$ 1 bilhão, quase o triplo do que faturava em 1999, de acordo com um analista. Outro atrativo da companhia é o seu posicionamento estratégico: a Transmissão Paulista está incrustada no maior mercado consumidor de energia do País e no meio do caminho do fluxo de energia entre o Centro-Oeste, o Sudeste e o Sul.

As dúvidas sobre se a Transmissão Paulista conseguirá despertar o interesse demonstrado nos leilões de concessões se devem às características diferenciadas das oportunidades. Os leilões de transmissão da Aneel têm sido intensamente disputados por companhias de engenharia que conseguem compensar, no processo de construção das linhas, os deságios oferecidos como lances. Mas a Transmissão Paulista já é uma companhia formada.

Há um terceiro ponto que deve estar preocupando os técnicos do governo paulista: não será tranqüila a tramitação, na Assembléia Legislativa do Estado, do projeto de lei visando a alteração da Lei 9.361/96, de forma a serem eliminadas barreiras legais à privatização da transmissora. Embora o governo paulista conte com a maioria na casa, os parlamentares do PT já manifestaram a disposição de obstruir o máximo possível a votação do projeto de lei, repetindo um estratagema largamente utilizado na privatização das demais estatais energéticas paulistas. Com isso, é possível que a privatização da Transmissão Paulista demore demais para as necessidades de curto prazo da Cesp.